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Formados em informática à espera de oportunidades

A indústria informática busca se reafirmar em Cuba, onde faltam postos de trabalho para as novas levas de engenheiros nessa área. Foto: Jorge Luis Baños/IPS

 

Havana, Cuba, 26/3/2013 – Milhares de jovens cubanos se formam em engenharia informática, desde que há uma década as autoridades apostaram em fortalecer esse setor. Mas seu futuro profissional é incerto, por carências de organização e conectividade. “Não exerço a engenharia”, contou à IPS uma jovem de 24 anos, formada em 2011 na Universidade de Ciências Informáticas (UCI). Este centro, idealizado para se converter em um polo de formação e desenvolvimento, foi o grande passo de Cuba em 2002 para potencializar o campo da programação (software).

Enquanto era estudante a jovem imaginava um futuro seguro na área digital. Contudo, a colocaram para estagiar em um órgão estatal de análises estatísticas, onde o trabalho não é “nem para um engenheiro, nem para um técnico em informática”, afirmou. “Não estou aprendendo nada da minha área e em meu trabalho faço tarefas de estatística”, lamentou a engenheira pedindo para não ter seu nome revelado. Apenas uns poucos colegas de aula conseguiram empregos na área de software, enquanto muitos outros dão aula em escolas secundárias ou institutos. Em sua formatura havia 1.600 engenheiros da área de informática.

O especialista Juan Triana, do estatal Centro de Estudos da Economia Cubana, alerta que esta ilha caribenha deve aproveitar mais o capital humano formado durante décadas nas universidades. O país tem potencial para abrir-se à economia do conhecimento, mas deve obter mais inovações em ciência e tecnologia, e organizar sistemas regionais e locais de inovação que empreguem seus recursos humanos, afirma Triana no documento Cuba: a economia do conhecimento e o desenvolvimento, de 2012.

Assim, a massa de técnicos e engenheiros de informática da UCI, com sede em Havana, poderiam desempenhar um importante papel na reforma econômica iniciada pelo governo de Raúl Castro em 2008. Até julho passado, a sede da UCI na capital formou 10.021 engenheiras e engenheiros. O centro também tem faculdades em outras três cidades. E outras universidades incluem a informática, mas com menor número de alunos.

O ensino técnico profissional também inclui esta especialidade. O Escritório Nacional de Estatísticas e Informação indicou que em 2011 se graduaram 1.466 estudantes em eletrônica, automatização e comunicações. O impulso acadêmico fez com que os formados fossem em número superior ao de empregos gerados pela indústria, afirmam observadores.

Entretanto, Luis Guillermo Fernández, diretor-geral da Softel, uma empresa soluções para o setor da saúde, discordou dessa análise em conversa com a IPS, durante a Feira Internacional Informática 2013, que aconteceu em Havana entre 19 e 22 deste mês. O encontro é realizado há 15 anos para intercambiar com empresas e pesquisadores de outras latitudes, bem como para buscar negócios e cooperação. Desta edição participaram cerca de 1.400 profissionais de 30 países, liderados pela China.

O engenheiro Fernández defendeu que “não sobram graduados, pelo contrário, faltarão quando estivermos organizados”, recordou que “quase todos os projetos atuais possuem um suporte informático”. A seu ver, é “imprescindível ordenar e atualizar a indústria informática. Não organizamos bem o que é necessário nem aonde queremos chegar”. Este veterano do setor afirmou que é urgente “ampliar a cultura informática para usar os recursos humanos de forma mais efetiva e abrir mais oportunidades”.

Entre os problemas do ramo, Fernández identifica a necessidade de estabelecer metas e prioridades claras de desenvolvimento, administrar investimentos, conseguir mais competitividade, qualidade e eficiência para ampliar a exportação de serviços e ser um lugar atraente para que empresas estrangeiras estabeleçam aqui alguns componentes. O país dispõe apenas de uma banda larga mínima de 323 megabits por segundo, via satélite, o que limita a conectividade à internet de instituições, empresas e particulares. Desde 2012 está em operação um cabo de fibra ótica, graças a um convênio com a Venezuela, que se espera paulatinamente reverta esta realidade.

Exportar bens e serviços digitais foi um dos objetivos quando, em 2003, se decidiu impulsionar este setor. Embora centros como a UCI vendam alguns de seus produtos e engenheiros trabalhem em projetos com países como a Venezuela, fontes especializadas afirmam que ainda falta um longo caminho a ser percorrido. A substituição de importações e o impulso às exportações foram parte dos objetivos, mas a balança se mantém deficitária, segundo se comentava na feira.

Ao terminar 2003 existiam no país 44 empresas produtoras de software, das quais 24 pertenciam ao Ministério de Informática e Comunicações. Agora a pasta reduziu esse número para 22. A maioria se dedica a atender demandas da institucionalidade cubana, em um país cuja economia continua centralizada. O pessoal jovem ganha espaço em entidades como Desoft, dedicada à gestão empresarial nas 15 capitais provinciais e em 139 municípios, contou à IPS Anabel García, porta-voz desta empresa estatal. Mas, a média de seus trabalhadores ainda ronda os 40 anos, acrescentou.

Mas, foi na feira que se viu o domínio de jovens, como Abel Fírvida, de 27 anos, que trabalha no projeto Nova, a adaptação cubana do sistema operacional Linux, criado em 1990 pelo finlandês Linus Torvalds. Desde que era estudante, e graças ao seu alto rendimento escolar, Fírvida se incorporou a esta iniciativa, que durante a feira apresentou sua versão 3.0. Para ele, os graduados com melhores resultados acadêmicos encontram oportunidades. O Nova, desenvolvido pelo UCI e por uma empresa das Forças Armadas, é entregue atualmente a quem deseja instalá-lo, informou a IPS Fírvida, que também é professor. Assim, esta equipe de 60 integrantes promove a migração para sistemas digitais de código aberto, que garantirão ao país maior segurança e soberania. Envolverde/IPS