Tóquio, Japão, 27/4/2011 – Quando o terremoto de nove graus e o posterior tsunami atingiram, em 11 de março, a aldeia da costa japonesa onde viviam, a filipina Mariline Shoji e seu marido perderam tudo o que possuíam. “Pude ouvir o rugido do enorme tsunami à distância enquanto fugia para um terreno mais elevado”, contou Shoji, que vive há mais de 30 anos em Gamo, uma área até então pitoresca localizada em de Miyagi. “Quando meu marido e eu voltamos no dia seguinte, a água tinha arruinado nossa casa e todos os nossos pertences”, recordou.
Shoji, que trabalha no escritório do governo local assessorando moradores estrangeiros, disse à IPS que ela e seu marido buscaram abrigo em casas de amigos. Seu filho está casado e não vive com eles. “Não pretendo voltar para as Filipinas. Logo reconstruiremos nosso lar em outro lugar, definitivamente, longe do oceano”, afirmou Shoji, que comprava cortinas quando a tragédia aconteceu.
A história desta filipina é semelhante à de outros estrangeiros que decidiram não abandonar as áreas devastadas. Um deles é Akter Hossain, de Bangladesh, que abriu seu hotel, o Asian Garden, para mais de 400 residentes que fugiam da radioatividade que vazou após o impacto do tsunami na central nuclear de Fukushima. “Atualmente, há 30 retirantes que podem residir em meu hotel gratuitamente. Isto é o mínimo que posso fazer para devolver a enorme ajuda japonesa que recebemos em Bangladesh quando um desastre natural nos atingiu”, disse Hossain.
Histórias como a sua se convertem em símbolos da solidariedade no Japão, onde os estrangeiros sempre foram marginalizados. A imprensa japonesa elogiou o trabalho da enfermeira indonésia Rita Retnaningtyas, que continuou cuidando de seus pacientes no afetado hospital local.
“Admiro sua força para continuar trabalhando com outros japoneses em um momento em que havia tanto caos. Como estrangeira que nunca sofreu terremotos nem tsunamis, e demonstrou um compromisso extraordinário”, afirmou Wataru Fujiwara, porta-voz do Hospital Nacional de Miyagi, uma das áreas mais danificadas, com mais de 15 mil desaparecidos ou mortos, segundo os últimos dados oficiais.
Estatísticas do governo local indicam que os estrangeiros que vivem em Tohoku, onde ocorreu o pior desastre natural do pós-guerra no Japão, são principalmente estudantes, trabalhadores imigrantes ou suas mulheres. Não há números oficiais disponíveis, mas a maioria é de chineses, seguidos por sul-coreanos, filipinos e tailandeses. Muitos estão empregados em pequenas e médias empresas espalhadas pela região, e trabalham nos setores de manufatura, pesca ou agrícola.
O êxodo de estrangeiros que ocorreu pouco depois do desastre se converteu em questão importante. Yuko Tanakja, diretor do Centro Multilíngue de Chamadas de Auxílio, disse que a situação dos estrangeiros não era fácil após o terremoto, quando tiveram que decidir se partiam ou ficavam. “A radiação emitida pela usina de Fukushima levou os governos estrangeiros a orientarem seus cidadãos a partirem. Isso significava abandonar empregos e mesmo famílias, se casados com japoneses”, disse Tanaka.
Musatoshi Tateno, também do Centro Multilíngue, afirmou que o terremoto criou problemas importantes em matéria de políticas trabalhistas para a população imigrante. “Quando os trabalhadores estrangeiros voltaram aos seus países, as empresas japonesas e eles mesmos sentiram a perda. Os trabalhadores precisam dos salários para enviar dinheiro aos seus familiares, mas tiveram de partir porque as rígidas regras locais não permitem mudar para emprego em áreas mais seguras”, explicou.
A Associação de Pequenas e Médias Empresas, que representa o setor pesqueiro e manufatureiro de Tohoku e depende da mão-de-obra estrangeira, também registrou perda de trabalhadores que retornaram aos seus países de origem. Contudo, um mês depois da tragédia, há sinais de que muitos deles estão regressando.
O Centro Multilíngue, um serviço para residentes estrangeiros criado por governos locais, os ajuda a fazer a difícil adaptação. “Oferecemos serviços de apoio a estrangeiros afetados pelo terremoto, e também aos que querem voltar. Os temas mais graves para eles são como encontrar novos empregos e casas para alugar”, disse Tanaka.
O sacerdote Charles Bolduc, que está à frente da igreja católica Motodera, na cidade de Sendai, capital de Miyagi, orienta e apoia estrangeiros afetados pelo desastre. “A terrível catástrofe mostrou na realidade como japoneses e estrangeiros se ajudam entre si. As notícias sobre estrangeiros que partem não ofuscam a enorme solidariedade existente além das nacionalidades. Esta é a lição real de esperança”, disse Bolduc. Envolverde/IPS