O hábito alimentar é um campo em que cada um pode experimentar, individualmente, reduzir seu impacto sobre o ambiente ou a emissão de gases de efeito estufa. Ações e atitudes neste campo são autônomas, não dependem de acordos internacionais ou de políticas governamentais.
O hábito alimentar é culturalmente condicionado e reflete o estágio de consciência de cada pessoa. Um cidadão tem múltiplos modos de pensar e de se comportar diante do consumo de alimentos e, especialmente, da questão do consumo de carne. Nas escolhas alimentares há variações de A a Z. Cada um desses modos reflete um estágio de consciência ecológica, que agrupamos em seis situações principais.
1. Adoto hábitos alimentares formados desde a infância. Condicionado culturalmente, nunca tomei consciência deles e dos impactos que causam. Por inércia ou automatismo cultural, não os questionei. Não tenho motivação ou predisposição em mudá-los.
2. Conheço os impactos ambientais e climáticos, as dores e sofrimentos causados aos animais, além dos danos à saúde causados por minha dieta, mas não estou disposto a mudar hábitos alimentares que me dão prazer sensorial. Os custos pessoais de uma eventual mudança de dieta são mais altos do que os eventuais benefícios difusos e coletivos que a sociedade pode ter. “Reconheço que estes custos ecológicos e este sofrimento dos animais existem, mas nem por isso vou deixar de comer meu churrasco.” Os estímulos olfativos e ao paladar comandam minhas atitudes. Sou apegado aos prazeres sensoriais e resisto a argumentos racionais. Sou como o fumante que, informado dos males que o cigarro causa à saúde, não deixa de fumar.
3. Sou consciente de que a dieta provoca impactos ambientais e estou disposto a minimizá-los. Aceito o consumo de carne, desde que não destrua a floresta, não agrave a mudança climática ou o efeito estufa. Desejo que se limpe o processo de produção, que seja identificada a origem da carne na cadeia produtiva, do pasto ao frigorífico e ao supermercado. Informo-me por meio da Certificação de Produção Responsável na Cadeia Bovina da associação de supermercados, que controla a origem da carne consumida e evita que tenha origem em áreas desmatadas. Não compro carne da Amazônia, não certificada e que provoca desmatamentos. Focalizo essencialmente o modo como se produz e a ecoeficiência na produção. Não questiono a demanda e o padrão cultural de consumo que induzem esta produção. Sou ambientalista e sou carnívoro.
4. Questiono as dietas alimentares carnívoras, por razões de saúde humana, de devastação florestal, de consumo de recursos naturais ou de compaixão para com o sofrimento causado aos animais. Simpatizo com os movimentos contra a crueldade para com os animais. (Os animais são meus amigos… e eu não como meus amigos, George Bernard Shaw) e com cientistas de ponta como o coordenador do IPCC, o indiano Rajendra Pachauri, que recomenda diminuir o consumo de carne. Admiro artistas como Gilberto Gil e Paul MacCartney, formadores de opinião, que se colocam a serviço dessa causa e procuram aplicar na vida pessoal mudanças de hábitos alimentares que ajudam a transformar o coletivo de forma mais radical, profunda, duradoura e efetiva. Defendo o não consumo de carne e a redução da população bovina. Renunciei a ingerir a carne vermelha, admitindo carne branca ou peixes em algumas ocasiões sociais. Não sou inflexível ou rigoroso.
5. Pratico o vegetarianismo, não me alimento com qualquer tipo de carne, por razões da ecologia energética e por conhecer as perdas de energia que ocorrem nas cadeias alimentares, além de ter compaixão para com os animais e preocupar-me com seus efeitos em minha saúde.
6. Sou radical na dieta: não me alimento de nenhum produto animal, carne, ovos ou laticínios; sou um militante da causa do vegetarianismo e participo de movimentos que defendem tal mudança. Alguns me chamam de radical, de xiita, de fanático.
Qual dessas situações mais se aproxima de sua vivência pessoal hoje?
Mudanças de estágios de consciência e de atitudes e comportamentos podem acontecer muito rapidamente, com avanços e retrocessos. Um indivíduo que evolua de um para outro estágio de consciência e que adote hábitos no sentido de reduzir ou abolir seu consumo de carne faz pouca diferença no cômputo global. Mas, quando tal mudança ocorre em toda uma cultura e sociedade, com milhões (ou bilhões) de pessoas, o benefício ecológico e climático pode ser significativo. Quanto mais pessoas se transportarem de um estágio ecoalienado para um estágio mais avançado de consciência ecológica e adequarem a ele seus hábitos de consumo, mais se poderá colaborar para reduzir os impactos negativos associados às mudanças climáticas e ambientais.
* Maurício Andrés Ribeiro é autor de Ecologizar e de Tesouros da Índia para a Civilização Sustentável ([email protected] e www.ecologizar.com.br).