Um regime de “metas de inflação” com credibilidade exige uma estreita coordenação entre as políticas fiscal e monetária. Ele é importante porque proporciona tranquilidade social à disputa entre o trabalho e o capital na captura dos aumentos reais de produtividade da mão de obra.
A fixação dos salários nominais depende de dois parâmetros: a) da taxa de inflação consensualmente esperada e b) da variação da produtividade da mão de obra, cuja distribuição decide como o aumento da produtividade será dividido entre capital e trabalho.
O ideal é que a “meta” seja a menor possível, não muito distante da taxa dos parceiros no comércio internacional.
Isso elimina um dos fatores da volatilidade da taxa cambial, supondo que outras condições estejam satisfeitas, a exemplo da taxa de juros real interna equivalente à externa.
Não há nenhuma evidência empírica (obviamente é ridículo falar em “evidência teórica”) de que taxas de inflação abaixo de 7% ao ano tenham qualquer efeito de longo prazo sobre o crescimento do PIB.
Em outras palavras, os fatos não sancionam nenhuma das duas afirmações frequentes:
a) que um pouco mais de inflação produz um pouco mais de crescimento e b) que uma taxa de inflação de 3% é muito melhor para o crescimento do que uma de 4,5%. A despeito disso, seria melhor (quando possível) dispor de um índice de 3%. A taxa de inflação pode ser vista como um tipo de “radiador” que dissipa o calor quando há uma diferença persistente entre o fluxo da oferta (não só por problemas físicos, mas por atritos institucionais) e o da demanda global. O deficit em conta-corrente, por sua vez, é um tipo de “regulador” de pressão, que alivia o trabalho do “radiador”.
A melhorar o funcionamento do “radiador” (tornar mais rápida a queda da temperatura), o que se exige são reformas microeconômicas que desembaracem o funcionamento dos mercados. Para reduzir a pressão sobre o “regulador”, precisamos de medidas macroeconômicas (políticas fiscal, monetária e cambial).
Diante da ausência de tais condições, a política do Conselho Monetário Nacional de adiar a busca da meta de 4,5% para dezembro de 2012 é bem-vinda. Trazer a inflação para a meta em dezembro de 2011 envolveria o grande risco de derrubar o crescimento sem nenhum benefício, nem no curto nem no longo prazo.
É hora de entender que não nos resta outra alternativa a não ser “trocar os pneus com o carro andando”. Isto exige que o Congresso deixe de lado suas instâncias e ajude a aprofundar as reformas microeconômicas que nele dormem o sono da eternidade.
A discussão da redução da meta de inflação é extemporânea: só adiciona mais ruído a uma orquestra mal afinada.
* Delfim Netto é economista, formado pela Universidade de São Paulo e professor de Economia, e foi ministro de Estado e deputado federal.
** Publicado originalmente no site EcoD.