Dilma Rousseff sanciona lei que restringe entrada em licitações públicas a empresas sem dívidas trabalhistas. Exigência vale inclusive para obras da Copa do Mundo e da Olimpíada, que seguirão regras específicas. Regularidade será comprovada por meio de um novo documento, a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas (CNDT), cuja criação foi incluída na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Exigência começa em 180 dias. Entidade patronal fez lobby contra sanção da lei, nascida de projeto apresentado há nove anos no Congresso.
BRASÍLIA – A partir de janeiro do ano que vem, as empresas interessas em participar de licitações públicas terão de provar que estão em dia com pagamentos trabalhistas. Em caso de dívidas, serão impedidas de habilitar-se para fornecer de bens ou serviços ao Estado. A exigiência também valerá para obras da Copa do Mundo e da Olimpíada, que serão contruídas segundo uma lei de licitações específica.
A obrigação de pagamentos trabalhistas regularizados como critério para entrar numa licitação consta de lei publicada no Diário Oficial da União da última sexta-feira (08/07). O texto faz mudanças em duas legislações anteriores. Na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), de 1943, e na Lei de Licitações, de 1993.
A CLT foi modificada para inclusão de um capítulo que cria a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas (CNDT). Esta certidão só será obtida por pessoas jurídicas ou físicas sem dívidas perante a Justiça do Trabalho. O documento terá validade de seis meses.
Já a Lei de Licitações foi alterada para inserção da exigência de que participantes de licitações estejam em dia com a Justiça do Trabalho. A prova será a certidão negativa. Até agora, a legislação cobrava apenas que as empresas não tivessem débitos com o setor público (recolhimento de impostos, por exemplo).
A mudança na lei 8.666 atinge os artidos 27 e 29. Ambos serão aplicados no Regime Difederenciado de Contratação (RDC), a lei de licitações especial para obras da Copa e da Olimpíada aprovada recentemente pelo Congresso.
Dias antes de a presidenta Dilma Rousseff decidir o que faria com o projeto aprovado pelo Congresso, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) pressionou para que ela o vetasse.
A entidade recorreu às micros e pequenas empresas para justificar o ponto de vista. Disse que a nova exigência afetaria sobretudo aquele segmento, em que é mais comum haver disputas trabalhistas. Sem elas numa licitação, o preço pago pelo setor público aumentaria.
Histórico no Congresso
A lei nasceu de projeto apresentado em 2002 por um senador do então PFL, Moreira Mendes (RO), sob o argumento de que, como crédito de natureza trabalhista tem privilêgio em disputas judiciais – costuma-se dar preferência ao pagamento dele em casos de falência, por exemplo -, seria justo que o setor público também levasse em conta este quesito em suas compras. Hoje, Moreira Mendes é deputado federal pelo PPS e comanda a Frente Parlamentar da Agropecuária, conhecida como bancada ruralista.
O projeto foi aprovado no Senado em apenas dois meses, mas ficou quase oito anos na Câmara dos Deputados.
Levantamentos feitos a cada quatro anos pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) mostram sempre que a bancada patronal tem mais força e representantes no Congresso do que a sindical.
Na atual legislatura, por exemplo, o Diap diz que 46% dos congressistas pertencem à bancada empresarial e apenas 12%, à sindical.
Diante desta desproporção, aprovação da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas talvez possa ser entendida a partir do fato de que a lei não foi votada nem no plenário na Câmara, nem no plenário do Senado. Mas apenas em comissões, o que é possível, em alguns casos, segundo as regras internas do Congresso.
* Publicado originalmente no site Agência Carta Maior.