San Isidro, El Salvador, 29/5/2014 – “A mineração é inviável em El Salvador”, afirmou Salvador Sánchez Cerén, que no dia 1º assumirá a Presidência desse país e sua equipe ambiental. Por trás dessa posição do novo governo há muitas lutas das comunidades rurais afetadas. Uma delas é a do povoado Llano de la Hacienda, no centro do país, cujos 1.200 habitantes se dedicam principalmente a plantar milpas (milho, feijão e abóbora), pastorear vacas e, recentemente, deter projetos de mineração.
Os homens e as mulheres desse lugar constituíram o primeiro foco de resistência à empresa canadense Pacific Rim Mining Corp, que em 2009 processou o Estado salvadorenho por lhe negar autorização de explorar a mina de ouro de El Dorado. O povoado está encravado entre as montanhas do município de San Isidro, no departamento de Cabañas, 65 quilômetros a noroeste de São Salvador, e tem a mina como vizinha indesejada.
A subsidiária local da Pacific Rim foi adquirida em novembro de 2013 pelo consórcio australiano OceanaGold por US$ 10,2 milhões. A demanda inicial foi de US$ 77 milhões e subiu no ano passado para US$ 301 milhões, em um caso que se encontra no Centro Internacional de Acerto de Diferenças Relativas a Investimentos (Ciadi) do Banco Mundial. A audiência decisiva está marcada para setembro.
Em Llano de la Hacienda, negar a permissão para a empresa é um triunfo das comunidades da área, após anos de intensa oposição e de um conflito social que desembocou, segundo os moradores, no assassinato de três ativistas, entre junho e dezembro de 2009.
“Toda nossa luta começou por este rio, para que não fosse contaminado com cianureto”, contou à IPS o camponês Juan Hernán Molina, enquanto descansava nas margens do rio Titihuapa, que serpenteia entre morros e planícies. O cianureto, metal pesado usado na extração de ouro, é letal para a saúde humana. O Titihuapa desemboca no rio Lempa, o mais importante do país, que abastece a capital, São Salvador.
Outra vitória do movimento ambientalista salvadorenho foi a decisão do Ciadi que, em agosto de 2013, negou uma prorrogação para que o norte-americano Commerce Group continuasse com a sua demanda de US$ 100 milhões contra o Estado. El Salvador se negara a renovar a permissão de exploração da mina San Sebastián, no departamento de La Unión, que o Commerce Group explorou entre 1987 e 2009.
No caso da Pacific Rim, “foi vencida uma batalha, mas não a guerra”, destacou José María Arévalo, outro camponês de Llano de la Hacienda. “O que queremos é que se proíba definitivamente”, disse à IPS caminhando pela área. “Em todos esses terrenos há poços perfurados pela Pacific Rim, quando explorava em busca de ouro”, acrescentou. Embora a exploração tenha parado, na mina El Dorado se mantém um pequeno grupo de trabalhadores que fazem serviços de manutenção de equipamento e limpeza, contaram os moradores à IPS.
Há dois anos, organizações ambientais reunidas na Mesa Nacional Contra a Mineração apresentaram na Assembleia Legislativa (unicameral) um projeto de lei proibindo a atividade mineradora, por suas repercussões na saúde e no ambiente. Se for aprovado, El Salvador entrará no reduzido grupo de países da América Latina que impedem essa indústria por lei. Em 2010, a Assembleia Legislativa da Costa Rica aprovou uma lei que proíbe a mineração a céu aberto, e o Panamá fez o mesmo dois anos depois, mas delimitando as proibição às áreas das comunidades indígenas das províncias ocidentais de Bocas del Toro, Chiriquí e Veraguas.
Em El Salvador, o Ministério do Meio Ambiente apresentou, em 2012, um projeto de lei para suspender as atividades de mineração, que as organizações sociais consideram insuficiente. “Não aprovamos a ideia de uma moratória porque deixa o assunto em suspenso, dá espaço às companhias para se prepararem. Nós queremos que pare de vez”, ressaltou Héctor Berríos, dirigente do Movimento Unificado Francisco Sánchez 1932 (Mufras 32). Essa organização, com sede em São Salvador, há anos acompanha as comunidades de Cabañas na luta contra as mineradoras.
Em todo caso, nem o projeto de suspensão nem a proibição total têm vez no parlamento de 84 deputados, onde os partidos de direita são contrários às duas iniciativas e contam com maioria. O partido de Sánchez Cerén, a esquerdista e ex-guerrilheira Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional (FMLN) tem apenas 31 legisladores e difíceis apoios para chegar aos 43 votos necessários para levar adiante a lei da suspensão.
“Os deputados deveriam velar pelo bem da saúde da população e pela água”, opinou à IPS, em San Isidro, a jovem Roxana Ramírez, enquanto trabalhava junto a outras três mulheres na elaboração de conservas de hortaliças. Elas participam de um projeto que pretende demonstrar que os municípios próximos a El Dorado podem se desenvolver e gerar emprego sem necessidade de recorrer à mineração como fonte de renda. “É uma alternativa que pode ser adotada nas demais comunidades”, acrescentou Roxana, enquanto colocava pedaços de cenoura e couve-flor em um pequeno vasilhame com vinagre.
Sánchez Cerén, vice-presidente do governo que está terminando sua administração, professor e ex-guerrilheiro de 69 anos que em março venceu as eleições presidenciais, terá que demonstrar o quanto é firme seu compromisso, reiterado durante a campanha eleitoral. Suas nomeações no Ministério do Meio Ambiente fazem pensar que, ao menos, vai tentar.
Como vice-ministro foi designado o ativista Ángel Ibarra, que teve papel protagonista na luta contra a Pacific Rim e a mineração em geral, desde a Unidade Ecológica Salvadorenha. “Há uma decisão do novo presidente de que a mineração é inviável em El Salvador”, afirmou Ibarra com convicção à IPS. Como ministra do Meio Ambiente foi designada a até agora vice-ministra Lina Pohl, uma das promotoras da suspensão e que dias antes reiterou que “não pode haver atividade mineira”, mas acrescentando “sob as condições atuais”.
À sombra de uma árvore junto ao rio Titihuapa, o camponês Arévalo afirmou: “Não vamos descansar enquanto os políticos não aprovarem uma lei antimineração, essa é a única opção”. Envolverde/IPS