Nova York, Estados Unidos, 13/3/2015 – Milhares de mulheres em Bangladesh prepararam um futuro melhor para elas e suas famílias, e em parte o devem aos ovos de galinhas, ao abacaxi e a um pequeno empréstimo inicial. Desde 2009, a organização sem fins lucrativos Helen Keller International (HKI), que leva o nome de sua fundadora, a famosa escritora e ativista norte-americana cega e surda (1880-1968), supervisiona programas em Chittagong, no leste do Bangladesh, que capacitam as mulheres na agricultura para que produzam alimentos para suas famílias e para vender no mercado.
Kathy Spahn, presidente da HKI, afirmou que 20% das famílias de Chittagong passam fome, enquanto 50% das crianças têm crescimento e peso inferiores ao que deveriam ter em sua idade devido à má nutrição. Na região onde a organização trabalha, cerca de 75% da população sobrevive com apenas US$ 12 por mês.
“A região está estigmatizada e tem pouco acesso aos serviços de saúde”, apontou Spahn em um encontro realizado no dia 24 de fevereiro pela organização Microfinanças para o Avanço das Mulheres Nova York. “Estamos ensinando as mulheres a cultivar frutas e verduras nutritivas, criar frangos para carne e ovos e cultivar o suficiente para vender nos mercados e obter dinheiro adicional”, explicou.
O programa Mercados que Funcionam Para as Mulheres (M2W2) fornece o capital inicial e assessoria permanente. As mulheres de Chittagong, que antes eram vistas somente como donas de casa, recebem as ferramentas para cultivar produtos nutritivos, como espinafre e cenoura, para alimentar suas famílias, e outros mais lucrativos, como abacaxi e milho para a venda. As mulheres, que nunca tiveram controle sobre as finanças da família, de repente estão aportando sua própria renda para pagamento da educação e cuidados médicos.
Antes a HKI se dedicava a projetos exclusivamente vinculados à visão e à cegueira, mas agora inclui uma gama mais ampla de temas de saúde e nutrição, como a cegueira causada pela deficiência de vitamina A. Hoje a organização tem 180 programas em mais de 20 países da África e Ásia. “A HKI opera em Bangladesh desde 1978, trabalhando com a cegueira nutricional”, explicou Spahn à IPS.
“Chamamos o programa de ‘produção doméstica de alimentos melhorada’. Com isso vem a informação nutricional. Não se trata apenas de aumentar a renda delas, mas de conseguir que a educação as leve a uma vida mais saudável e mais produtiva”, acrescentou a presidente da HKI.
As mulheres se organizam em pequenos grupos coletivos para negociar e vender seus produtos da melhor maneira. Cada família produz uma quantidade muito pequena para que a venda individual seja efetiva, mas a soma de forças com outras mulheres implica que cada coletivo tem mais para vender.
“Queremos gerar sua capacidade nos negócios e no marketing. São capacitadas em pesquisa de mercado, demanda e contabilidade, e organizamos as famílias em grupos para que possam acumular seus produtos”, detalhou Spahn. Também é oferecido um plano de poupança global, que permite às mulheres colocar parte de sua renda em um fundo compartilhado ao qual todas as integrantes têm acesso para seus gastos maiores, como uma hospitalização ou substituição de máquina de envasar.
“Se alguma coisa quebra não podemos substituir porque isso não é sustentável. Isso tem a ver com o desenvolvimento, não com a caridade”, ressaltou Spahn. Em sua origem, o M2W2 foi um programa-piloto de três anos de duração que terminaria em 2012, mas uma injeção adicional de dinheiro por parte do governo britânico permitiu que continuasse até janeiro. “Buscamos mais apoio para seguir adiante”, disse a presidente da HKI. Os resultados do programa são grandes.
Spahn assegurou que, das 2.500 famílias envolvidas, a renda de “quase todas” aumentou 30%. “Quando começamos, todo mundo tinha um regime dietético ruim. Três anos depois, isso acabou”, ressaltou. Os ovos, rica fonte de vitamina A, ajudaram a reduzir a deficiência vitamínica e seus problemas derivados, mas o beneficio social foi maior do que o físico. “Outro resultado é que 90% das mulheres têm a capacidade de decisão absoluta sobre o dinheiro que geraram. Negociam com mais eficiência e se sentem mais empoderadas”, afirmou.
O empoderamento e a independência financeira das mulheres são um dos pilares ideológicos do Microfinanças para o Avanço das Mulheres Nova York. Danielle LeBlanc, uma das diretoras do grupo, disse que os microempréstimos e o empreendimento social são algumas das maneiras mais simples e eficazes para melhorar a situação econômica das mulheres privadas de seus direitos nos países mais pobres.
“Com a oportunidade de ter sua própria renda, ajudam as mulheres a obter certa independência e aumentar a sustentabilidade financeira de suas famílias”, afirmou LeBlanc. “Quando as mulheres receberam os ganhos desses empreendimentos, gastaram com suas famílias, enviando os filhos à escola, melhorando sua casa. O objetivo não é só ajudar a criar empresas, mas melhorar o bem-estar familiar”, destacou.
O termo microfinanciamento é um conceito amplo, visto de diferentes maneiras, explicou LeBlanc. Para os governos, trata-se de subvenções inferiores a US$ 50 mil, enquanto os bancos consideram que essa quantia é mais próxima dos US$ 250 mil. Porém, a ativista garante que se pode avançar muito com um desembolso inicial de umas poucas centenas de dólares.
“Nos Estados Unidos, o microfinanciamento poderia ajudar os vendedores ambulantes, como na cidade de Nova York, ou financiar creches ou mesmo pequenas empresas. No estrangeiro, os beneficiados poderiam ser os mais pobres, como as mulheres que vendem produtos ao lado da estrada, as agricultoras ou artesãs”, afirmou LeBlanc.
A diretora do grupo enfatizou que, “para nós, o aumento na renda de uma família nos países pobres pode parecer algo muito pequeno, mas implica uma grande diferença em suas vidas. Ajuda a aumentar a nutrição das crianças, melhora a posição da mulher na família, ou pode colocar um teto de zinco em uma casa que tem teto de palha”. Envolverde/IPS