Mais concorrência e responsabilidade na previdência privada

Dados da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi) indicam que o mercado de previdência privada cresceu 32% no primeiro semestre deste ano, atingindo R$ 330 bilhões em ativos administrados. A combinação do crescimento da renda e a ainda baixa taxa de poupança da população brasileira devem contribuir para que esse crescimento continue acelerado nos próximos anos. É a forma que o brasileiro encontrou para se obrigar a poupar em favor da realização de um sonho futuro, seja a própria aposentadoria ou até mesmo a aquisição de um bem ou serviço, como a educação dos filhos.

Esse movimento é muito positivo justamente porque retrata uma preocupação com o futuro ainda pouco verificada na nossa sociedade, viciada no imediatismo do consumo e nas compras parceladas. Claro que ainda estamos muito distantes de países com padrão de poupança consolidado, mas, aos poucos, vamos aprendendo a postergar a satisfação presente em nome da segurança financeira e da busca de sua realização de sonhos de longo prazo de maneira mais sustentável.

O Brasil ainda tem uma parcela muito significativa da população ingressando no mercado de consumo – em particular, pessoas das classes C e D que não tinham praticamente acesso aos bens de consumo duráveis e de repente conseguem equipar a casa e adotar as compras no shopping como principal atividade de lazer. Felizmente, os planos de previdência têm acompanhado esse movimento, ganhando cada vez mais espaço na cesta de consumo do brasileiro médio.

Na última década, os planos de previdência do tipo VGBL, por exemplo, tiveram crescimento médio de 19,85% ao ano, contribuindo para que o Brasil atingisse um volume de aplicações de previdência privada em geral de 21,7% do Produto Interno Bruto. Mas, apesar disso, ainda há muito espaço para crescimento, pois tal volume de investimentos reflete uma proporção consideravelmente inferior à verificada em países com perfil semelhante de população e de serviços públicos nessa área, como Austrália (90,95% do PIB), Estados Unidos (72,67%) e Chile (64,66%), segundo dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Nesse processo de desenvolvimento do mercado brasileiro, o aumento da concorrência tem o efeito muito benéfico de favorecer a redução das taxas de carregamento e de administração dos planos de previdência. Num contexto de taxas de juros cada vez menores e de investimento de longo prazo, o impacto disso pode ser altamente significativo na rentabilidade final.

Outro aspecto fundamental é que, junto com o crescimento do mercado, há uma cobrança cada vez maior da sociedade em favor do aumento da transparência desses produtos. Isso porque o atual consumidor está muito mais consciente e criterioso em relação ao que compra. Assim como em muitos casos se recusa a comprar diretamente ações de fabricantes de armas e de cigarros e penaliza empresas que mantêm condições análogas ao trabalho escravo ou desrespeitam o meio-ambiente, quer garantia de que seu fundo de previdência seguirá princípios dessa natureza na hora de escolher em que empresas e segmentos investir.

Esse movimento aumenta ainda mais as exigências em torno dos gestores, num cenário já complexo devido à necessidade de buscar a sonhada combinação de elevada rentabilidade e baixo risco num ambiente de redução das taxas de juros: precisam ficar atentos às opções de investimento mais sustentáveis no longo prazo, ou seja, justamente as empresas que focam no social, econômico e ambiental de maneira equilibrada.

A boa notícia é que as organizações comprometidas com esses princípios tendem a apresentar maior rentabilidade em longo prazo. É isso que mostra, por exemplo, o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), da Bovespa, que teve valorização de 112,77% no período de janeiro de 2006 a junho de 2012, enquanto o Ibovespa subiu apenas 65,12%. A diferença é menor, mas ainda muito expressiva, na comparação entre os indicadores do período de junho de 2011 a julho de 2012: 106,9% do ISE contra 87,4% do Ibovespa.

Portanto, faz todo o sentido que os fundos de previdência sigam princípios semelhantes a esse tipo de aplicação, com foco em sustentabilidade. Afinal, o que pesa mais num produto desse tipo não é a variação da bolsa de valores em um dia, mas o potencial de crescimento e a segurança do negócio, de modo que possa continuar gerando valor daqui a 20 ou 30 anos e ajude a tornar realidade os sonhos e a poupança de milhões de brasileiros.

* Camilo Terranova é coordenador de Análise Ambiental, Social, de Governança & Engajamento da Keyassociados.