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Lua de mel pode virar lua de fel

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Meninas na Cisjordânia.
Ramalá, Cisjordânia, 12/5/2011 – A Autoridade Nacional Palestina (ANP), liderada pelo moderado Fatah, e o Hamas (Movimento de Resistência Palestina) ainda têm que superar as suspeitas mútuas, bem como significativas diferenças de opinião e detalhes práticos, antes de ser possível a entrada em vigor desse governo de unidade.

Além disso, a hostilidade das autoridades israelenses, as quais não se entusiasmam em absoluto com o acordo palestino, e uma comunidade internacional cautelosa – particularmente os doadores ocidentais, dos quais a ANP depende para receber ajuda econômica e apoio político – seguem sendo obstáculos importantes. A luta de poderes entre os dois rivais palestinos foi evidente no dia 4 deste mês no Cairo, quando no último minuto os interlocutores egípcios entraram em um acordo para suavizá-la a fim de que a histórica assinatura se concretizasse.

O presidente da ANP, Mahmoud Abbas, quis subir sozinho no pódio e não compartilhá-lo com o chefe do escritório político do Hamas, Khaled Meshaal, exilado em Damasco. Abbas também pediu que seu discurso fosse mais longo do que o de Meshaal, assinalando assim seu desejo de imprimir sua liderança ao novo governo de unidade. Meshaal acabou concordando. O Hamas também mostrou pragmatismo ao cumprir as demandas da ANP e da comunidade internacional de várias outras maneiras.

A organização declarou que somente continuaria a resistência armada contra a ocupação israelense em coordenação com a ANP, e que respeitaria a política externa desta em relação a acordos anteriores assinados com a comunidade internacional. Além disso, o Hamas disse que quer o estabelecimento de um Estado palestino ao longo das fronteiras de 1967, como a ANP, segundo o direito internacional. Alguns dirigentes do Hamas declararam no passado que um acordo político com Israel baseado no reconhecimento de sua existência como uma realidade de fato era possível, embora colocasse em dúvida que fosse justo.

A IPS perguntou a Ahmed Youssef, conselheiro do primeiro-ministro do Hamas em Gaza, Ismail Haniyeh, se seu movimento reconheceria Israel. “Estaremos preparados para implementar uma Tadhiya (trégua de longo prazo) durante 40 anos e depois deixar que a próxima geração decida os passos a seguir”, disse Youssef à IPS. Mas há outros desafios pela frente quanto à implementação do governo de unidade. Há discordâncias em torno de quem será o próximo primeiro-ministro desse governo. O Hamas quer que alguém de Gaza ocupe este posto, enquanto o Fatah quer que seja alguém da Cisjordânia.

Entretanto, ambos parecem coincidir que o atual primeiro-ministro da ANP, Salaam Fayyad, que conta com apoio do Ocidente e não está alinhado com nenhum desses dois partidos palestinos, é uma figura possível. Por outro lado, isso poderia apresentar problemas na hora de contar com apoio dos doadores ocidentais, particularmente norte-americanos e israelenses com os quais Fayyad tem uma próxima relação de trabalho.

Os democratas no Congresso dos Estados Unidos já preparam legislação para frear a ajuda de seu país ao novo governo palestino, devido à inclusão do Hamas nele. Funcionários da União Europeia afirmam que precisam estudar a redação do novo pacto de unidade para determinar se continuarão dando assistência.

Caso pare a ajuda estrangeira à ANP, esta poderia se dissolver, deixando sem meio de sustento os 170 mil palestinos que emprega e que dependem deles, cenário que os analistas afirmam que pode muito bem desatar outro levante palestino. Também pode haver discordâncias quanto à integração do novo governo de unidade, que estará composto por tecnocratas independentes. Estes se prepararão para as eleições do próximo ano.

O acordo também estipula que Hamas e Fatah libertem os prisioneiros um do outro. Mas o site do Hamas informou que quatro de seus ativistas foram presos no acampamento de refugiados de Askar, perto de Naplusa, e dezenas de outros interrogados pelas forças de segurança da ANP. Além disso, a libertação dos presos do Hamas na Cisjordânia pode criar uma crise de segurança com Israel, enquanto a coordenação dos assuntos de segurança entre a ANP e o Estado judeu está sob pressão.

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, alertou que a ANP tem de escolher entre a paz com Israel ou a paz com o Hamas. Também tentou invocar a empatia internacional declarando que o novo governo de unidade nacional é uma ameaça para a segurança de seu país. Porém, o chanceler israelense discorda em certa medida, segundo um informe divulgado pelo jornal israelense Haaretz. Um informe interno e confidencial desta pasta diz que a criação de um governo de unidade entre Hamas e ANP dará a Israel uma oportunidade estratégica.

O acordo palestino “não é apenas uma ameaça à segurança, mas também uma oportunidade estratégica para criar uma mudança verdadeira no contexto palestino”, diz o artigo. “Tal mudança pode ser funcional aos interesses de Israel no longo prazo”. Acrescenta. Então interveio o ex-presidente norte-americano Jimmy Carter, que por muito tempo se interessou pelo conflito palestino-israelense.

“Se os Estados Unidos e a comunidade internacional apoiarem este esforço poderão ajudar a democracia palestina a criar a base de um Estado palestino unificado na Cisjordânia e em Gaza, que possa fazer uma paz segura com Israel”, disse Carter. “Se permanecerem distantes ou prejudicarem o acordo, a situação no território palestino ocupado poderá se deteriorar com uma nova onda de violência contra Israel”, declarou. Envolverde/IPS