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Hortas domésticas ajudam a amenizar a fome

As plantas que servem para obter alimentos costumam ser cultivadas em recipientes de plástico reciclado. Foto: Susan Robens-Brannon

 

Porto Príncipe, Haiti, 14/8/2012 – Muitos habitantes de bairros pobres e de acampamentos semipermanentes da capital haitiana dependem de suas hortas domésticas para se alimentar de maneira sadia. A maioria das casas é muito pequena e faz muito calor para se cozinhar em seu interior. Por isso, as refeições são preparadas do lado de fora, entre cultivos de verduras e árvores frutíferas, que também fornecem uma sombra muito necessária. Bem antes da temporada chuvosa, planta-se milho em terrenos vazios perto das casas ou em pequenos espaços próximos dos acampamentos. Quando o grão está maduro, se come e se vende no mercado, onde é cozido na brasa e degustado como um tira-gosto.

Dwitche Savin, que tem uma pequena plantação de milho nos arredores de Porto Príncipe, reutiliza as sementes de cultivos anteriores. Até agora, as geneticamente modificadas não se infiltraram na área da capital, disse à IPS. “Não compramos as sementes para nosso milho. Por que pagar por algo que se pode conseguir grátis?”, perguntou. Os cultivos de Savin incluem feijões que estão entre o milho, cujos caules servem de apoio para essas plantas. “Gosto de acrescentar flores em minhas plantações porque estas ajudam a manter os insetos afastados das plantas, embora alguns usem pesticidas no milho”, explicou.

Uma mulher no acampamento de Cannon, onde vivem quase seis mil desabrigados desde o terremoto de 12 de janeiro de 2010, cultiva milho, tomates e pequenas bananas em uma área de um por três metros que fica em frente à sua barraca. Tudo serve para ajudar no orçamento, disse. Suas plantas lançaram raízes diretamente no solo. Outros cultivam em grandes recipientes de plástico reciclado colocados em volta do perímetro da propriedade ou sobre os muros.

Com desemprego de 40,6% da população economicamente ativa, cultivar os próprios alimentos ajuda as famílias a comerem, com a esperança de conseguir um excedente que lhes gere alguma renda. A maioria dos haitianos vive com US$ 2 ou menos por dia. Carine Savin, mãe de Dwitche e moradora na mesma área, disse à IPS: “Compartilhamos as plantas, assim não temos que ir comprar”. Complementar a dieta com produtos frescos também é crucial porque, mesmo antes do terremoto, quase um terço das crianças menores de cinco anos sofria desnutrição crônica, e cerca de metade das mortes nessa faixa etária era causada por má nutrição, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

Nas regiões tropicais, uma das principais fontes de alimentos é a banana, que pode ser cultivada o ano todo, com intervalos de 75 a 150 dias. A banana quando verde é fervida, cortada, amassada e depois frita e servida coberta com um molho de carne ou pescado. A sabedoria popular diz que a banana verde é cheia de nutrientes e é mais saudável do que as maduras. “Isto te deixará forte”, destacou Carine Savin. A banana verde não tem gorduras, mas pequenas quantidades de proteínas e vitaminas B, além de cálcio e ácido fólico. Também fornece fibra e tem alta concentração de potássio.

As árvores de frutas tropicais são as mais fáceis de cultivar neste clima. As de lima são plantadas junto a ruas residenciais em todo o Haiti, e podem ser usadas tanto com fins culinários quanto medicinais. As limas são pequenas, mas são “boas para curar quando alguém não se sente bem, e limpam seu organismo”, explicou um jardineiro local. Inclusive as áreas residenciais pobres possuem grande variedade de árvores frutíferas: abacate, coco, três tipos de manga, cereja, ameixa e romã são apenas algumas dessa longa lista.

Nos arredores da cidade também se cultiva uva, mas, segundo Dwitche Savin, a maioria das pessoas “não tem paciência suficiente para deixá-las amadurecer”. Colher frutas antes do tempo faz com que se obtenha uma fruta pequena e muito ácida, mas, de todo modo, pode ser usada para fazer geleia, acrescentou. A água é escassa, e por isso os haitianos aprenderam a usá-la sabiamente. Por exemplo, depois que lavam a roupa, os pratos ou cozinham fora de casa, jogam a água nas plantas. As árvores frutíferas crescem naturalmente, sem necessitarem de muita água.

Cabras, frangos e porcos circulam livremente ou estão amarrados a bananeiras próximas. As cabras comem as folhas das bananas e outras plantas. Os frangos se encarregam de pequenos resíduos jogados no chão e os porcos parecem se entusiasmar com as raízes das bananeiras devido à umidade que as acompanha. Quando um transeunte vê um porco despedaçando uma raiz de bananeira, normalmente impede que continue. Apesar da ação dos animais, as plantas parecem prosperar.

Como a terra é escassa, muitos erguem um grande muro ao redor de seus terrenos quando constroem suas casas. Carine Savin contou que sua família demorou dez anos para terminar a construção. “Tivemos que pagar em dinheiro cada parte. As pessoas com dinheiro podem contratar construtores, mas, de todo modo, demora. Sai caro porque o preço dos materiais e da mão de obra são elevados”, contou. E uma das primeiras coisas que as pessoas fazem, tão logo sua propriedade esteja murada, é plantar algumas árvores “para ter sombra e, com sorte, frutas”, ressaltou. Envolverde/IPS