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Extremismo atrai jovens do Quênia

A comunidade muçulmana continua lamentando os atentados terroristas contra civis inocentes, e ressalta que o Islã condena a violência. Foto: Miriam Gathigah/IPS
A comunidade muçulmana continua lamentando os atentados terroristas contra civis inocentes, e ressalta que o Islã condena a violência. Foto: Miriam Gathigah/IPS

 

Nairóbi, Quênia, 26/9/2013 – Ali Hassan Gitonga, de 33 anos, pertence à comunidade meru da Província Oriental do Quênia, e há pouco se converteu ao Islã. Comenta-se que em 2011 viajou à Somália para treinar com a organização islâmica Al Shabab. Agora está preso por suposta participação no atentado terrorista do dia 21, no centro comercial Westgate, em Nairóbi. Em 2011, quatro mil soldados da Força de Defesa do Quênia, no contexto de uma ofensiva chamada Operação Proteger a Nação, viajaram à Somália para expulsar a organização terrorista Al Shabab do sul desse país.

Desde a operação, essa organização realizou uma série de ataques de represália em várias partes do Quênia, que feriram, mutilaram e assassinaram civis. E, do Ministério de Segurança Interna surge que Gitonga é apenas um dos cada vez mais jovens, com idades entre 15 e 34 anos, da África subsaariana que estão se voltando para o radicalismo islâmico. Quênia, Somália, Eritreia e Tanzânia são alguns dos países que enfrentam o maior risco desta ameaça.

Abdi Muhamud, ativista e especialista em direitos humanos na Província Costeira do Quênia, disse que “muitos jovens de famílias pobres viajam à Somália para treinar com o Al Shabab, que lhes promete empregos lucrativos fora do país e apoio econômico para suas famílias”. A ascensão e o domínio, que desde 2009 esse grupo exerce na Somália, têm sérias implicações para os países vizinhos, particularmente o Quênia, destacou.

O International Crisis Group (ICG), uma organização não governamental que trabalha para resolver e prevenir conflitos, apontou que o grupo radical “criou, nos últimos quatro anos, uma infraestrutura formidável e secreta de apoio no Quênia, um ramo jihaidsta salafista diminuto, mas altamente radical, estreitamente unido e reservado, que toma o Al Shabab como exemplo”.

Embora não se discuta que haja atividade terrorista no Quênia, líderes muçulmanos, especialistas em direitos humanos e analistas políticos discordam sobre a existência e o grau de radicalismo entre os muçulmanos quenianos. “Há radicalismo entre os muçulmanos do Quênia”, afirmou Muhamud. “O lema ‘Pwani Si Kenya’ (A Província Costeira Não É o Quênia), usado pelo Conselho Republicano de Mombassa para que essa província se separe do governo central, é um bom indicador”.

Muhamud detalhou à IPS que esse órgão, que se orgulha de ter mais de 1,5 milhão de seguidores, foi criado em 1999, esteve paralisado até 2008, quando ressurgiu com esse lema. “Foi nessa época que a presença do Al Shabab na Somália começou a crescer de modo significativo. Estes fatos estão relacionados”, garantiu. “Os muçulmanos do norte do Quênia e da Província Costeira são os principais alvos do recrutamento para o extremismo do Al Shabab e de seus simpatizantes. Seus habitantes são predominantemente muçulmanos que se sentem marginalizados pelo governo central”, pontuou.

Porém, Cyprian Nyamwamu, diretor-executivo da East African Democracy Foundation, discorda. “A situação é muito mais complexa do que o radicalismo, e deve ser abordada à luz da geopolítica e da economia mundial. O Quênia é uma nação estratégica do oriente africano, e o Ocidente tem um interesse significativo em converter esse país em um alvo fácil”, opinou. Segundo o ICG, desde 11 de setembro de 2001 (data dos atentados que deixaram mais de três mil mortos em Nova York e Washington), o Quênia ajuda ativamente nos esforços do Ocidente para identificar, prender e deter supostos terroristas.

Muhamud disse que isso deixa o Quênia vulnerável aos ataques de “inimigos dos países ocidentais. Esta não é uma guerra queniana, mas uma guerra global”. Nyamwamu concorda. “Estamos tratando com extremistas de fora do Quênia. Basta ver o ataque ao centro comercial Westgate. É evidente que o capital humano é significativamente externo. Os serviços de segurança interna indicam que a maioria dos atacantes era de europeus. Talvez estejamos diante da reinvenção da rede Al Qaeda”, ponderou.

Porém, Muhamud disse que ignorar o avanço do radicalismo faz parte do problema. “O Chifre da África, onde fica a Somália, também está geograficamente perto do Oriente Médio. Os países ocidentais devem abordar os problemas do Oriente Médio porque estes estão se espalhando para a África subsaariana através da conflituosa Somália”, ressaltou.

Há quem culpe pelo crescente radicalismo nem tanto a religião, mas o desemprego. Estatísticas do governo mostram que, a cada ano, 500 mil jovens entram no mercado de trabalho. Dos 19,8 milhões de pessoas em idade de trabalhar neste país, de 41 milhões de habitantes, pelo menos 70% têm entre 18 e 34 anos. E mais de 65% destes jovens estão desempregados. Além disso, as estatísticas mostram que, para cada dois crimes registrados na polícia, um foi cometido por um jovem de 16 a 25 anos.

“Temos pessoas não somalianas explorando a crescente população de jovens desempregados. Estes terroristas não são jovens que vão à mesquita”, opinou o sacerdote Gabriel Dolan, colunista do Saturday Nation e destacado ativista pelos direitos humanos. “A maioria dos presos no passado por sua conexão com as atividades do Al Shabab foi de jovens que disseram ter se convertido ao Islã, e pertencentes a várias comunidades não somalianas”, acrescentou.

Dolan enfatizou que “estamos tratando com pouquíssimos radicais. Não é um problema generalizado de radicalismo. Lamentavelmente, não se precisa de grandes quantidades para promover as ideologias extremas. A partir dos 15 atacantes que, se estima, participaram do ataque de Westgate, perdeu-se mais de 62 vidas e há pelo menos 200 feridos. E este é apenas um incidente”.

Hussein Gullet, do Fórum Nacional de Líderes Muçulmanos do norte do Quênia, região onde predominam somalianos originários, afirmou que “não se pode responsabilizar o Islã pelo jovens estarem ociosos e vulneráveis à exploração. Os muçulmanos não aderem ao terrorismo. Os terroristas que atuam no Quênia são estrangeiros. Estes são ataques patrocinados por estrangeiros”.

Segundo Gullet, “o radicalismo não é uma reação islâmica. Tal extremismo é comum em países onde há hostilidade entre muçulmanos e cristãos. Os muçulmanos neste país gozam dos mesmos direitos e liberdades que as pessoas de outras religiões. As forças de segurança devem investigar a causa dos ataques terroristas e chegar a uma solução que aborde as realidades no terreno”. Envolverde/IPS