Espalhadas pelas ruas de Munique, em meio a pontos turísticos da cidade alemã, estão diversas bancas de frutas. Uma oferta ampla e simples de alimentos saudáveis para estimular uma dieta balanceada e, indiretamente, combater a obesidade em um país amplamente afetado pelo problema. Segundo pesquisa de 2007 da Associação Internacional para o Estudo da Obesidade (Iaso, sigla em inglês), a Alemanha tem o maior número de pessoas acima do peso ou obesas da Europa: 75,4% dos homens e 58,9% das mulheres.
O exemplo alemão de apoio à alimentação saudável poderia ser aplicado à realidade brasileira, propõe o diretor de nutrição do Instituto Dante Pazzanese e do Hospital do Coração, Daniel Magnoni. De acordo com o cardiologista e nutrólogo, a medida é uma maneira prática de tentar inserir frutas na dieta dos brasileiros. Pois, apenas 19% dos adultos nas capitais afirmam consumir o mínimo de três porções diárias recomendado, apontam dados da revista médica britânica The Lancet. “Porque não viabilizar essas barracas de forma organizada e com os valores calóricos das porções?”, questiona.
Para a iniciativa ter maior apelo junto à população, Magnoni defende também a redução dos impostos sobre as frutas, além de verduras, legumes e cereais, diminuindo assim os seus preços. “Para vender mais carros, o governo baixa as taxas. Porque não fazer o mesmo com alimentos não relacionados à obesidade?”
O nutrólogo, que desenvolve o projeto Obesidade Zero, aprovado em 2010 pela federação latino-americana de Nutrição para ser implementado em todo o continente, ainda propõe que os governos municipais defininam os pontos e licitem as bancas seguindo um padrão estético semelhante ao das bancas de jornal. “A implementação teria custos, mas também geraria empregos. Como um negócio, haverá pessoas querendo investir.”
Um apoio ao combate à obesidade, que avança de maneira alarmante no País. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2010, cerca de metade dos homens e das mulheres brasileiras estão acima do peso, com 12,5% e 16,9% de obesos, respectivamente. “Apesar de a obesidade ser uma doença com maior prevalência que a Aids, problemas cardiovasculares ou hipertensão, pouco se fala e faz a respeito.”
Por isso, diz o médico, o Obesidade Zero foi desenvolvido para informar a sociedade e auxiliar na criação de políticas públicas contra a doença. “Quando a Aids era uma epidemia, surgiram diversas ações de tratamento e prevenção. Agora a obesidade é uma epidemia mundial e não há ações governamentais integradas.”
Magnoni ressalta que a prevenção da doença representa também a redução de custos no sistema de saúde, evitando complicações secundárias ligadas à obesidade. Projeções recentes da Lancet, em estudo de pesquisadores da Universidade Columbia, mostram que até 2030 os EUA terão metade da população obesa, implicando um gasto anual de 66 bilhões de dólares em saúde.
Ações básicas contra a obesidade
Para ter acesso a dados confiáveis sobre o problema, um dos nove passos do Obesidade Zero propõe a obrigatoriedade da adoção de uma medida simples: todos os pacientes de postos de saúde devem ser medidos e pesados no atendimento. “A partir daí pode-se configurar alguém como obeso e tratá-lo”, afirma o nutrólogo, que defende a realização de pesquisas de impacto sobre a doença.
Magnoni conduz atualmente um estudo analisando a evolução do peso e da altura dos jovens durante o alistamento militar entre 1957 e 1991. Mesmo sem estar finalizada, o médico adianta a CartaCapital alguns dados do levantamento, baseado no peso e altura de homens na faixa dos 18 anos. “Esses jovens engordaram mais do que cresceram ano a ano. Estão aparecendo mais obesos e obesos mórbidos nessa idade que há 20 anos.”
Desta forma, o projeto já busca ferramentas para informar a população e desenvolveu uma parceria com a Escola Superior de Publicidade e Marketing (ESPM) de São Paulo, com quem deve atuar em ações de conscientização, workshops e elaboração de prêmios. Há acordos também com a Sociedade dos Clubes Esportivos, Conselho Federal de Nutrição e Associação Paulista de Medicina, entre outras instituições.
Além disso, o Obesidade Zero também quer proporcionar educação alimentar às crianças, normatizar as merendas com quantidades específicas de calorias, eliminando produtos industrializados, e proteger os jovens da publicidade de comidas prejudiciais à saúde. “É preciso coibir de forma expressiva a propaganda de alimentos para as crianças, pois vendem brinquedos com comidas que engordam.”
Esses alimentos entraram na mira da Dinamarca, que taxou produtos com mais de 2,3% de gordura saturada em sua composição. Entre os itens incluídos na medida estão a manteiga, leite, queijos e pizzas. A taxa inclui cerca de 5,2 reais por quilo de gordura saturada no produto.
Uma realidade que não está distante do Brasil, segundo Magnoni. “A indústria alimentícia vai ter que se adaptar e trabalhar em produtos mais saudáveis, com menos calorias e sal ou serão punidas e perderão clientes.”
* Publicado originalmente no site da revista Carta Capital.