Lucerna, Suíça, 2/9/2013 – A energia hidráulica é a principal fonte de eletricidade nos países alpinos. Contudo, apesar de sua importância na mudança para alternativas renováveis na Europa, na Áustria e na Suíça, estão suspensos alguns projetos de construção de infraestrutura hidrelétrica. Nos dias de bons ventos do verão alemão, quando milhões de painéis absorvem o Sol e as turbinas eólicas funcionam a toda velocidade, a rede elétrica não tem como absorver o excesso de energia. Nos domingos, em especial, a produção supera a demanda.
O resultado é a diminuição das tarifas. Inclusive aparecem números negativos, o que significa que os clientes recebem pela eletricidade. O mercado energético da Europa está liberalizado. O que acontece na Alemanha afeta seus vizinhos, e as centrais hidrelétricas suíças não podem competir nessas condições. O auge da energia hidráulica suíça é histórica. Esta fonte, que cobre 55% da demanda, atravessa uma crise de rentabilidade porque as tarifas caíram 20% em relação ao ano anterior.
Nessas condições, as grandes produtoras de eletricidade da Suíça – Alpiq, Axpo, BKW e Repower – não estão dispostas a investir para otimizar e aumentar sua infraestrutura. Na verdade, a Repower anunciou uma redução de seus investimentos em 35% para os próximos dez a 15 anos. Andreas Meyer, responsável de comunicação da Alpiq, disse à IPS que os subsídios maciços para as energias renováveis desestabilizaram o mercado e puseram em dúvida a rentabilidade das centrais térmicas e hidrelétricas e também bloquearam os futuros investimentos. Atualmente, a Alpiq tem um programa de desinvestimento e teme que continue a deterioração das tarifas.
Entretanto, o desenvolvimento da energia hidráulica na Suíça é motivo de controvérsia. O governo estima que será entre quatro e cinco terawatts por hora, mas o Fundo Mundial para a Natureza (WWF) afirma que será apenas 1,5 terawatts. Em todo caso, seu potencial é muito baixo. Entretanto, a Suíça subsidia as pequenas centrais com capacidade inferior a dez megawatts, independente de sua eficiência e do dano ecológico que causam. Graças às subvenções, os pequenos projetos hidrelétricos se tornaram muito rentáveis.
No entanto, o WWF reclama o fim dos subsídios. “É uma loucura total construir novas centrais em águas virgens”, afirmou à IPS Christoph Bonzi, do WWF Suíça. Atualmente, 95% das fontes de água do país são usadas para gerar eletricidade. Por uma vez, conservacionistas e principais fornecedores de energia afirmam o mesmo sobre o sistema de subsídios da Suíça, que favorece os pequenos projetos hidrelétricos. “Por acaso, não é absurdo os subsídios para as novas energias renováveis gerarem uma situação em que até outras tecnologias sistêmicas necessitem de apoio”, questionou Werner Steinmann, porta-voz da Repower.
O auge da energia eólica e da solar na Europa aumentou a demanda de armazenamento de eletricidade, já que ambas são fontes flutuantes. Alemanha, Áustria e Suíça concordaram, no ano passado, em aumentar a capacidade das usinas hidrelétricas de armazenamento por bombeamento em um esforço conjunto. Várias dessas centrais estão em construção nos Alpes suíços. Porém, ainda não se sabe se os investimentos valerão a pena. Algumas companhias suíças de energia não se opõem a todos os subsídios para as energias renováveis.
O maior acionista da Repower é o cantão dos Grisones, cujo conselheiro-chefe, Mario Cavigelli, rompeu um tabu ao pedir subsídios para a eletricidade gerada em grandes hidrelétricas. Também pediu a redução dos fundos para as pequenas iniciativas. Contudo, trata-se de uma pedido discutido dentro do setor. A encarregada de imprensa da Axpo, Daniela Biedermann, disse que não se pode resolver os problemas dos subsídios agregando novos. “Devemos discutir como implantar as novas energias renováveis em um sistema voltado para o mercado”, afirmou.
A Associação Suíça para a Gestão da Água (SWV), que representa o setor, reclama que os subsídios à energia hidrelétrica não se limitem às pequenas centrais. A organização propõe que seja usado o critério da eficiência, um aspecto ignorado pelo atual sistema. A SWV quer que sejam promovidos os projetos que geram mais eletricidade por dólar subsidiado. Entretanto, os conservacionistas não estão muito contentes com as novas demandas corporativas. Em nome do “interesse nacional” as empresas tentam explorar inclusive reservas de água protegidas.
O WWF prefere melhorar a eficiência em lugar de usar até a última gota para produzir eletricidade. Do outro lado da fronteira, as empresas da Áustria enfrentam problemas semelhantes. Atualmente, cerca de 60% do fornecimento elétrico são cobertos com a energia hidráulica local. O setor tratou de aumentar sua capacidade em sete terawatts por hora até 2020.
“Seguramente, não podemos alcançar nossas expectativas”, disse Ernst Brandstetter, porta-voz da Oesterreichs Energie, que representa os interesses da indústria elétrica austríaca. Segundo ele, atualmente o realista é prever apenas quatro terawatts/hora até 2025. “Infelizmente, muitos projetos estão parados. A indústria tem cinco anos de atraso em relação aos seus planos de desenvolvimento”, acrescentou. Brandstetter explicou que, no tocante às hidrelétricas, a situação atual do mercado se caracteriza por uma grave insegurança.
“Muitos projetos previstos já não têm justificativa econômica”, ressaltou Brandstetter. A Oesterreichs Energie não pede subsídios, mas quer um ambiente mais propício para os investimentos. “O mais preocupante é que até os projetos de armazenamento de energia serão rentáveis. Junto com as redes elétricas, as centrais hidrelétricas de armazenamento por bombeamento são os facilitadores mais importantes para um futuro com fontes renováveis”, insistiu.
O porta-voz pede que se deixe de distorcer o mercado, fazendo com que o europeu esteja pautado por normas que permitam a todas as fontes de energia competirem em igualdade de condições. O setor hidrelétrico da Áustria e da Suíça depende muito do que acontece na União Europeia. Atualmente estão em consultas as Diretrizes de Ajuda à Energia e ao Meio Ambiente 2014-2020. Na próxima primavera boreal será preciso ver se as centrais hidrelétricas alpinas se beneficiam ou não das novas pautas. Envolverde/IPS