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Fiji levará a voz do Sul ao G-77

Brisbane, Austrália, 18/10/2012 – Pela primeira vez, em 48 anos, um pequeno Estado insular do Oceano Pacífico se prepara para assumir a presidência do Grupo dos 77 (G-77) mais a China. Em 2013, a República de Fiji, localizada entre Vanuatu e Tonga e governada por um regime militar liderado pelo primeiro-ministro Frank Bainimarama, assumirá a presidência da maior coalizão intergovernamental dentro da Organização das Nações Unidas (ONU), em substituição à Argélia.

A escolha de Fiji “demonstra a confiança da comunidade internacional quanto a podermos presidir essa organização em seus esforços para impulsionar os temas que são de grande importância para todos os países em desenvolvimento”, disse à IPS o ministro de Fiji para Assuntos Exteriores e Cooperação Internacional, Ratu Inoke Kubuabola.

O G-77 foi criado originalmente com 77 Estados, em 1967, com o objetivo de o Sul ter uma voz comum. Desde então a coalizão, agora, com 132 membros, impulsiona a cooperação Sul-Sul como estratégia principal para melhorar a qualidade de vida e a economia das nações mais pobres. Este grupo intergovernamental, que identifica a erradicação da pobreza como um de seus maiores desafios, também foi influente no estabelecimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.

Segundo um informe da ONU divulgado no ano passado, a cooperação Sul-Sul impulsionou o desenvolvimento e os investimentos entre as nações pobres, e é um formidável motor do crescimento econômico. Entre 1990 e 2008, o comércio mundial quadruplicou, enquanto o intercâmbio comercial Sul-Sul cresceu 20 vezes.

O crescente papel de Fiji dentro da ONU foi confirmado na última reunião de chanceleres do G-77, dia 28 de setembro em Nova York. Esse Estado insular, com 868 mil habitantes distribuídos em mais de 330 ilhas, tem uma economia dominada pelas indústrias do açúcar e do turismo. Além disso, ostenta o melhor índice de desenvolvimento humano dentro da sub-região oceânica da Melanésia.

Entretanto, a luta pelo poder político entre os fijianos originários e os descendentes de índios, que representam, respectivamente, 57% e 37% da população, foi causa de quatro golpes militares nesse país desde 1987. No último, ocorrido em 2006, Bainimarama, comandante das forças armadas, tomou o poder e dissolveu o parlamento, argumentando que lutava contra a corrupção.

Seu objetivo declarado é reformar o sistema eleitoral, baseado em distinções de raças, e redigir uma nova Constituição após uma série de consultas nacionais para, finalmente, convocar eleições democráticas em 2014. Entretanto, a resistência do regime em realizar eleições em 2010 motivou sanções internacionais e, em 2009, a suspensão desse país da Commonwealth (Comunidade de Nações) e do Fórum de Ilhas do Pacífico, grupo regional intergovernamental de Estados independentes.

O governo recebe um significativo apoio econômico e político da China, e também está politicamente envolvido na região sudoeste do Pacífico, como integrante do Grupo Melanésio Avançado (MSG), formado também por Ilhas Salomão, Nova Caledônia, Papua Nova Guiné e Vanuatu.

Nijunj Soni, presidente da junta do Instituto do Pacífico para Políticas Públicas (PIPP), centro de estudos independente com sede em Port Vila, Vanuatu, disse à IPS que o Fórum de Ilhas do Pacífico já não é a única organização que as nações da região têm para coordenar uma postura comum. Agora há outras plataformas, como o MSG ou a Aliança de Pequenos Estados Insulares (Aosis), acrescentou.

“A presidência do G-77 dará aos líderes de Fiji a oportunidade de alcançar o resto da região pela via de consultas para garantir que uma só voz seja ouvida no cenário internacional”, pontuou Soni. “O Pacífico terá uma rara oportunidade de representar a si mesmo perante o mundo”, destacou. Isto é cada vez mais importante para esses Estados insulares, cuja posição geoestratégica atrai superpotências como a China e os Estados Unidos.

Pequim aumenta seus investimentos e sua presença nas ilhas, enquanto Washington dá passos para renovar suas alianças na região, em áreas que vão desde ajuda humanitária até segurança, ao mesmo tempo em que fortalece seus vínculos na área de defesa com a Austrália. As ilhas do Pacífico também são ricas em recursos minerais, florestais e marinhos. O PIPP destacou que a prioridade para a região é elevar sua voz em temas de segurança e administração de recursos, no contexto do aquecimento global.

O Pacífico cobre metade da superfície oceânica mundial e um terço da superfície total do planeta. A região contém alguns dos maiores recursos naturais não explorados e também parte das nações mais vulneráveis”, observou Soni. “Continua sendo vital que os pequenos Estados insulares em desenvolvimento não sejam usados pelas grandes potências como seus representantes para suas próprias batalhas geopolíticas. Ao mesmo tempo, devemos ser capazes de proteger nossos recursos naturais para benefício de nossos povos”, acrescentou.

A influência global do G-77 cresce conforme os países em desenvolvimento, especialmente Brasil, China e Índia, surgem como novos líderes da economia mundial. Segundo o informe da ONU deste ano sobre as perspectivas econômicas globais, os países do Sul em desenvolvimento crescerão, em média, 5,9% no ano que vem, enquanto os do Norte industrial crescerão 1,9%.

No entanto, na reunião ministerial de Nova York também foi dada ênfase em muitos desafios que têm pela frente as nações em desenvolvimento, como o impacto da crise financeira global no mercado mundial, a insegurança alimentar, a pobreza e os efeitos da mudança climática.

“O G-77 fixou suas posturas em negociações sobre mudança climática e desenvolvimento sustentável, duas áreas em que os pequenos Estados insulares se concentraram em Nova York”, disse Kubuabola. “Essas são duas áreas nas quais Fiji deseja dar ênfase para garantir que os interesses de todos os países em desenvolvimento, incluindo os pequenos Estados insulares, sejam efetivamente considerados”, ressaltou. Envolverde/IPS