Nova York, Estados Unidos, 6/2/2015 – Uma lei permitirá o consumo de maconha com finalidades medicinais no Estado de Nova York a partir de 2016, mas o tratamento será inacessível para os pacientes de baixa renda, alertam organizações de ativistas norte-americanas. Em um fórum público realizado no dia 3, no bairro do Bronx, em Manhattan, os nova-iorquinos expuseram sua preocupação pelas restrições da iniciativa legislativa que, além de limitar o acesso desses pacientes, só permitira a aplicação do tratamento com maconha a um número limitado de doenças.
“O Departamento de Saúde pode criar incentivos para a indústria”, afirmou Julie Netherland, da Drug Policy Alliance (DPA), uma organização com sede nos Estados Unidos, que rechaça as políticas de proibição das drogas e trabalhou com os legisladores durante as negociações da lei. “Uma das coisas que poderiam considerar nos critérios para a seleção de empresas para produzir as cepas de maconha medicinal seria seu plano de apoio aos pacientes de baixa renda”, acrescentou.
A lei foi aprovada em julho de 2014, mas só começará a ser aplicada no Estado de Nova York em janeiro de 2016, quase duas décadas depois que a maconha medicinal foi adotada legalmente pela primeira vez nos Estados Unidos, no Estado da Califórnia, em 1996. Até agora, 23 Estados mais o Distrito de Colúmbia legalizaram a maconha para uso médico, enquanto Alasca, Colorado, Oregon e Washington permitem seu consumo com fins recreativos.
Em sua forma atual, a lei de Nova York permite o tratamento apenas para dez enfermidades: câncer, HIV/aids, esclerose lateral amiotrófica, mal de Parkinson, esclerose múltipla, lesão da medula espinhal com espasmos, epilepsia, inflamação intestinal crônica, neuropatia e mal de Huntington. O comissário de Saúde de Nova York, Howard Zucker, tem o poder de incluir no tratamento proposto a quantidade de doenças que considerar oportunas.
Para aprovar a lei, os legisladores foram obrigados a reduzir drasticamente os critérios para permitir o tratamento, segundo a DPA. No projeto de lei original, o médico encarregado receitaria a maconha segundo seu próprio critério. Mas durante as negociações sua aplicação se reduziu a 25 enfermidades e, nos últimos dias antes da aprovação da lei, foi limitada a apenas dez. As pessoas com ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático e artrite reumatóide não poderão receber o tratamento.
“Tenho câncer de próstata na fase quatro, por isso tenho acesso, mas procuro ampliar esse acesso para aqueles que não estão incluídos”, afirmou Bill Gilson, presidente do ramo nova-iorquino da organização Veteranos pela Paz, uma organização de ex-combatentes que defendem uma cultura alternativa à guerra.
“Minha preocupação é com os veteranos com estresse pós-traumático, as vítimas do Agente Laranja, e aqueles com lesão cerebral traumática em razão de artefatos explosivos improvisados e com sequelas pela intoxicação com urânio empobrecido. O Departamento de Saúde tem que ampliar os critérios” para receber o tratamento, afirmou Gilson.
A lei não inclui requisito algum para que os seguros médicos incluam a maconha medicinal, o que gera a preocupação de que o tratamento seria inacessível à população de baixa renda. A lei também não permite que os pacientes fumem a substância, devendo usá-la por meio de inalação com vaporizadores de custo variável. Os que receberem o tratamento também deverão pagar uma taxa de inscrição para obter uma carteira de identificação.
A DPA pediu ao Departamento de Saúde que exija das empresas que desejam produzir a maconha um plano de apoio às pessoas com baixa renda que precisarem do tratamento. Outra opção seria o governo estadual utilizar parte do orçamento para apoiar os necessitados. O Medicaid, seguro médico do governo dos Estados Unidos para as pessoas mais vulneráveis, não incluirá a maconha médica em sua cobertura.
No fórum público do dia 3 também foi criticada a pequena escala do programa proposto. Serão apenas cinco empresas produtoras de maconha e 20 dispensários que a expedirão em todo o Estado, que tem população aproximada de 20 milhões de habitantes. “Isso não é suficiente para atender a demanda de pacientes. Também geograficamente, ter apenas 20 dispensários em um Estado de 140 mil quilômetros quadrados não basta”, ressaltou Netherland.
Para muitos, a lei é um passo para a legalização plena da maconha no Estado. “Estou entusiasmado, mas há muitas limitações que temos de enfrentar. Vejo essa legislação como um passo para a imposição tributária e a regulamentação”, afirmou Mark Levine, conselheiro de Nova York. As limitações também incluem o método de consumo da maconha, já que não poderá ser fumada e só usada na forma de óleos e extratos.
“O emocionante é que a maconha medicinal ajudará as pessoas com as quais trabalho. Algumas com doença mental têm sintomas muito angustiantes, por exemplo, ouvem vozes ou sofrem de ansiedade”, pontuou Helen Redmond, assistente social na organização Acesso Comunitário. “A maconha reduz a ansiedade que sentem e pode aumentar a sensação de bem-estar. É uma coisa boa. Há poucos efeitos secundários”, apontou.
Redmond destacou que “a taxa de inscrição é problemática. Assim como a produção de óleos e extratos custa mais do que a planta e as pessoas não podem pagar. Há tantos habitantes em Nova York que estão na linha de pobreza ou abaixo dela. A vida das pessoas que precisam de medicamentos é importante”. Envolverde/IPS