Arquivo

Gana, o país dos aluguéis astronômicos

Com uma população cada vez maior e a falta de moradia para atender a demanda, o mercado de alugueis em Acra está pautado por regras de jogo desiguais. Foto: Selorm Kwame Attikpo/IPS
Com uma população cada vez maior e a falta de moradia para atender a demanda, o mercado de aluguéis em Acra está pautado por regras de jogo desiguais. Foto: Selorm Kwame Attikpo/IPS

 

Acra, Gana, 6/12/2013 – Os avisos de propriedades para alugar estão por todos os lados na capital de Gana. Mas, em cada cartaz há uma advertência: cuidado com os corretores corruptos. Com uma população cada vez maior e falta de moradia para atender a demanda, o mercado de imóveis para alugar em Acra carece de regras claras.

Elvina Quaison é uma gerente comercial que em 2011 chegou a este país do ocidente africano, procedente de Londres, com a esperança de iniciar sua própria empresa. Com 32 anos na época, sabia que não queria viver com familiares, mas não imaginou o quanto poderia ser caro morar em Acra. Quando chegou instalou-se com uma amiga e depois de dois meses começou sua busca. “Muito rapidamente, meu orçamento passou de US$ 200 para US$ 400 mensais”, contou à IPS.

A jornada mínima em Gana é de US$ 2,50 ou US$ 87 por mês, e o salário médio gira em torno de US$ 400 mensais. Nana Osei, um jovem de 25 anos que acaba de se formar, vive com sua tia e procura um lugar para ficar independente. “Os aluguéis estão muito caros”, disse à IPS, acrescentando que ganha apenas US$ 75 por mês.  O aluguel de um apartamento de dois quartos, por exemplo, perto do centro da cidade, pode partir de US$ 200 e chegar até US$ 2 mil em áreas mais cotadas. Essas propriedades costumam estar reservadas para trabalhadores estrangeiros cujas empresas pagam essa despesa.

“As famílias que têm empregos regulares podem obter adiantamento (para o aluguel) de seus salários. E sobrevivem com orçamentos ínfimos, à custa de dar boa educação aos filhos e alimentação decente às suas famílias”, disse à IPS o líder da minoria no parlamento, do Novo Partido Patriótico, o urbanista Osei Kyei-Mensah-Bonsu.

Segundo o Serviço Estatístico de Gana, a população na área metropolitana de Acra aumentou de 2,9 milhões em 2000 para quatro milhões de pessoas em 2010, porque muitos se mudaram para a capital em busca de melhores perspectivas profissionais. Porém, estima-se que a quantidade real de pessoas que vivem na cidade seja de, pelo menos, oito milhões.

O país tem déficit de moradia entre 1,5 e 1,7 milhão de unidades, e o mercado é dominado pelos proprietários de poucas moradias decentes e disponíveis para alugar. As pessoas comuns têm cada vez mais dificuldade para pagar por um teto. Com a economia em rápido crescimento – o produto interno bruto aumentou 15% em 2011 –, os preços aumentam em um ritmo maior do que o dos salários.

Em julho foram eliminados os subsídios para combustíveis, e em outubro aumentaram os preços dos serviços públicos. A eletricidade subiu 78,9% e a água 52%. Em novembro, o imposto sobre valor agregado chegou a 15%. “Por ano só podemos entregar ao mercado cerca de 40 mil unidades” habitacionais, informou Kyei-Mensah-Bonsu. “A cada ano são necessárias cerca de 110 mil, por isso sempre existe um déficit de 60 mil a 70 mil anualmente”, acrescentou. Neste contexto, “sem dúvida, a demanda supera a oferta. E, segundo uma regra básica da economia, cada vez que isso ocorre o preço do bem dispara”, ressaltou.

Em 1963 foi aprovada uma lei de controle de aluguéis para proteger os inquilinos de despejos injustos e preços excessivos. Em julho deste ano, parlamentares propuseram emendar essa lei, contemplando o atual clima em matéria habitacional. Isso ocorreu depois que Salifu Ameen, parlamentar pelo distrito de Wa Este, pediu urgência ao governo na implantação da política nacional de moradia, cujo rascunho foi elaborado há sete anos e que se destina a abordar o déficit e proporcionar uma variedade de unidades habitacionais em todo o país, além de regular os preços.

A nova classe profissional ganesa está em uma situação incômoda, “porque agora pode ter novo emprego em escritório e automóvel com ar-condicionado, mas não pode pagar o luxo de viver a menos de 35 ou 40 minutos do trabalho”, argumentou Quaison. “É preciso mudar para mais longe porque o aluguel e o custo de vida não são coerentes com o salário”, acrescentou. Os preços dos aluguéis estão desregulados nos fatos. É comum os inquilinos terem de pagar o aluguel de um ou dois anos adiantado.

A família de Johnet Darpoh possui unidades de menor custo nos subúrbios de Acra, os quais aluga há cerca de 40 dias. Segundo ela, os proprietários de qualquer lugar formam uma associação e decidem entre eles quais preços cobrar. Kyei-Mensah-Bonsu também lembrou que os corretores avaliam o movimento dos preços em uma determinada área e com base nisso determinam o valor, que inclui sua comissão.

Enquanto isso, Quaison continua sua busca, só que desta vez com um orçamento maior, pois já sabe como os gastos podem se acumular rapidamente. O deficiente serviço de água implica a necessidade de comprar um tanque de apoio e, se for possível, também um gerador para quando falhar a energia. “De repente, viver em um condomínio, que inclui o pagamento por serviços pareceu uma ideia realmente atraente”, ressaltou. Mas os que não podem se dar esse luxo ficam em desvantagem.

Darpoh disse à IPS que “alguns viverão com amigos ou em uma casa de família, com muitas pessoas em um mesmo quarto”. Há lugares em que “as pessoas dormem do lado de fora, com seus filhos, no chão. Seria melhor se o governo pudesse ajudá-los”, acrescentou. Até então, mais gente pobre sairá perdendo e não poderá encontrar uma moradia decente. “Os que têm renda muito baixa vivem principalmente em edifícios em construção ou que não têm água, eletricidade, nem banheiro”, enfatizou Osei.  Envolverde/IPS