Nesta semana, o parlamento japonês deu o primeiro passo para reduzir sua dependência da energia nuclear. Na terça-feira (23), a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei para incentivar investimentos na indústria de energias renováveis. Agora, resta saber se os investidores estarão dispostos a financiar novos projetos verdes para que o país possa abandonar as fontes atômicas.
Após o acidente ocorrido na usina nuclear de Fukushima, em março de 2011, a população e o governo japonês tiveram sua confiança na energia atômica abalada, e agora, a maior parte dos habitantes do Japão quer que os reatores nucleares sejam substituídos por fontes de energia mais seguras.
Uma pesquisa feita pelo jornal The Mainichi Daily News indicou que 74% dos cidadãos japoneses querem que o país abandone gradativamente a energia nuclear, 11% desejam que a mudança seja imediata e 13% acham que não há necessidade de alterar a política energética da nação.
O primeiro-ministro Naoto Kan já havia declarado que o país precisava se livrar da energia atômica, mas não havia dado detalhes sobre uma possível política energética de substituição. Agora, com o projeto de lei que promove investimentos no setor renovável aprovado pela Câmara, resta o Senado ratificar o projeto.
Mas pode ser que o país não se livre tão facilmente d fontes nucleares. “O primeiro-ministro Kan fez do projeto de lei um foco imediato de debate e teve sucesso. Um ponto chave que ainda deve ser respondido mesmo depois da aprovação é se o Japão será capaz de se livrar da nuclear como o ministro sugeriu”, questionou Ryuichi Yokoyama, professor do laboratório de sistema de energia e meio ambiente da Universidade de Waseda.
De acordo com especialistas, a falta de confiança e o preço das renováveis fazem com que, a primeira vista, elas não sejam tão atrativas para os investimentos. “Entendemos que as energias renováveis são as próximas candidatas após o gás natural para substituir a nuclear. Mas é uma opção cara e a falta confiança exigirá muito investimento, e o novo esquema precisa que os usuários dividam o custo”, explicou Yokoyama.
Uma das preocupações é o valor do subsídio para os diferentes tipos de energia renovável, e, pelo menos por enquanto, será difícil definir esse preço. Outro receio é a instabilidade do governo, que vem sendo criticado por suas ações em relação ao terremoto e ao desastre nuclear.
“Os investidores dizem que não há nenhum risco institucional em investir no setor de energias renováveis na Europa, mas eles dizem que há tal risco no Japão devido à incerteza das perspectivas do esquema e há também um risco nas políticas do país”, afirmou Shinichiro Takiguchi, estudioso do Instituto de Pesquisa do Japão.
Outros especialistas sugerem que falta também financiamento. “Os projetos de lei não estão amadurecidos. O plano de investimento está aí, mas está faltando o financiamento – não há um roteiro detalhado para financiar investimentos em infra-estrutura necessários para fazer o esquema funcionar, como estabelecer redes de transmissão apropriadas”, esclareceu Hirofumi Kawachi, analista da Mizuho Investors Securities.
“Há risco de que ações de usinas de energia solares e eólicas sejam acumuladas, mas que não sejam utilizadas efetivamente”, acrescentou Kawachi. Isso não prejudicaria os novos fornecedores, mas possivelmente dificultaria o crescimento econômico, pois pesaria no bolso dos consumidores, que pagariam pelas instalações em construção, ainda não conectadas à rede.
Segundo Yutaka Yamamoto, presidente da Suntech Power Japan, uma alternativa seria criar tarifas de aquisição como na Alemanha e na Espanha, o que levou a um rápido aumento no investimento em energias renováveis nestes países. “Um esquema de tarifa de aquisição conduziria o crescimento do mercado (de paineis solares) significativamente. O único risco é a taxa da tarifa de aquisição”.
Para Akihiro Sawa, pesquisador do Instituto de Políticas Públicas e ex-funcionário do Ministério do Comércio, “o esquema (energético) é unilateral, já que está focado apenas nos novos fornecedores de energia, tirando vantagem dos usuários finais. Precisamos de outro plano. Precisamos de passos políticos para fazer que as companhias de energia convencionais percebam o quão lucrativo é investir no setor e vender eletricidade ‘verde’ para os usuários”.
Atualmente, cerca de 10% da energia do Japão é gerada a partir de fontes renováveis. O governo, que anteriormente pretendia aumentar a capacidade nuclear do país, estuda agora elevar a participação das renováveis para 20% até 2030, mas as novas metas devem ser anunciadas posteriormente.
*publicado originalmente no site do CarbonoBrasil.