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Flagelo do desemprego se espalha a partir da Europa

Gregos protestam contra as medidas de austeridade, em março de 2010. Foto: Apostolis Fotiadis/IPS

Genebra, Suíça, 2/5/2012 – A situação do mercado de trabalho mundial continua se deteriorando e as perspectivas de uma recuperação do emprego são escassas, pelo menos nos próximos quatro anos, alerta um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Os retrocessos no setor são notórios nos países europeus, em particular na Espanha, afirmou o economista Raymond Torres, diretor do Instituto Internacional de Estudos Trabalhistas, uma entidade autônoma da OIT.

O número de países onde o desemprego aumenta é significativo, enfatizou Torres na apresentação do “Trabalho no mundo 2012: melhores empregos para uma economia melhor”. Por exemplo, em mais de dois terços dos países europeus o desemprego aumentou no último ano, apontou. “As mulheres também acabam vítimas do fenômeno”, explicou à IPS.

Em muitos casos, as mulheres estão em posições semelhantes às dos jovens, que precisam entrar em um mercado fechado devido à crise financeira. Contudo, no caso delas, trata-se de um reingresso, depois da licença maternidade, em um mercado onde foram criados pouquíssimos empregos. “Naturalmente, esta é uma situação muito difícil”, destacou Torres.

O quadro do desemprego alarmante não diminui na Europa. Em outras partes do mundo há escassos progressos, como nos Estados Unidos, onde parecem retroceder os progressos obtidos na redução do desemprego, afirmou Torres. Nos países árabes a situação se mantém, enquanto na China e em outras economias asiáticas se reduz o avanço alcançado em números de ocupação e também há casos de aumento do desemprego.

A única parte do mundo onde no momento a tendência se apresenta relativamente positiva é na América Latina, ressaltou o economista. Entretanto, mesmo nessa região, podem ser detectados alguns sinais de retrocesso, acrescentou.

As projeções elaboradas pela OIT sugerem que, ao final deste ano, a taxa mundial de desemprego será de 6,1%, e terão perdido seus empregos outros seis milhões de pessoas, para chegar ao número total de 202 milhões. E, no próximo ano, serão cinco milhões a mais nessa situação, e por isto a quantidade global de desempregados aumentará para 207 milhões, observou Torres. Até agora a OIT mantinha em 50 milhões o número de postos de trabalho fechados no mundo desde o surgimento, em 2008, da crise financeira e econômica global que ainda persiste.

O informe interpreta que uma combinação de medidas de austeridade e de reformas trabalhistas mal concebidas é a causa real da deterioração atual na Europa, e que “pouco a pouco se espalha para outras partes do mundo”, alertou o especialista. A austeridade não produziu maior crescimento econômico, destacou Torres. A crença era que, com a redução no orçamento e nos investimentos públicos, e de demanda da mesma origem, se moveria o setor privado. Porém, isso não ocorreu, explicou.

A demanda em conjunto é fraca e a isto se soma o fato de as empresas, especialmente as menores, continuarem com dificuldades de acesso a crédito. Nas economias avançadas, as condições do crédito para empresas pequenas são problemáticas, e este aspecto é crucial para entender o atual retrocesso, segundo Torres.

Outro aspecto questionado pelo informe da OIT está nas “reformas trabalhistas mal concebidas”. O economista condena a prática de adiantar a idade de aposentadoria estabelecida em alguns países e advertiu que a reforma deveria ser em sentido inverso, estendendo o período de vida economicamente ativa dos trabalhadores. Este tipo de reforma em uma época de crise tende a conduzir a uma destruição maior de empregos e não à criação de novos postos de trabalho, afirmou.

Torres disse que a estratégia da austeridade fiscal foi contraproducente em relação aos seus objetivos para manter a confiança e a redução do déficit orçamentário. Na Espanha, o déficit caiu de pouco mais de 9% do produto interno bruto em 2010 para 8,5% em 2011. Uma queda muito pequena depois de um considerável programa de drástica austeridade, ressaltou. E o mesmo ocorre em outros países, indicou o especialista.

O fenômeno se espalha devido aos vínculos internacionais, diz o informe da OIT. Por intermédio destes laços, a situação dos países industrializados contagia outras regiões, explicou Torres. Esses países também se veem afetados pela natureza instável dos fluxos de capitais internacionais, que introduzem maior volatilidade nas economias reais dessas nações e enfraquecem a geração de emprego e a estabilidade dos postos de trabalho, insistiu.

A OIT recomenda a aplicação de um enfoque de austeridade fiscal que seja mais favorável ao emprego. Assim, seria possível criar entre 1,8 milhão e 2,1 milhões de postos de trabalho nas economias mais desenvolvidas, quase três vezes mais do que se poderia esperar com as atuais políticas, ressaltou o economista.

Torres chama a atenção para um dos aspectos mais cruéis do desemprego, que se verifica quando as mulheres, por causa da maternidade, deixam o trabalho e desaparecem do mercado profissional. Algumas delas são mães solteiras ou separadas com todo o peso das responsabilidades familiares, sem nenhum apoio e carentes de serviços de atenção à infância que lhes facilitem o trabalho.

Outro problema surge quando as mulheres se incorporam ao mercado de trabalho. Em geral, estudam mais tempo e conseguem melhores resultados da educação do que os homens jovens. Porém, tendem a obter postos inferiores aos atribuídos a esses homens. “Certamente, há uma enorme quantidade de progressos que devem ser alcançados em termos de igualdade de gênero e em especial é necessário considerar esta crise como uma oportunidade para consegui-la”, declarou Torres à IPS.

Sobre a América Latina, o especialista afirmou que a situação trabalhista da mulher melhora na região. Isto faz parte de um esforço importante nesses países para reduzir as desigualdades, afirmou Torres. É uma região que progrediu ao menos na conscientização e onde diminuiu um pouco a desigualdade de renda, o que representa uma ajuda, especialmente para as mulheres, concluiu. Envolverde/IPS