Valladolid, Espanha, 17/11/2011 – Os pobres precisam conhecer economia e finanças para empregar os microcréditos como ferramenta contra a pobreza, afirmam especialistas. “Para que tudo funcione precisamos de clientes preparados, que entendam o que lhes é oferecido”, disse à IPS a espanhola Verónica López, diretora da Analistas Financeiros Internacionais (AFI), presente na Cúpula Mundial de Microcréditos que termina hoje nesta cidade.
As microfinanças atendem famílias pobres com baixos níveis de educação, o que também implica carências de conhecimento no manejo de créditos. “Falta os usuários saberem que existe uma relação contratual, que o empréstimo é uma quantia que deve ser devolvida, somado aos juros cobrados, e como se constrói essa taxa”, disse López, acrescentando que também devem saber que têm direitos e como exercê-los.
O último informe do Programa para a Avaliação Internacional de Alunos (Pisa), da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, detectou uma falta importante de conhecimento financeiro entre os jovens do mundo. Esta falta de informação sobre como funcionam as finanças se agrava entre as pessoas que vivem nas regiões mais pobres do planeta.
O Pisa, que realiza a avaliação internacional aplicada aos alunos a cada três anos e é o de maior impacto sobre o nível educacional de muitos países, conclui que os programas de estudo deveriam incluir temas de economia básica, e também considera a formação em finanças como um valor fundamental para a sociedade.
Especialistas que participam da cúpula, iniciada no dia 14 com cerca de dois mil delegados de mais de cem países, concordam que a educação financeira é um dos pilares para a inclusão e, por isso, deve envolver diferentes atores dos setores público e privado. “É uma obrigação dos Estados preparar os cidadãos para que possam manter uma relação adequada com as instituições de microcréditos”, disse López, para quem é tão importante enfatizar a supervisão dessas finanças para que não sejam cometidos abusos, quanto incentivar a educação financeira.
A diretora da Fundação Mulher, da Costa Rica, Zobeida Moya, explicou à IPS que sua entidade forma as receptoras de microcréditos em organização empresarial, liderança, manejo de juntas diretoras e registros. A capacitação financeira se complementa com motivação e formação em saúde, “porque uma mulher tem de estar sadia para ser produtiva”, acrescentou. “A formação financeira é uma importante estratégia contra o superendividamento”, disse Fabiola Céspedes, coordenadora do capítulo boliviano do Fórum Latino-Americano e do Caribe de Finanças Rurais (Forolacfr), ao falar aos delegados da cúpula.
Por sua vez, Rocío Urizar, coordenadora do programa de capacitação da não governamental Fundação de Assessoria Financeira para Instituições de Desenvolvimento e Serviço Social (Fafidess), da Guatemala, contou à IPS que, como valor agregado ao microcrédito, essa entidade há 20 anos forma mulheres indígenas nas áreas empresarial, técnica e de serviços. A Fafidess capacita 25% das 17 mil mulheres rurais usuárias de microcréditos no ocidente da Guatemala. Esse trabalho é feito com uma metodologia especial para chegar às pessoas que não sabem ler nem escrever, e utilizando facilitadores bilíngues para um universo de 22 idiomas maias.
“Na América Latina, os programas que atendem a maior porcentagem de mulheres são os que utilizam os bancos comunitários, grupos que se apoiam solidariamente, o que facilita a formação de capital social”, disse à IPS a consultora internacional Sara Pait Volstein, que trabalhou no Peru. A oportunidade de atuar com mulheres em grupo é aproveitada para o “microcrédito plus”, ou enfoque integral das microfinanças, que inclui estudos financeiros e treinamento no manejo de negócios ou na saúde e alimentação da família.
Volstein afirmou que os usuários finais não são os únicos que devem se capacitar, “mas também as instituições de microcréditos devem estar preparadas e sensibilizadas para fazer intervenções de acordo com este tipo de empréstimo”. A diretora da Freedom from Hunger, no México, María Matilde Olazábal, distingue entre alfabetização financeira, que consiste em ter conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias para administrar a vida econômica, e a capacidade nessa matéria, que consiste em contar com a oportunidade de aplicá-las.
A Freedom from Hunger, organizações não governamental especializada em atender pessoas com fome crônica, capacita as instituições de microfinanças para que elas eduquem a população à qual se dirigem usando sua plataforma para somar estes serviços. Olazábal está convencida de que, para que a educação financeira seja significativa para os mais pobres, deve estar baseada no diálogo e na promoção do pensamento. Por isso, deve animar os usuários das microfinanças a refletirem sobre sua vida e as novas práticas que podem adquirir para tornar possível uma mudança, afirmou.
“Só a informação não serve para quem não tem acesso a serviços”, disse Olazábal, para quem também é “determinante” na educação financeira identificar “o momento oportuno para ensinar”, que varia dependendo do público-alvo. Para a especialista mexicana, além disso, as microfinanças, cuja metodologia origina é grupal, “começam a se dispersar” pelo surgimento de novos produtos mais individualizados, como o banco móvel. Isto dificulta a educação financeira, reconheceu. Envolverde/IPS