Para alguns, economia pode ser uma ciência de difícil compreensão, ainda mais quando se usa o economês ao se relatar ou comentar um processo econômico, e este, em sua maioria, é realizado por jornalistas, mas pouquíssimos, com raríssimas exceções, procuram fazer uma análise mais detalhada e criteriosa e, também, por que não dizer, relativamente mais acessível.
Ao comentar sobre a crise europeia, a única justificativa que se tem, são os altos gastos do governo, como a previdência, saúde, educação, etc., mas esquecem-se de relatar o alto grau de financeirização da economia europeia.
Ou no caso brasileiro, nos faz parecer que o único remédio para a inflação é o aumento dos juros, ou então, os gastos do governo precisam ser reduzidos, mas jamais afirmam qual gasto é o mais alto, ou onde cortariam, sem contar que não diferenciam os tipos de inflações e se realmente vivemos um surto inflacionário. O contexto internacional é completamente escanteado do noticiário, quando o fazem, é de maneira errática.
Ao falar de orçamento público, é uma tragédia. Tentam comparar um orçamento familiar, ou de uma empresa, com o público, são ambientes e peças diferentes, por uma razão muito simples: o Estado tem o poder de emitir moeda e títulos públicos, ou seja, tem a capacidade de autofinanciamento, com o que, evidentemente, haverá consequências, mas não se pode negar jamais essa solução.
Neste sentido, é importante lembrar que a economia não possui um único pensamento, e, por isso, o tecnicismo puro inexiste. É mais do que necessário levar em conta as relações sociais e de classe, a história e a política. Não que a economia seja uma ciência menor, é justamente o contrário, é por conta da economia que os interesses afloram, divergem e comungam.
Ao emitir uma opinião, os veículos de comunicação têm uma determinada opção política e social e isto é importante e necessário, mas seria de relevante importância e honestidade se afirmassem de que lado estão, para que os ouvintes, os(as) leitores(as), ou telespectadores saibam as causas e consequências de um determinado pensamento econômico e jornalístico.
Portanto, ao se encontrarem, o jornalismo e a economia, atrelados à política, podem fazer estragos incomensuráveis em uma determinada sociedade. Por exemplo, no Brasil, a quem interessa propagar que existe um surto inflacionário?
Desde 1999, com a introdução da política de metas de inflação, em nenhum momento atingiu-se o centro da meta, algo tão desejado pelos governos e, em particular, pelo Banco Central. Façamos a seguinte constatação: Em 2001, a meta de inflação, conforme resolução do Banco Central, era de 4% a.a., mas atingiu 7,67% a.a., praticamente o dobro. No ano seguinte, em 2002, a meta inflacionária foi audaciosa, ou, porque não dizer, irresponsável, de 3,5% a.a. e bateu a casa dos dois dígitos, com 12,53% a.a., 3,6 vezes maior do que o almejado.
Nesses dois momentos, pelo menos grande parte da mídia nunca falou em surto inflacionário, ou até mesmo, em riscos de volta da inflação como se fala atualmente, um reflexo claro de que há lado nessa história, não há isenção da notícia ou da análise econômica. Isso não quer dizer que vivemos um período de não inflação, mas é importante constatar que atualmente a inflação é um fenômeno global. Para citar os Brics, na Rússia há uma projeção de 9% a.a, na Índia 7% a.a, na China 5% a.a e no Brasil poderemos chegar a 6% a.a.
Uma sociedade se desenvolve não somente com uma única opinião, mas sim com suas divergências e convergências, e, para tanto, é mais do que urgente que jornalistas e economistas, ao comentarem um processo econômico, tenham no mínimo a honestidade de dizer que pensamentos econômicos estão inseridos. Informação é poder! Por isso, pode-se desejar compartilhar ou concentrar de acordo com os interesses estabelecidos.
* Paulo Daniel é economista, mestre em Economia Política pela PUC-SP, professor de Economia e editor do blog Além da Economia.
** Publicado originalmente no blog do autor “Além da Economia” e retirado da coluna do autor no site da revista Carta Capital.