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Microcréditos para adaptação à mudança climática

Cidade do Cabo, África do Sul, 28/6/2011 – Apenas 5% dos projetos criados para adaptação à mudança climática são executados devido à escassa disponibilidade de dinheiro, o que obriga a que haja um uso eficiente dos recursos. A solução pode custar entre US$ 140 bilhões e US$ 175 bilhões ao ano até 2030, segundo o Banco Mundial. A adaptação chega a US$ 75 bilhões e US$ 100 bilhões anuais entre 2010 e 2050.

[media-credit name=”Kristin Palitza/IPS” align=”alignright” width=”300″][/media-credit]“A vida cotidiana das pessoas de menor renda será a mais afetada pela mudança climática. São necessárias soluções que as incluam nos grandes projetos de adaptação”, afirmou Hela Cheikhrouhou, diretora de energia, meio ambiente e mudança climática do Banco Africano de Desenvolvimento, que promoveu uma conferência no Fórum de Associação para Fundos de Investimento Climáticos (CIF) 2011, realizado nesta cidade sul-africana nos dias 24 e 25 deste mês.

O CIF, criado pelo Banco Mundial e por bancos de desenvolvimento multilaterais regionais, oferece assistência financeira para projetos de adaptação e mitigação da mudança climática em nações em desenvolvimento. Mais de um terço do fundo do CIF foi distribuído em 15 países africanos, mas são poucos camponeses e as pessoas mais pobres, com maiores dificuldades de conseguir dinheiro, os que se beneficiaram dessas iniciativas, em grande parte devido a barreiras administrativas.

“Precisamos garantir fundos para as populações rurais, pois são necessários projetos contra a mudança climática com aplicações práticas”, afirmou Victor Kabengele, coordenador de projetos do Ministério do Meio Ambiente da República Democrática do Congo. Também é importante que haja menos papelada e poucas condições, do contrário a inclusão dos pobres em projetos contra a mudança climática continuará sendo uma promessa vazia, acrescentou, ressaltando que “o nome do jogo é dinheiro, e é importante poder ter acesso ao microcrédito”.

Entretanto, são poucos os projetos atuais que ajudam os pobres africanos a investir em iniciativas contra a mudança climática. Um deles é gerido pela Global Partnership on Output-Based Aid (GPOBA), associação de doadores e organizações internacionais que trabalham para facilitar o acesso a serviços básicos. Trata-se de uma associação de seis organismos, a agência de ajuda australiana AusAid, o Banco Mundial e sua Corporação Internacional de Finanças, a sueca Agência para o Desenvolvimento, o Departamento para o Desenvolvimento Internacional, da Grã-Bretanha, e a holandesa Direção de Cooperação para o Desenvolvimento.

A GPOBA apoia instituições financeiras em comunidades que carecem de serviços básicos por falta de recursos econômicos, como a conexão a programas de eletricidade com uso eficiente da energia. Nesse caso, um banco local recebe subsídios para conceder microcréditos às comunidades e ajudá-las a comprar sistemas de energia renováveis para as moradias.

“Queremos aumentar o acesso aos serviços básicos das pessoas mais pobres, como infraestrutura, tecnologia, saúde e educação, para que possam enfrentar as consequências da mudança climática”, disse Mustafa Hussain, especialista da GPOBA. “Também pretendemos implantar novos mercados em zonas rurais, especialmente de tecnologia renováveis”, acrescentou. A GPOBA colaborou em 2010 com o lançamento de 131 projetos, com US$ 3,5 bilhões aportados pelo Banco Mundial e US$ 2,8 bilhões pelos respectivos governos. Quase um terço desse dinheiro foi investido pelo continente africano.

Em Uganda, por exemplo, um subsídio facilitou fundos para uma empresa privada que opera sistemas de fornecimento de água. Isso permitiu que a empresa oferecesse água potável a mais de oito mil residências rurais que careciam de água corrente. “Mediante o subsídio, as agências de microcréditos se animam a conceder empréstimos aos mais pobres porque sabem que os refinanciaremos com base em resultados pré-acordados. Isto leva a um crescimento maior e faz com que haja investimentos nas comunidades rurais”, explicou Hussain.

Outra forma de sucesso na concessão de fundos aos camponeses é um sistema de transferência de dinheiro desenvolvido pela operadora de telefonia móvel queniana Safaricom. Quase 70% dos quenianos vivem em áreas rurais e têm dificuldades de acesso a bancos ou caixas automáticos e apenas 40%, dos 39 milhões de habitantes têm conta bancária. Mas 83% da população possui telefone celular, o que levou a Safaricom a oferecer serviços financeiros por meio da iniciativa M-Pesa, dinheiro na língua swahili.

Os clientes podem pagar contas e fazer transferências de dinheiro com seus celulares, além de ter acesso a outros serviços financeiros, como micropoupança, microcrédito e microsseguros. “Os camponeses economizam cerca de três horas, em média, para cada transação ao não terem de percorrer grandes distâncias até um banco e nem enfrentar longas filas”, disse a chefe de desenvolvimento de produto da M-Pesa, Japhet Aritho. “Também economizam cerca de US$ 3 em transporte para cada transação, que agora podem usar, por exemplo, na compra de comida”, acrescentou.

A M-Pesa já tem 700 mil clientes, que realizam 90 milhões de transações por mês. O projeto também oferece serviços criados especificamente para combater a mudança climática. Existe um programa para garantir cultivos nos quais as taxas podem ser pagas por telefone celular e os agricultores recebem mensagens de texto com informação sobre o clima. Outro programa oferece acesso a bombas de água que funcionam com energia solar por meio de cartões inteligentes que são carregados com dinheiro pelo celular.

No fórum do CIF, especialistas concordaram que as iniciativas financiadas com microcréditos são fundamentais para a mitigação e a adaptação à mudança climática. “O acesso ao crédito é fundamental. No momento, os fundos para o meio rural são relativamente limitados. Precisamos mais”, insistiu Kabengele. Envolverde/IPS