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Inflação arrasa os mais pobres

Vale do Rift, Quênia, 26/8/2011 – A inflação do Quênia chegou a 15,53%, e os mais pobres lutam para atender suas necessidades básicas. Famílias em algumas áreas agora só podem obter uma refeição por dia. “A maior parte dos produtos básicos se converteu em luxo, em razão dos crescentes preços”, disse Jane Wabwire, residente no bairro pobre de Kwa Rhonda, no Vale do Rift.

A inflação é atribuída aos crescentes custos dos alimentos e dos combustíveis, incluindo petróleo, diesel e parafina. Após uma escassa produção de alimentos por três anos seguidos, há uma grave demanda interna e, portanto, os preços aumentaram. Isto não acontece só no Quênia. A escassa produção também se registra em Uganda e na Tanzânia, de onde o Quênia importa alimentos.

“Muitos países também são afetados”, disse à IPS a chefe do Departamento de Economia da Universidade de Egerton, Njeri Muhia. Ela alertou que o efeito da alta inflação pode persistir por seis meses. Muhia disse que enquanto o xelim queniano continuar sob pressão do dólar, os preços dos combustíveis e dos alimentos continuarão aumentando. Neste mês, o xelim atingiu a cotação baixa recorde de US$ 95,05. “Os setores de baixa renda são os mais afetados pela situação”, afirmou.

A parafina, usada pela maioria dos quenianos para cozinhar e iluminar suas casas, agora é vendida a 101 xelins (US$ 1,08) o litro, contra 60 xelins em junho. Os preços dos combustíveis aumentaram apesar de o governo reduzir em 30% os impostos sobre esses produtos para deter a alta. Um prato popular à base de milho, o ugali, é cada vez menos acessível para muitos. É um alimento básico para 80% dos quenianos. O preço de um saco de dois quilos continuou aumentando, de 130 xelins em junho para 136 xelins em julho e 140 em agosto.

“Lavo roupa para fora e ganho 150 xelins à noite. Isso só quando tem trabalho disponível”, disse Wabwire, acrescentando que seu marido é trabalhador temporário. Quando ela consegue algum trabalho usa o dinheiro para comprar um quarto de litro de parafina a 50 xelins, gordura a dez xelins, couve a dez xelins e um quilo de farinha de milho não refinada a dez xelins. “Às vezes não me sobra nada. Em outras restam 20 ou 30 xelins para uma emergência ou pagar o aluguel”, explicou.

Wabwire conversou com a IPS quando fazia fila junto com outras centenas de pessoas que esperavam sua parte de milho e feijão doados por uma igreja local. “Tenho de ficar na fila. Não importa o tempo que demora, tenho de esperar até conseguir alguma coisa. Manterá minha família por uns dias”, disse. A mulher contou que algumas crianças da região sofrem desnutrição porque seus pais só podem comprar batatas, todos os dias.

É o caso de Sylvia Meltina, moradora de Kivumbini, um bairro pobre. Ela tem família de cinco pessoas e só consegue comprar batatas devido ao alto preço da comida. “As batatas e o githeri (mistura de milho e feijão) se tornou algo comum em minha casa todas as noites. Uma vez ou outra compramos farinha sem peneirar, que é mais barata, para cozinhar ugali, pois as crianças pedem”, contou Meltina. Esta mulher vende frutas e verduras para viver. “Com o custo de vida subindo, a gente acaba com dívidas no final do mês, porque não dá para pagar tudo com apenas 30 xelins por dia”, disse Meltina.

O legislador Lee Kinyanjui, de Nakuru, afirmou que há cerca de 20 mil pessoas extremamente pobres nesse bairro que dependem de doações e emprego temporário para sobreviver. “Alguns estudantes que vivem perto do lixão municipal faltam às aulas para buscar restos de alimentos no lixo. Isto é muito preocupante”, disse Knyanjui, também ministro-assistente para estradas no Vale do Rift. Peter Macharia, gerente de investimentos na PineBridge Investments, afirmou que a inflação poderá aumentar 20% nos próximos meses.

“Quando o preço do combustível sobe um único xelim, o efeito é sentido automaticamente pelos pobres, já que distorce o ciclo de produção”, disse Amos Karoki, assessor financeiro de Nakuru. As famílias pobres nos bairros de Nakuru passaram a comprar dentifrício por gota, ao preço de um xelim a gota. “Isto mostra o quanto decaíram as famílias nos bairros pobres”, alertou Karoki. Envolverde/IPS