Modi quer recuperar o tempo perdido da Índia

Shyam Saran. Foto: Cortesia do autor
Shyam Saran. Foto: Cortesia do autor

Nova Délhi, Índia, maio/2014 – Embora os sucessivos governos desde a independência da Índia, em 1947, tenham mantido um amplo consenso em torno dos princípios fundamentais da política externa, o novo governo do Partido Bharatiya Janata (BJP) introduzirá algumas mudanças significativas nas relações internacionais, correspondentes à sua posição centrista, sustentado por uma sólida maioria e guiado por um líder carismático.

O novo primeiro-ministro da Índia, Narendra Damodardas Modi, terá, ao contrário de seus antecessores, uma ampla margem de manobra e não estará sujeito a pressões por parte de partidos aliados em uma coalizão.

Mesmo antes de assumir o cargo no dia 26, Modi tomou decisões reveladoras de suas prioridades, ao convidar para a cerimônia de posse todos os líderes dos países da Associação da Ásia Meridional para a Cooperação Regional (AAMCR).

Esse passo reflete a importância dada aos países vizinhos e a intenção de Modi de empreender sem demora o diálogo com seus líderes para impulsionar a integração econômica regional.

É promissor que seu colega paquistanês, Nawaz Sharif, ter conseguido superar a oposição interna e aceitar o convite de Modi, que incluía um encontro bilateral. Os dois líderes são reconhecidos partidários de incrementar as relações econômicas e comerciais entre os dois países. Por isso, é de se esperar que as relações mútuas empreendam uma virada positiva.

O obstáculo está na resistência do Paquistão em fazer com que cessem os ataques terroristas através da fronteira com a Índia. No passado, oportunidades como a atual foram frustradas como consequência de graves ataques cometidos por terroristas procedentes do Paquistão, tolerados e frequentemente apoiados pelo Estado.

A transição política no Afeganistão, junto com o recrudescimento das hostilidades pelo grupo radical islâmico Talibã, pode exacerbar a tensão entre Índia e Paquistão.

Teme-se que, apesar do perigo que implicaria para sua própria segurança, o Paquistão, que permitiu a existência de santuários do Talibã em seu território durante vários anos, agora possa ajudá-lo em sua tentativa de reconquistar o governo de Cabul.

Se isso ocorrer, os países da região estarão ameaçados por uma nova onda de extremismo religioso e de terrorismo fundamentalista, e a Índia seria o maior objetivo.

Modi é um admirador do espetacular crescimento econômico da China e de seu conceito do “poder nacional compreensivo”. Por isso, o novo governo se esforçará para que a economia indiana volte a crescer velozmente, e a política externa se orientará nessa direção.

Embora no campo da segurança o enfoque continuará sendo cauteloso, a intensificação dos vínculos comerciais e econômicos bilaterais, que o novo governo prosseguirá, apoiará as perspectivas de desenvolvimento.

A mesma motivação vale para o Japão, que já é uma significativa fonte de capitais e de tecnologia para a Índia. É provável que o Japão esteja entre os primeiros países que Modi visitará como primeiro-ministro.

Com relação aos Estados Unidos, supõe-se que Washington dará passos diplomáticos para reparar a vergonha infligida ao BJP quando, em 2005, negou visto de entrada a Modi, acusando-o de cumplicidade nos sangrentos enfrentamentos que ocorreram quando era governador do Estado de Gujarat.

Por outro lado, algumas corporações norte-americanas lançaram recentemente uma forte campanha contra as políticas da Índia em matéria de impostos, direitos de propriedade intelectual e normas reguladoras.

A Índia é contrária a seguir Washington nas sanções contra Irã e Rússia, enquanto ainda não está claro como os Estados Unidos pensam encarar sua presença no Afeganistão depois de 2014, quando completar a retirada de suas tropas do país, e se ao defini-la terá em conta os interesses e as preocupações da Índia na região.

Apesar dessas diferenças, Índia e Estados Unidos têm em comum importantes interesses de longo prazo, em particular a estratégia em relação ao crescimento da potência chinesa e a configuração do desenho econômico e de segurança na área Índia-Pacífico.

Se Modi colocar em marcha a economia, as empresas norte-americanas terão maiores oportunidades de negócios na Índia, que já é um importante mercado para alguns setores da superpotência, como a indústria militar.

Em termos gerais, a recuperação econômica e um governo sólido e coerente aumentarão a influência da Índia no cenário internacional. Modi participará da próxima cúpula do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul), onde é esperado com interesse, já que no passado recente a diplomacia de Nova Délhi mostrou um perfil baixo.

A política externa indiana deve garantir um contínuo e elevado nível de relações com seus vizinhos, que com ela constituem a maior região do mundo. É previsível que, no início de seu governo, Modi se encaminhe a essa direção. Envolverde/IPS

* Shyam Saran, ex-secretário de Relações Exteriores da Índia, é presidente do Conselho Nacional de Segurança da Índia.