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Europa oriental vive e luta na ONU

Nações Unidas, 12/4/2012 – Lituânia e Sérvia travam uma intensa batalha em torno de quem presidirá as próximas sessões da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Este enfrentamento destaca a existência de um bloco que se acreditava extinto: Europa oriental. Desde o colapso da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), em 1991, a Europa oriental deixou gradualmente de existir como entidade geopolítica, exceto na ONU.

Os 22 países que a integravam, e que vão de Bulgária e Geórgia a Eslovênia e Ucrânia, praticamente foram absorvidos ou pela União Europeia (UE) ou pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Como um dos cinco grupos regionais presentes nas Nações Unidas, a Europa oriental agora reclama a presidência da Assembleia Geral, de 193 membros, cuja próxima sessão começará em setembro.

Como a maioria dos demais cargos eletivos da ONU, a presidência se alterna entre os cinco grupos regionais: asiático, africano, Europa oriental, América Latina e Caribe, e o dos países da Europa ocidental e outros (que incluem Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia). Muitos diplomatas argumentam que não há motivo para que o grupo da Europa oriental exista dentro das Nações Unidas.

“Agora são um apêndice da Europa ocidental. Existem na ONU apenas para buscar cargos escolhidos pelo voto”, opinou um diplomata asiático. Por sua vez, James Paul, diretor-executivo do Global Policy Forum, com sede em Nova York, e especialista em assuntos políticos da ONU, afirmou à IPS que as reclamações da Europa oriental sobre um status especial nas Nações Unidas não se encaixam nos padrões regionais emergentes, que implicam integração e criação de instituições no mundo real.

“Ao optar por ser parte da União Europeia, estes países se alinharam com os europeus ocidentais por uma Europa unida, o que é um fato positivo”, disse Paul, acrescentando que é difícil ter as duas coisas. “Como podem falar por meio da voz da UE e também com a voz de um grupo regional? Querem tudo”, acrescentou.

Antes da eleição do atual secretário-geral, Ban Ki-moon, há cinco anos, os Estados Unidos tentaram prejudicar as reclamações asiáticas em torno do cargo promovendo um candidato da Europa oriental. É muito provável que quando Ban encerrar seu mandato em 2015, a Europa oriental reclame seu posto. Porém, essa decisão será tomada pelo Conselho de Segurança e pela Assembleia Geral.

Desde a criação da ONU em 1945 o posto de secretário-geral foi ocupado por três europeus, dois asiáticos, um latino-americano e dois africanos, principalmente com base na alternância geográfica. Foram eles: Trygve Lie da Noruega (1946-1952), Dag Hammarskjöld da Suécia (1953-1961), U. Thant da Birmânia (1961-1971), Kurt Waldheim da Áustria (1972-1981), Javier Pérez de Cuéllar do Peru (1982-1991), Boutros Boutros-Ghali do Egito (1992-1996), Kofi Annan de Gana (1997-2006), e Ban Ki-moon da Coreia do Sul (desde 2007 e até 2016).

Paul indicou à IPS que as disputas em torno da representação regional na ONU são um sinal de que algo grande está ocorrendo. “No mundo real houve uma evolução importante para o regionalismo, já que surgem novas instituições e as existentes adquirem força rapidamente”, afirmou. A União Africana, a União Europeia, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e a Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean) são os principais atores deste jogo, mas há muitos outros.

Tudo isso acontece porque, em sua maioria, os Estados são muito pequenos para funcionarem de maneira efetiva no sistema global e ingressam em associações guiadas pela necessidade de uma integração econômica, e também para abordar questões de segurança, políticas sociais, infraestrutura e outros assuntos. Boa parte destas mudanças está pautada por interesses econômicos privados, que preferem operar em maior escala, com padrões regionais, etc. A nação que atua sozinha não tem tanta credibilidade como antes, segundo Paul.

Os dois da Europa oriental que lançaram suas vistas para o posto de presidente da Assembleia Geral são o representante permanente da Lituânia na ONU, Dalius Cekuolis, e o ministro das Relações Exteriores da Sérvia, Vuk Jeremic. A Lituânia afirma que sua candidatura já foi anunciada em 2004, em nome do grupo da Europa oriental. Se o grupo não chegar a um acordo para definir um único candidato, a Assembleia Geral será obrigada a realizar uma votação, o que é muito incomum. Tradicionalmente se elege por aclamação, com candidatos únicos aprovados por seus respectivos grupos regionais.

Não haverá respostas fáceis, alertou Paul, mas a tendência é clara: um mundo em que as organizações regionais terão um papel cada vez mais importante na política global. E os grupos regionais na ONU não estarão alheios a isto, já que tiveram um papel muito importante quando as organizações eram débeis ou inexistentes. “No futuro, decairão ou desaparecerão. A Europa oriental terá que reconhecer isto e agir em consequência”, acrescentou. Envolverde/IPS