Chihuahua, México, 9/7/2012 (IPS/Cimac) – Em um episódio de escravidão moderna, diaristas mexicanas que migram de suas comunidades indígenas no Estado de Chihuahua, trabalham até 13 horas por dia debaixo do Sol. Afetadas pela seca, milhares de mulheres – em sua maioria indígenas – procedentes da serra Tarahumara, no noroeste de Chihuahua e dos Estados de Hidalgo, Sonora, Veracruz, Guerrero e Durango, abandonam suas comunidades de origem para trabalhar em condições de exploração nos campos agrícolas do noroeste de Chihuahua.
A Secretaria de Defesa Social (Sedesol) informa que, desde maio de 2011, mais de 1,5 milhão de famílias foram afetadas em grande parte do país por fenômenos naturais como inundações e seca. A região mais prejudicada pela mudança climática no país é a serra Tarahumara, de onde foi expulso o maior número de famílias em busca de alimentos, afirma a Sedesol.
Os grupos populacionais que mais emigram em busca da sobrevivência são mulheres, crianças e adolescentes. Os adultos homens o fazem em menor porcentagem. De acordo com dados oficiais, a emigração maior dos habitantes de Chihuahua corresponde ao povo rarámuri, com cerca de 50 mil integrantes, que vivem em diferentes municípios da serra Tarahumara, uma cadeia de montanhas que integra a cordilheira Sierra Madre Ocidental. Quase a totalidade dos diaristas carece de atenção mínima, como assistência social, segundo uma pesquisa da Universidade Autônoma de Chihuahua (UACh).
A antropóloga Ana Loreley Servín explicou que os migrantes temporários rarámuris têm dois destinos preferenciais em Chihuahua: as cidades e as fazendas em áreas de agricultura intensiva. Os indígenas tarahumaras, como também são conhecidos os rarámuris, migram para conseguir um emprego temporário que lhes permita viver. Se chegam a ter um mau ano agrícola com colheitas insuficientes, como ocorreu este ano, a migração aumenta.
A mão de obra de homens e mulheres tarahumaras é de alta demanda nos cultivos agrícolas das diferentes regiões do Estado de Chihuahua, por sua disciplina e limpeza para trabalhar no campo, mas também por ignorarem seus direitos básicos, o que faz com que não lutem por eles com seus patrões. O sistema de pagamento mais comum é o por tarefa, isto é, paga-se de acordo com a quantidade de quilos que os “pizcadores” (coletadores) conseguem colher por dia, porque desta forma se consegue uma colheita mais rápida e efetiva. Assim, mulheres, homens e crianças indígenas contribuem para levantar a colheita e obtêm melhor renda familiar, segundo a quantidade de quilos que colhem por dia.
A região noroeste de Chihuahua – dedicada primordialmente ao cultivo da maçã – é a que mais diaristas, homens e mulheres, contrata. Segundo um estudo da UACh, são cerca de 25 mil diaristas que anualmente trabalham em áreas agrícolas do Estado, fronteiriço com os Estados Unidos. A delegação estatal da Sedesol registrou, em 2011, 14.020 diaristas, dos quais 6.564 eram mulheres e 7.456 homens. Como toda família costuma emigrar, também foi registrada a presença nos campos agrícolas de 6.695 meninos e meninas. A idade de 1.905 delas variava entre zero e cinco anos.
A impunidade com que muitos empresários produtores contratam os diaristas, por não seguirem a lei, ficou evidente no dia 3 de junho, quando 11 trabalhadores agrícolas morreram em um acidente automobilístico. Até agora, nenhuma família recebeu a indenização que lhes cabe legalmente. Uma família completa de origem indígena morreu quando regressava à comunidade de Yeguachique, município de Guachochi, em Tarahumara. Os integrantes dessa família eram Margarita Cruz Holguín, de 34 anos, seu marido Bernardino González Castillo, e os filhos deles: Ever e Flor Hidalí, de nove anos e três meses de idade, respectivamente. Nesse mesmo acidente outras 12 pessoas ficaram feridas, seis delas gravemente.
As vítimas tampouco receberam os cuidados que caberiam se estivessem registradas no Instituto Mexicano de Assistência Social, não contam com cobertura médica nem seguro para gastos funerários. Ainda se desconhece quem era o patrão dos diaristas, por isso o presidente municipal de Guachochi, Andrés Balleza Carreón, enviou uma pessoa para investigar. Porém, o dono da plantação de maçã do campo número 101 – no município de Cuauhtémoc, no centro do Estado – onde a família trabalhava não reconhece ter sido o patrão das vítimas. A família González Cruz trabalhou em condições de exploração por 18 dias no campo 101, sempre em jornadas que começam às cinco horas da manhã e terminam às seis da tarde, sob temperaturas superiores a 40 graus centígrados. Envolverde/IPS
* Este artigo foi publicado originalmente pela agência de notícias da organização mexicana Comunicação e Informação da Mulher AC, Cimac.