Entidades apontam brechas no mecanismo de REDD+ e no uso de compensações por grandes poluidores, e sugerem que o governo recuse esse tipo de crédito no esquema de comércio de emissões do estado.
Um grupo de 30 organizações sediadas na Califórnia mandou uma carta para o governador Jerry Brown e para a presidente do Air Resources Board, Mary Nichols, pedindo que rejeitem a elegibilidade de créditos resultantes de projetos de redução de emissões por desmatamento e degradação, conservação, manejo florestal sustentável, manutenção e aumento dos estoques de carbono florestal em países em desenvolvimento (REDD+) sob o sistema de ‘cap-and-trade’ do estado.
O esquema californiano, que visa controlar as emissões de gases do efeito estufa, entra em vigor em 2013, porém ainda não foi decidido como será a elegibilidade dos créditos REDD+.
O que se sabe é que 8% das metas de corte de emissões poderão ser cumpridas com os créditos de compensação (chamados offsets, em inglês), sendo que 25% destes podem ser créditos REDD+ durante a primeira (2013-2014) e segunda (2015-2017) fases do mercado californiano.
As negociações na Califórnia ainda precisam trilhar um longo caminho para determinar como será a elegibilidade dos créditos REDD+, sendo que nos próximos meses um grupo de trabalho deve lançar um documento com recomendações para estes projetos.
A Califórnia já tem acordos de entendimento assinados com a província mexicana de Chiapas e com o estado brasileiro do Acre para trabalhar sobre os projetos florestais.
As organizações abrem a carta dando boas-vindas aos esforços da Califórnia de proteger as florestas e cortar as emissões de dióxido de carbono.
No entanto, descrevem várias brechas dos créditos REDD, enfatizando que a integridade ambiental destas compensações é tão baixa que atualmente nenhum sistema governamental do mundo as aceita.
“Todos os projetos de compensação de carbono correm o risco de serem uma farsa ao não reduzirem efetivamente as emissões, mas os créditos REDD são os mais arriscados”, alertou Michelle Chan, diretora de programas de políticas econômicas da ONG Friends of The Earth.
“A Califórnia está prestes a assumir uma politica que não apenas entra em conflito com seus objetivos de redução das emissões, mas que também pode minar os esforços de preservação dos remanescentes florestais mundiais˜, completou Roman Czebiniak, conselheiro sênior para politicas climáticas e florestais do Greenpeace”.
Ele notou que os países integrantes das discussões climáticas internacionais concordaram em fornecer financiamento para ajudar os países em desenvolvimento a proteger suas florestas em âmbito nacional e com salvaguardas para os povos tradicionais e a biodiversidade, porém que a proposta da Califórnia poderia prejudicar tais esforços ao incentivar projetos de pequena escala e outras atividades subnacionais.
Este é um dos pontos críticos da carta, que coloca os créditos subnacionais como “provavelmente o tipo de compensação mais problemático” devido aos “riscos inerentes de vazamento (quando o desmatamento meramente muda de uma parte do país para outra) e impermanência (onde a floresta é destruída mais para frente)”.
Além disso, a carta ressalta que investigações independentes mostraram preocupações significativas em relação aos direitos humanos dos povos indígenas e tradicionais, “especialmente em casos recentes como no México, Brasil e Indonésia”.
De fato, várias denúncias de desrespeito aos direitos dos povos indígenas e locais têm sido feitas ao redor do mundo no cenário do REDD+, como expulsão de suas terras, proibição de acesso a determinados locais dos quais dependem e até assassinato.
No México, as denúncias são tão sérias que chegam a questionar a real motivação do governo ter assinado o acordo com a Califórnia justamente para Chiapas, onde se localiza uma comunidade zapatista, de oposição política e que, entre outros, busca a reforma agrária no país.
“Acreditamos que a Califórnia pode ter um papel efetivo e produtivo nos esforços globais de proteção das florestas através de ações como a repartição de informações (incluindo técnicas de monitoramento das florestas), capacitação e transferência tecnológica, e ao lidar com a forma como os padrões de consumo da Califórnia podem impactar o desmatamento”, sugerem as organizações.
* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.