Caracas, Venezuela, 5/12/2011 – Os 33 países da América Latina e do Caribe disporão de um novo fórum político que cobrirá o hemisfério, com exceção de Canadá e Estados Unidos, segundo decisão dos chefes de Estado e de governo reunidos na capital venezuelana. A Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) não disporá de um tratado constitutivo, porque não será um órgão com estrutura própria, mas um mecanismo de consulta e concertação, dirigido mediante reuniões anuais de governantes, cujas decisões serão tomadas, ao menos no primeiro ano, por consenso.
O novo organismo disporá de uma “cláusula democrática” para favorecer ações coletivas sobre o país cujo governo for vítima de uma alteração da ordem constitucional, enquanto a cooperação regional será impulsionada de acordo com um 20 documentos anexos ao texto central, a Declaração de Caracas. Mandatários como o equatoriano Rafael Correa ou o anfitrião Hugo Chávez propuseram a Celac como mecanismo de solução de conflitos intrarregionais e “substituta da velha e desgastada OEA” (Organização dos Estados Americanos), da qual são parte Estados Unidos e Canadá e Cuba não.
Porém, a maioria dos governos não fez referência quanto à Celac assumir as funções da OEA ou contratar com ela, e, por outro lado, defenderam os rascunhos propondo para a nova entidade “o diálogo político com outros atores intergovernamentais, organismos e mecanismos internacionais”. “A Celac terá sentido se buscar prosseguir no esforço positivo do Grupo do Rio (mecanismo de consulta política criado na região há 25 anos), para que América Latina e Caribe conciliem suas diferenças”, disse à IPS o diretor da Escola de Estudos Internacionais da Universidade Central da Venezuela, Félix Arellano
Por outro lado, “se a intenção é entrar em conflito com os Estados Unidos e substituir a OEA, isso não terá êxito, porque terá a oposição de três quartos da região e é o sentido em que cabe esperar que trabalhem governos como os de Brasil, México, Chile ou Costa Rica”, acrescentou Arellano. A mexicana Alicia Bárcena, secretária-executiva da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), considerou que a Celac é “o êxito político mais importante dos últimos anos, pois todos os países da região confluem em um organismo de diálogo, cooperação e integração”.
“Durante décadas, a integração regional passou pela via comercial, mas agora estamos encontrando outros caminhos e mecanismos próprios, um pouco ao estilo do que foi feito pela União Europeia”, disse Bárcena em recente encontro com correspondentes estrangeiros. Um tema essencial para calibrar os trabalhos da nascente comunidade, segundo Bárcena será “o do trabalho pela igualdade, pois a América Latina, com políticas sociais muito ativas, reduziu a pobreza em 11 pontos, mas ainda tem 32% (180 milhões) de pobres, e se mantém como a região mais desigual do planeta”.
A bateria de documentos adotada pelas autoridades para acompanhar a Declaração de Caracas inclui compromissos para ajudar-se no intercâmbio e na execução dos programas sociais de maior êxito, como o brasileiro Fome Zero. Para acentuar o interesse em que a Celac tenha um rosto mais do que retórico, o encontro de Caracas incluiu uma reunião de ministros da Petrocaribe, mecanismo de cooperação pelo qual a Venezuela fornece até 200 mil barris diários de combustível para uma dezena de países da região caribenha com termos de pagamento privilegiados.
Também está prevista uma reunião da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), que reúne os 12 Estados do subcontinente e dispõe, ao contrário da Celac, de uma secretaria permanente para conduzir suas atividades. Por outro lado, alguns dizem que América Latina e Caribe continuam elaborando propostas de integração e de organismos regionais sem que se consolidem outras estruturas que vão ficando pelo caminho com o passar dos anos.
“Não estou muito convencido de que seja necessária. Embora coloque em contato os países da América Latina e do Caribe para poderem desenvolver projetos conjuntos, é da continuação de um mecanismo de concertação e diálogo como o Grupo do Rio, que com a Celac desaparece”, alertou o chanceler da Costa Rica, Enrique Castillo. Arellano criticou que “nem os velhos nem os novos mecanismos de integração se consolidam. Com a Aladi (Associação Latino-Americana de Integração) se pensou que iríamos para uma zona de livre comércio, e isso não ocorreu, e a Comunidade Andina de Nações (Bolívia, Colômbia, Equador e Peru) está na terapia intensiva.
“O Mercado Comum do Sul (Mercosul: Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) não consolidou nem a união aduaneira nem a zona de livre comércio. A Comunidade Sul-Americana não prevaleceu e mudou para Unasul, que tampouco consegue se consolidar, e então agora criamos a Celac”, detalhou Arellano.
A cúpula de Caracas, que aconteceu nos dias 2 e 3, na cidade militar Fuerte Tiuna, cuja organização custou mais de US$ 20 milhões, é, por outro lado, o primeiro encontro internacional com a presença do presidente Chávez desde que, em junho, teve detectado um câncer não especificado quando divulgado. Chávez, que se submeteu a quatro séries de quimioterapia, mostrou aos seus colegas seu habitual dinamismo físico e retórico, e se congratulou por receber seus pares Dilma Rousseff e Fernando Lugo, do Paraguai, que também sofreram, e parecem ter superado, problemas com câncer. Envolverde/IPS