A reintrodução de espécies nos seus respectivos ecossistemas é apresentada como uma das formas de devolver para as florestas naturais a vida que lhes foi e continua sendo tirada ainda mesmo nos dias atuais pelo comércio ilegal de animais silvestres.
Quem nunca fez uma trilha em uma área que parecia estar bem conservada de Mata Atlântica e saiu decepcionado por não ter visto um bicho sequer? Pois infelizmente isto já é bem conhecido dos estudiosos ligados às ciências da natureza e tem até nome, são as ‘Florestas Vazias’, onde as comunidades animais, especialmente de grandes indivíduos, foram dizimadas.
Nelas, os processos ecológicos são gradativamente perdidos, como as sementes que se acumulam no chão da floresta por falta de dispersores (exterminados) ou as populações de animais que acabam sumindo devido a pequena variabilidade genética regional.
A reintrodução destas espécies em seus ecossistemas originários é uma estratégia rotineira para recomposição em ambientes naturais de órgãos ambientais em vários países, como África do Sul, Nova Zelândia e Reino Unido.
Porém, segundo o Biólogo e Doutor em Zoologia Fábio Olmos, em contraposição, no Brasil pouco se pensa em projetos de reintrodução , por exemplo, nem com as araras na Mata Atlântica se têm o cuidado necessário para conseguir manter sua população em médio e longo prazo.
Os britânicos estão trabalhando para restaurar uma população de Grous (Grus grus), perdida na natureza há cerca de 400 anos devido à drenagem de áreas úmidas. A meta é que 100 aves sejam liberadas na natureza até 2015 (Leia mais).
Os neo-zelandeses também estão realizando projetos de sucesso no reestabelecimento de populações de Kokako, dizimados pelo desmatamento e introdução de predadores exóticos pelas mãos dos homem (como ratos). Fábio contou, durante o AVISTAR 2011, realizado em São Paulo no último final de semana, que na Nova Zelândia, as espécies exóticas são eliminadas, a vegetação nativa é reestabelecida e os animais reintroduzidos.
Terras brasilis
No Brasil, os exemplos de iniciativas do gênero são poucos, como no caso dos Guarás em Cubatão, onde foi feita uma soltura sem alguma metodologia numa época em que o zoológico de Santos não tinha mais espaço para tantos animais. Atualmente o manguezal da cidade conta com cerca de dois mil Guarás.
No caso dos Guarás, a estratégia utilizada não foi exatamente a mais adequada, apesar de ter dado certo, conta Fábio
É necessária uma base científica precisa para a reintrodução de espécies em áreas de mata nativa, do contrário, danos significativos podem ser infringidos às populações residentes, como a introdução de patógenos aos quais não têm imunidade ou o desequilíbrio populacional, quando não se tem conhecimento suficiente sobre o ecossistema que se pretende enriquecer.
O projeto Ninhos é um bom exemplo, que reintroduziu cinco Tucanos Toco (Ramphastos toco) apreendidos em fiscalização da Policia Ambiental em São Carlos, São Paulo, após reabilitação. A soltura simples dos tucanos foi feita com a ajuda de agricultores da região, com a instalação de um viveiro temporário em sua propriedade para que os animais se acostumassem novamente com o ambiente natural.
O monitoramento desses animais está em andamento e dados conclusivos sobre a permanência desses indivíduos em seus ecossistemas originais ainda são desconhecidos.
A base jurídica para a reintrodução de animais silvestres existe no Brasil, envolvendo a Constituição Federal (Artigo 225 § 1), a Lei de Crimes Ambientais (Cap. III, Art. 25 §1 e e Decreto 6.514/08) e a Instrução Normativa 179/2008 do IBAMA.
“O maior problema é o governo, sendo muito pouco proativo para juntar os diferentes atores e fazer com que funcione. Cada um acaba fazendo o que quer”, alertou Fábio.
Apesar da legislação, que prevê sanções aos crimes ambientais, mencionar uma multa maior aos crimes ambientais com espécies ameaçadas, os traficantes continuam sem uma punição real já que a pena de no máximo três anos de detenção pode ser objeto de transação penal e virar cestas básicas.
Venda de animais
O comércio ilegal de animais silvestres é amplamente conhecido e repudiado pela população, entretanto ainda existem muitas pessoas que, por estarem longe da natureza, querem trazer um pedacinho dela para sua casa, mesmo vivendo no meio da cidade, e acabam contribuindo com este atividade extremamente cruel.
Segundo dados reunidos em São Paulo e compilados pelo IBAMA, cerca de 35 mil animais silvestres são apreendidos todos os anos apenas no Estado. Isto é uma quantidade ínfima do que realmente é movimentado no país, um cenário arrebatador que passa longe do conhecimento de muitas pessoas que incentivam o comércio ilegal pensando ser apenas um bichinho, não tendo impacto algum.
Vincent Lo, analista do IBAMA também presente no AVISTAR 2011, lamenta que mesmo dos 35 mil animais apreendidos, apenas cerca de 10 mil são recebidos pelos seis Centros de Triagem de Animais Silvestres (CETAS) de SP. Destes 10 mil, 30% acaba morrendo, 30% vai parar em cativeiros e 30% são soltos. Portanto, apenas uma quantidade ridícula dos animais consegue voltar aos seus ecossistemas originais e cumprir o seu papel ecológico.
Os locais de soltura também são um obstáculo, pois precisam de uma série de requisitos para garantir que as espécies não sejam ameaçadas. No Estado de São Paulo, o Ibama tem incentivado a formação destas áreas de soltura em parceria com proprietários interessados em preservação e recomposição da fauna local (Leia mais).
A discussão sobre o direcionamento destas espécies capturadas no comércio ilegal para o repovoamento das ‘Florestas vazias’ é uma muito discutida entre os meios acadêmico e administrativo no Brasil, porém a burocracia e as duvidas procedurais quanto à soltura dos animais ainda impedem que grande parte volte para as florestas.
Cuidados sanitários, epidemiológicos e científicos devem ser tomados antes da soltura, mas é ainda mais urgente que sejam tomadas decisões concretas antes que seja tarde demais.
O governo precisa fazer o seu papel fortalecendo os CETAS( hoje muitos estão em estado de penúria), as polícias ambientais e os órgãos de fiscalização e ainda apoiando pesquisas epidemiológicas sobre doenças de animais silvestres e também sobre a composição dos próprios ecossistemas, ainda extremamente desconhecidos.
Silvestre não é pet
Mas não podemos esquecer que temos uma responsabilidade enorme que é a de conscientizar as pessoas ao nosso redor que o lugar de animais silvestres, mesmo que “bem tratados”, não é em nossas casas como animais de estimação e sim nos seus respectivos ambientes naturais, do qual eles dependem.
A domesticação de animais silvestres (como tartarugas, papagaios, dentre outros) é um perigo para a saúde dos ‘proprietários’, pois trazem consigo muitas doenças e têm comportamento naturalmente selvagem, podendo os machucar. A tentativa de sua ‘humanização’ é um stress desnecessário para o animal que deveria estar a quilômetros da cidade, cumprindo seu papel ecológico.
“Temos que incentivar o avistamento em vida livre, como atividades de Birdwatching (Observação de Aves), silvestre não é pet, a diversão humana não pode ser às custas dos animais”, ressaltou Vincent.
A remoção de animais silvestres dos seus ambientes é um problema sério e silencioso, pois muitos de nós têm a falta idéia ao ver áreas verdes que a biodiversidade está por todos os lados como há 500 anos. Mas a cada dia, filhotes são tirados das mães, comprados, e quando se percebe as dificuldades de criar um animal destes, ele é abandonado em CETAS e as florestas… ficam cada vez mais vazias.
Durante o AVISTAR 2011 diversos temas foram discutidos e apresentados norteando a relação entre as aves e os ecossistemas naturais no Brasil e no Mundo, mostrando sua importância como bioindicadoras e subsidiando à conservação ambiental através do conhecimento de seus hábitos, e dessa forma sensibilizando muitas pessoas a protegerem os biomas brasileiros, tão ameaçados.
Linha Verde do Ibama:(denúncias e informações) – 0800 61 8080
* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.