Arquivo

Medo do isolamento leva Israel a dialogar com os palestinos

Construção de um assentamento em Ariel, na Cisjordânia. Foto: Pierre Klochendler/IPS
Construção de um assentamento em Ariel, na Cisjordânia. Foto: Pierre Klochendler/IPS

 

Jerusalém, Israel, 8/8/2013 – As renovadas conversações de paz entre palestinos e israelenses são possíveis graças ao fato de todas as partes envolvidas no processo se darem conta de que o isolamento diplomático constitui uma ameaça estratégica para Israel. Essa ameaça permanecerá sobre a cabeça do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, o mesmo tempo que levar para acordar as fronteiras anteriores a 1967 como base para o fim da ocupação, que já dura 46 anos.

Na falta de tal compromisso por parte de Netanyahu, o que cimentou o caminho para o reinício das conversações de paz, após interrupção de cinco anos, foi o gabinete israelense ter aprovado a libertação de 104 prisioneiros palestinos que estão nas prisões do Estado judeu há mais de 20 anos, além de um congelamento parcial e não oficial das colônias. A mídia israelense informou que Netanyahu se comprometeu com o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, a limitar a emissão de autorizações de construção a mil unidades habitacionais em blocos de assentamentos judeus durante o período de nove meses das conversações de paz. Até agora nenhuma autorização foi emitida.

Seu ministro da Defesa, Moshé Yaalon, se referiu, nos meios de comunicação israelenses, a “muitas considerações estratégicas, que podem se revelar no futuro”, como catalisadoras para as decisões táticas de seu país. Quais são essas considerações estratégicas ocultas?

Por um lado, Netanyahu teme que, na ausência de progressos na frente de paz, os Estados Unidos se mostrem reticentes em dar apoio diplomático ou militar a eventuais ataques aéreos israelenses contra sítios nucleares do Irã. Embora o primeiro-ministro descarte um ataque, se ao mesmo tempo se negar a negociar seriamente com os palestinos, poderá perder ingerência no manejo internacional da crise nuclear do Irã. Também lhe poderá ser mais difícil considerar-se internacionalmente a posição de Israel sobre a guerra civil na Síria, ou sobre o risco de conflito interino semelhante no Egito.

Por outro lado, para os Estados Unidos e a União Europeia – membros do quarteto para a Paz no Oriente Médio mais próximos de Israel do que os outros dois, Organização das Nações Unidas (ONU) e Rússia – será extremamente difícil convencer seus aliados árabes de que são suficientemente poderosos para manejar a crise na Síria e no Egito, e com o Irã, se não têm poder em relação a Israel. Nesse caso, um ataque militar contra instalações nucleares iranianas – apoiado ou não pelos Estados Unidos – seria duramente criticado, e não só por parte do mundo árabe. Também prejudicaria os interesses de Washington no Oriente Médio.

Outros elementos afetam o pensamento estratégico de Israel. Embora já esteja claro que Kerry conseguiu relançar o processo de paz, a UE decidiu continuar pressionando Israel e divulgou novas pautas que exigem que seu bloco de 28 nações dê tratamento coordenado nos futuros acordos de financiamento e cooperação com entidades israelenses.

Várias organizações europeias já participam da campanha Boicote, Sanções e Desinvestimento (BDS) contra Israel. Além disso, as novas diretrizes da União Europeia, que entrarão em vigor de fato em 2014, instruem os Estados membros a proibirem acordos com grupos ou indivíduos israelenses que operem além das fronteiras anteriores às de 1967.

No caso de qualquer futuro acordo desse tipo, se exigirá que Israel certifique que o beneficiário respeita as novas pautas. Naturalmente, Netanyahu rejeita isto categoricamente porque suporia assinar embaixo da postura da UE de que a reclamação de soberania que Israel faz sobre a ocupada Cisjordânia e sobre Jerusalém oriental é ilegítima.

Restam cinco meses para que, no começo de 2014, Israel mostre progressos na mesa de negociação e consiga melhores termos para a implantação de futuros acordos com a UE. Outra consideração israelense é a ameaça de outra temporada de reprovações na reunião anual da Assembleia Geral das Nações Unidas.

Nos últimos dois anos, tanto a Assembleia Geral quanto o Conselho de Segurança cuidaram da reclamação da Palestina para ser reconhecida como Estado. Em 2011, a medida foi adiada, mas voltou a ser assunto no outono boreal seguinte. Em 2012, a Assembleia, de 193 membros, votou esmagadoramente a favor de elevar o status da Palestina de “entidade observadora não membro” para “Estado observador não membro”. Isso lhe dá o direito de integrar instituições como o Tribunal Penal Internacional. Nesse caso, a Palestina adquire poder para iniciar procedimentos penais contra colônias judias ou contra qualquer ataque militar israelense, cometido, por exemplo, contra a Faixa de Gaza.

Embora o presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, tenha sucumbido à pressão conjunta dos Estados Unidos e de Israel e deixado em suspenso sua campanha para a criação de um Estado palestino, em termos gerais, quanto mais se potencializam internacionalmente o status e a legitimidade dos palestinos, mais se deterioram o status e a legitimidade de Israel.

Chegado setembro, Netanyahu terá entendido que não tem poder para se colocar contra as iniciativas anti-israelenses na ONU. Nos políticos de Israel agora ganha força a ideia de que a ameaça estratégica para seu país não são os palestinos propriamente, mas a paralisação das negociações.

Daí que, ao chegar aos Estados Unidos para a abertura oficial das conversações de paz, a equipe de negociadores israelenses foi primeiro se reunir com o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon. A finalidade da reunião não era informar Ban sobre o reinício das negociações, mas garantir que ONU as apoiaria e, em consequência, impediria qualquer iniciativa unilateral contra Israel durante o processo.

Em meio ao ceticismo e pessimismo reinantes na região, pode-se estabelecer um paralelo histórico com a repentina insistência de Israel em conseguir a paz. A retirada de militares e civis israelenses da Faixa de Gaza, realizada exatamente há oito anos pelo ex-ministro Ariel Sharon, foi desatada por ameaças de isolamento diplomático.

Uma enorme espada de Dâmocles pende sobre a cabeça de Israel, já que o mundo está cansado da ocupação. O status de Israel agora depende de como a comunidade internacional avaliará as vicissitudes do processo, e de como avaliará os progressos feitos por Israel na dolorosa luta para um acordo final. O acúmulo do isolamento diplomático de Israel é o que, finalmente, pode dar a melhor oportunidade à paz. Envolverde/IPS