Roma, Itália, 18/6/2013 – Alguns países da América do Sul afetados pelo monopólio de terras começam a tomar medidas para enfrentar o fenômeno. O land grabbing (em inglês), ou monopolização de terras, se faz sentir desde 2007 com investimentos milionários na compra ou no arrendamento de grandes extensões cultiváveis na África, América Latina e Ásia, no qual convergem corporações transnacionais, elites nacionais e fundos de investimento controlados por países como China, Kuwait, Catar e outros.
A América Latina e o Caribe não estão fora da tendência, com Argentina e Brasil na liderança. Uma série de estudos e análises, realizados em 2011 pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) em 17 países da região, encontrou diferentes graus do fenômeno no México, Chile, Uruguai, Colômbia Nicarágua e República Dominicana.
O monopólio segue junto com a expansão de cultivos que são insumos no tripé agropecuário alimento-forragem-combustível, frequentemente voltado para a exportação. Saturnino Borras, autor de um desses estudos, explicou à IPS que “a convergência de crise alimentar, energética, financeira e climática é o fator mais importante da atual febre global de terras”.
Além disso, “outro aspecto é a fusão dos setores de alimentos e energia, que se aprecia de várias formas, como a aparição de colheitas que podem ser utilizadas indistintamente como alimento, forragem ou biocombustível: cana-de-açúcar, milho, soja ou palma”, pontuou Borras, professor associado de desenvolvimento rural, meio ambiente e população da holandesa Universidade Erasmo de Roterdã.
Embora nem sempre o monopólio implique estrangeirização na América Latina, os governos de Argentina, Brasil e Uruguai aprovaram ou anunciaram leis para evitar investimentos estrangeiros maciços neste setor. Em dezembro de 2011, a Argentina promulgou uma lei pela qual “os estrangeiros em seu conjunto não podem possuir mais de 15% da terra agrícola nacional”, explicou à IPS o representante permanente desse país na FAO, Gustavo Infante, nos corredores da 38ª conferência dessa agência da ONU, em Roma.
Desses 15%, as empresas e os investidores institucionais do exterior não podem adquirir terras que juntas somem mais de 30%. E cada companhia e investidor individual não pode possuir mais de mil hectares. “Com base nesta lei, estamos modernizando os registros de propriedade das províncias da república federal, homologando-os para fazer um registro nacional”, informou Infante.
Em 13 de maio, o Uruguai anunciou que prepara uma legislação para impedir a compra de terras por parte de Estados estrangeiros, disse o secretário da Presidência, Homero Guerrero. Porém, não está claro se são os Estados estrangeiros que estão adquirindo terras em grande escala no Uruguai. Segundo dados oficiais de junho, nos últimos 12 anos foram feitas 31 mil operações de compra e venda de sete milhões de hectares, quase 43% da superfície do país. O valor do hectare foi multiplicado por nove no mesmo período.
O Brasil também fixou a mira nas aquisições estrangeiras. E, mediante a reinterpretação de uma lei de 1971, proibiu em 2010 que empresas estrangeiras, inclusive atuando com subsidiárias locais, adquirissem mais de 50 módulos de terras, entre 250 e cinco mil hectares, segundo a região. E, em 2011, proibiu que investidores estrangeiros comprassem ou fizessem fusão com empresas locais que possuam terras cultiváveis.
Entretanto, a organização não governamental Grain, que promove o uso sustentável da biodiversidade agrícola, diz que essas legislações são insuficientes. As restrições deixam muitos flancos abertos, como o monopólio indireto, ou ignoram realidades habituais na região, como o peso que as elites econômicas locais continuam tendo nas grandes propriedades.
“Limitar o investimento direto em terras não é algo ruim”, afirma a Grain em um informe de fevereiro. “Contudo, seria preferível um enfoque mais integral: que as novas políticas sobre terras sejam traçadas como parte de uma reorganização mais ampla das estratégias de desenvolvimento agrícola e rural”, acrescenta. Assim, as novas leis representam “soluções superficiais, carregadas de ambiguidade, efeitos perversos e debates muito restritos que melhoram a reputação dos políticos, mas não resolvem nenhum problema das comunidades locais”, conclui a Grain. Envolverde/IPS