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Jovens brasileiros cobram seu governo na COP 19

Delegação de ativistas jovens do Brasil na COP 19, em Varsóvia. Foto: Engajamundo
Delegação de ativistas jovens do Brasil na COP 19, em Varsóvia. Foto: Engajamundo

 

Rio de Janeiro, Brasil, 25/11/2013 – As última conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudança climática terminou em Varsóvia politicamente fracassada e sem progressos dignos de menção. O Brasil, que no passado exerceu liderança, volta para casa sob uma chuva de críticas. “A 19ª Conferência das Partes (COP 19) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática está esvaziada. Mas não a sociedade civil”, que se mostra “forte, integrada e determinada”, disse à IPS, da capital polonesa, a brasileira Laura Jungman, de 23 anos, integrante da organização Engajamundo. “É muito triste estar dentro da COP e ver que as negociações não caminham”, afirmou.

Desde o dia 11, a comunidade internacional se reuniu na capital da Polônia para tentar definir as bases de um tratado mundial para reduzir a contaminação causadora da mudança climática, que deveria ser adotado em 2015 e começar a ser aplicado em 2020. Contudo, o sinal de que as conversações estavam travadas ficou claro quando as grandes organizações ambientalistas, como o Fundo Mundial para a Natureza (WWF) e Greenpeace, informaram que se retiravam, no dia 21, de negociações nas quais têm apenas o papel de observadoras e o direito de falar durante três minutos ao plenário.

Cerca de 800 pessoas saíram em massa dos salões da conferência, com cartazes onde se lia “Voltaremos”. Segundo Jungman, “as discussões estavam paralisadas nos últimos anos, mas tínhamos a expectativa de poder influenciá-las de algum modo, mesmo considerando sua lentidão”. A Engajamundo foi criada ao calor da cúpula de desenvolvimento sustentável Rio+20, realizada no ano passado no Rio de Janeiro, para dar lugar à juventude nesses debates internacionais.

O grupo foi convidado pelo projeto Adote um Negociador, promovido pela Campanha Global para a Ação Climática, para seguir os passos da delegação brasileira durante a COP 19. “Uma de nossas missões é abrir espaço para os jovens dos países do Sul. Nossas demandas sobre a mudança climática são diferentes das dos europeus”, pontuou Jungman. Pouco antes da conferência de Varsóvia, jovens ativistas da América Latina criaram o Movimento Climático de Latino-Americanos e Caribenhos (Clic), que tem entre seus fundadores a Engajamundo.

“Nessas duas semanas houve encontros de movimentos juvenis e de outros setores da sociedade civil da região, em preparação para o próximo ano. Foi um momento de grande coesão da juventude do Sul global”, destacou Jungman. Os integrantes do Clic já trabalham para levar posições comuns a Lima, capital do Peru, que será a sede da COP 20, no final de 2014. No entanto, essas conferências continuarão acumulando fracassos enquanto prevalecer o pensamento empresarial, disse o jornalista ambiental e premiado ecologista Vilmar Berna.

“Enquanto o negócio mover as pessoas, acima dos interesses pela vida e do planeta, não haverá COP 19, haverá sempre esse desastre”, opinou Berna à IPS. A sociedade civil se retirou de forma estratégica para não avalizar as “infâmias” que constarão do documento final, acrescentou o jornalista. “Sabemos que estamos diante de cartas marcadas, com informação manipulada. Há uma guerra pelos recursos do planeta, na qual os que chegaram primeiro e tomaram posse não querem ceder”, ressaltou.

Para André Nahur, coordenador de mudança climática e energia do WWF-Brasil, as organizações não governamentais se retiraram “diante da falta de liderança do governo polonês. Havia um clima de grande agitação diante das dificuldades dos países para encerrar o encontro com um resultado concreto e positivo”, disse à IPS. Na COP de Copenhague, em 2009, os países se comprometeram a desembolsar US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020 para o Fundo Verde para o Clima. Mas até agora não foi feito nenhum aporte, e “não está claro como nem quando acontecerá”, destacou o coordenador do WWF-Brasil.

A delegação do Brasil, encabeçada pelo embaixador José Antonio Marcondes de Carvalho, defendeu a ideia de se criar um mecanismo para estimar as responsabilidades históricas dos países na mudança climática, desatada pelas emissões humanas de gases-estufa. A proposta foi bem vista pelos demais países em desenvolvimento, mas não saiu do contexto científico e não fez parte das discussões políticas.

Para Jungman, o Brasil tem um importante papel mediador dentro do Grupo dos 77 (bloco dos 133 países em desenvolvimento na ONU), mas carece de articulação para promover melhor essas iniciativas e não foi claro sobre como medir tais responsabilidades históricas. A jovem ativista disse que o Brasil deveria se comprometer mais nas ações. Essa proposta, por exemplo, deveria ter sido introduzida há anos para que houvesse tempo necessário para ser avaliada antes de 2015.

“O Brasil tem um potencial para exercer liderança que deveria aproveitar. Talvez não queira se comprometer mais enquanto outros não demonstrarem compromisso. Devemos fechar um tratado em dois anos e introduzir esse tema agora poderia inclusive atrasar mais o processo de negociações”, opinou Jungman. A delegação brasileira também propôs realizar consultas nacionais para definir as metas de redução de emissões que serão assumidas pelos países no âmbito internacional.

Embora essa seja uma contribuição, o Brasil não deixou claro como devem ser apresentadas essas metas nem como deverão ser feitas as consultas, observou Nahur. Para Berna, o Brasil tem uma “política esquizofrênica” porque o que defende é “apenas o direito de contaminar”. Segundo o jornalista, “o Brasil não renuncia a ser um dos causadores do problema, e tampouco renuncia tentar a liderança da América Latina. Quer ser o grande país líder, mas não é, e tem um discurso indeciso e hipócrita”.

Durante a COP 19 também foram conhecidos os números crescentes do desmatamento no Brasil, que vinha caindo ano a ano e era motivo de orgulho para o governo em fóruns internacionais. Mas, segundo o chanceler, Luiz Alberto Figueiredo, que viajou a Varsóvia, no dia 21, o Brasil está à frente das negociações. “Estamos aqui para conseguir progressos. É compreensível que alguns temas não sejam resolvidos agora. Não é questão de estabelecer prazos artificiais, mas um calendário adequado que esteja à altura das ambições”, declarou Figueiredo aos jornalistas.

O embaixador Carvalho insistiu que o Brasil defende a busca de um “acordo efetivo, justo e amplo”. E concluiu dizendo que “o que desanima os países em desenvolvimento é que não vemos um senso de urgência, da importância das ações com vistas a 2020. Não viemos culpar ninguém, mas convencer de que devemos progredir”. Envolverde/IPS