Mantida pela presidente Dilma no ministério do Meio Ambiente, Izabella Teixeira tem o desafio de enfrentar a crise hídrica, preparar o país para o acordo climático de Paris e implantar de fato a Política Nacional de Resíduos Sólidos
Desvinculada de partidos, a ministra Izabella Teixeira foi mantida no Ministério do Meio Ambiente na cota pessoal da presidente Dilma Roussef. Em um ano de muitos desafios ambientais internos, o Brasil tem ainda de enfrentar a renovação do acordo climático global, em dezembro, na COP 21 que será realizada em Paris, e ainda trabalhar para que os Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis (ODS), que deverão substituir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) sejam realmente relevantes para apoiar a transformação do modelo econômico e de desenvolvimento, não apenas do Brasil, mas globalmente.
Em meio ao fogo cruzado na Praça dos Três Poderes o Ministério do Meio Ambiente procura estruturar uma ação baseada em políticas públicas. Um dos principais desafios será fazer com que o país se adapte a uma nova realidade hídrica, onde a escassez não é mais privilégio dos nordestinos, mas pode atingir qualquer região, impactando estilos de vida, modos de produção e modelos de gestão da água.
Izabella Teixeira recebeu em Brasília os jornalistas Dal Marcondes, da Envolverde, Lúcia Chayb, da revista ECO21 e Sônia Araripe, da revista Plurale, para um conversa franca sobre os cenários ambientais que se formam no Brasil e no mundo. Confessou estar cansada, mas não pensou nem por um momento em recusar o desafio de ajudar o país a transpor esse momento delicado na área ambiental. Uma das principais prioridades é a transição para um novo modelo de gestão de águas que permita dar mais segurança às pessoas e às empresas.
De que maneira o Ministério do Meio Ambiente pretende tratar o tema da escassez hídrica?
Izabella Teixeira – O Brasil precisa compreender que a água é um recurso escasso. Enquanto a seca era no Nordeste a mídia não tinha muito interesse em fazer disso uma pauta nacional. Mas agora que a escassez atingiu o Sudeste a grita se tornou generalizada. Precisamos de estudos e pesquisas para entender mais claramente os motivos da seca, não basta simplesmente afirmar que é causada pelas Mudanças Climáticas. Estamos no terceiro ano de seca e poderemos ter um quarto e quinto. Os meteorologistas acreditam que estes ciclos são de quatro a cinco anos. O MMA monitora o stress hídrico do Sudeste há bastante tempo e estive com o governador Geraldo Alckmin um ano atrás para conversar sobre a necessidade de ampliar as estruturas de reservação de água. Nossa preocupação é basicamente com a grande quantidade de pessoas que dependem dos sistemas hídricos de São Paulo, que vai muito além da capital, com o Vale do Paraíba e o Rio de Janeiro sendo diretamente afetados. Uma das necessidades que apontamos, juntamente com a Agência Nacional de Águas (ANA) foi em relação à Sabesp, que precisaria de uma atenção redobrada do governo do Estado.
Essa escassez não foi uma surpresa para os gestores de recursos hídricos?
Não, graças aos diálogos entre a ANA e os gestores do Estado foi levantada a hipótese de se utilizar o “volume morto” do sistema Cantareira. O governador teve, então, tempo para investir nas obras necessárias para explorar essa reserva adicional. A lógica da Agência Nacional de Água é manter o máximo de reserva possível, preservando os mananciais e reservatórios, mesmo que a situação não esteja crítica. São Paulo trabalhou com o cenário de chuvas no final do ano, que foram muito frustrantes. As chuvas de fevereiro foram melhores. As obras de interligação de represas, que incluem a Guarapiranga e a Billings, podem ajudar a melhorar o nível de acesso à água estocada e diminuir a pressão sobre o sistema Cantareira.
Mesmo com as grandes obras, há que se entender que o cenário de escassez é crônico, não?
Sim, o problema é crônico. Não se trata de uma simples crise, que será superada, e tudo volta a ser como antes. A menor quantidade de chuvas da história na região Sudeste passa a ser a série de 2014, e não mais 1953, que detinha o recorde anterior. E janeiro deste ano choveu abaixo de 2014. Fevereiro não. Estamos monitorando o Paraíba do Sul e alertando o Rio de Janeiro que á necessário estabelecer mais eficiência na alocação da águas. A cidade do Rio d Janeiro necessita de 50 metros cúbicos por segundo, está recebendo 110, no entanto não consegue suprir todas as suas necessidades de uso. O sistema de distribuição é ineficiente. A ANA está reorganizando a oferta para oferecer 70 m³/s, o governo do Rio está resistindo. Há três tipos de ineficiência do sistema, a primeira, do próprio Guandu, que ainda opera por gravidade, sem um sistema de bombeamento. É preciso fazer uma obra que está planejada há 20 anos mas não foi feita, depois muita água ainda é utilizada para diluir esgotos, e quando chegamos no Baixo Paraíba á intrusão de água do mar, salina, que torna a água inservível para o tratamento convencional. Estamos conversando com representantes de diversos países que enfrentam escassez crônica de água para aprender, desenvolver tecnologias e modelos de gestão capazes de enfrentar esse novo cenário no Sudeste e também ajudar a resolver a seca no Nordeste. Entre nossos interlocutores estão representantes dos governos do Japão, Singapura, Espanha, Israel, Estados Unidos, Uruguai …
Já há empresas desses países operando no Brasil.
Algumas atuam. No final de abril faremos um seminário internacional com a indústria para realizar transferência de tecnologias. Vamos focar em três áreas distintas. Primeiro, o aprendizado desses países com gestão de escassez, depois um aprendizado com as estruturas de governança utilizadas, em seguida as estruturas de ciência, tecnologias e de pesquisas. Vamos trazer o que há de mais moderno no mundo. O seminário será em São Paulo, onde a logística internacional é mais fácil. Não é para discutir só o Brasil, é para debater como esses países encontram as soluções, da dessalinização ao reuso. Depois
A atual escassez não tem nada a ver mesmo com mudanças do clima, ou é só porque é muito difícil de comprovar?
Realmente é muito difícil de comprovar, temos fenômenos de falta de chuva que afetam o país de quando em quando, Houve períodos secos nos anos 1950, 1980 e agora. Nos casos anteriores quando choveu as autoridades abandonaram os planos de investimentos para essas contingências. Temos ilhas de calor e diversos sinais de mudanças no clima, mas não é possível afirmar com certeza que essas secas pontuais sejam de fato oriundas das mudanças climáticas. O Painel Intergovernamental Para as Mudanças Climáticas (IPCC) vai continuar estudando e compondo séries históricas, mas mudanças climáticas são medidas em décadas e séculos e não em anos. Vamos continuar a apoiar os pesquisadores, a ciência, a buscar respostas, mas vamos também tomar providências para mitigar os impactos da escassez hídrica. (#Envolverde – #ECO21 – #Plurale)