Arquivo

Fechamento de paraísos fiscais é a chave contra a fome

Madri, Espanha, 14/10/2011 – Para colaborar eficazmente na luta contra a fome no mundo, o governo da Espanha deve impulsionar já o fechamento de paraísos fiscais e a criação de um imposto sobre movimento especulativo de capitais, disse à IPS Jesús María Medina, coordenador da campanha Direito à Alimentação. A iniciativa de luta contra a fome, da qual participam dezenas de organizações não governamentais de toda a Espanha, faz parte da celebração, no dia 16, do Dia Mundial da Alimentação e, no dia 17, do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

Outro participante da campanha, Amador Gómez, diretor-técnico da organização Ação Contra a Fome, disse à IPS que o governo espanhol deve ter presente que o direito à alimentação é reconhecido pela jurisdição internacional e, portanto, os Estados têm “a obrigação de fazê-lo valer”. O governo espanhol, acrescentou Gómez, não só deve fazer tudo o que estiver ao seu alcance, com deve atuar com firmeza nos fóruns de decisão, como a União Europeia e a Organização Mundial do Comércio (OMC), para que sejam limitadas as proporções de matérias-primas que podem ter um só investidor ou grupo de investidores, estabelecer tributos sobre movimentos financeiros especulativos e suprimir os paraísos fiscais.

Também propõe que sejam estabelecidas moratórias sobre a compra e venda de terras em grande escala e que se leve em conta que “os alimentos deixaram de ser um bem básico e passaram a ser um novo recurso estratégico e, com isso, objetivo de especulação. Especula-se com um recurso básico que é necessário e indispensável para as famílias”, afirmou. Sobre este último aspecto, Gómez insistiu em destacar que, apesar dos aumentos de preços registrados anualmente desde 2008, não foram tomadas medidas para evitar que isso ocorresse e “as capacidades das famílias não aumentaram, ficando mais expostas a esta terrível situação”. Para Gómez, “cuidar dos alimentos é proteger as famílias, bem como especular com eles é especular com a saúde e a nutrição das famílias com menos recursos”.

Medina, por sua vez, recordou que o governo espanhol deu, nos últimos três anos, uma importante prioridade à cooperação para o desenvolvimento, mas que além disso deveria fazer com que se atue contra o “tremendo movimento de monopolização de terras no Sul”. Este fenômeno, calculado em mais de 200 milhões de hectares nos países em desenvolvimento, é majoritariamente destinado à produção de agrocombustíveis e fibras para a indústria têxtil, entre outros produtos, e não para aumentar os alimentos para as populações locais, acrescentou.

Por isso, Medina considera que faltam diretrizes para uma atuação da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) contrapondo-se a essa monopolização e que se exorte urgentemente os governos a criarem uma moratória sobre a venda de alimentos em grande escala. Também afirmou que, além de combater o movimento financeiro especulativo, o governo deveria gerar uma bolsa de recursos contra a fome, destinada aos países do Sul.

Por fim, destacou que a produção de agrocombustíveis, da qual a União Europeia participa incentivando-a, tem um impacto negativo na segurança alimentar dos países mais empobrecidos. Nessa linha, destacou que 40% da colheita de milho nos Estados Unidos é usada para produzir metanol e que em outros países, como na Indonésia, diminuiu a produção de alimentos devido ao uso de terras para plantar a palma africana. O fruto desta planta, cujo cultivo extensivo exige pouca mão de obra e muito fertilizante químico, fortes herbicidas e muito terreno, é usado, em sua maioria, para fabricar cosméticos, sabão, detergente, velas, lubrificantes e outros produtos similares. Dessa forma, além de a terra não ser utilizada para produzir alimentos, se enfraquece e fica contaminada.

A organização Ajuda em Ação destaca em seu último informe que, segundo a FAO, em 2009 havia no mundo 1,02 bilhão de famintos, e outros dois milhões que sofrem a chamada “fome oculta”, ou seja, carências severas de micronutrientes, o que dificulta o desenvolvimento de suas capacidades e funções vitais. Por isso, esta entidade não governamental, apoia a campanha Direito à Alimentação, junto com a católica Caritas Espanhola, Engenharia Sem Fronteiras e Prosalus.

A campanha, entre outras coisas, pretende sensibilizar os governos do mundo para que tornem efetivo o direito à alimentação no contexto de uma política de soberania alimentar. E, também, que se imponha o respeito, a proteção e a garantia do direito à alimentação como um direito humano fundamental. Para isso, propõe-se uma revisão das políticas públicas e que se destine dinheiro suficiente para garantir a efetividade do direito à alimentação em todos os países do mundo, dando especial atenção aos do Sul. Envolverde/IPS