O boom do turismo nas praias e templos tailandeses trouxe riqueza e poluição. A primeira gerou renda enquanto a outra despertou a criatividade e solidariedade de alguns. Hoje, um turista pode optar por mergulhar de graça em recifes de corais da região desde que ajude a recolher o lixo do fundo do mar.
Depois de intensa campanha de incentivo ao turismo, iniciada na década de 1990, a Tailândia começa a fazer um balanço das bênçãos e dos contratempos gerados com a implementação da política de portas abertas. Bençãos porque, com 14,5 milhões de visitantes conhecendo suas praias e templos budistas todos os anos – dez milhões a mais do que o Brasil recebe -, o turismo incrementou uma economia combalida e se tornou fonte primária de receita para milhares de famílias que passaram a tirar o ganha-pão dos dólares e euros dos estrangeiros.
Contratempos, porque a falta de uma política sustentável e a filosofia “o país é uma empresa e eu sou o CEO”, do ex primeiro-ministro Thaksin Shinawatra, criou um cenário propício para a exploração sobretudo das paradisíacas regiões costeiras do Sul do país, resultando em danos ambientais como desmatamento de florestas nativas, falta d’água, encostas repletas de lixo, esgotos sem tratamento e a poluição do Mar de Adaman e do Golfo da Tailândia, este último um problema considerado particularmente sério pelos locais.
Ciente da urgência da situação, o Blacktip Diving & Watersports, um complexo que alia resort com centro de mergulho na pequena Ilha de Koh Tao, no Sudeste do país, resolveu partir para a ação e reescrever a história dessa Ilha, descoberta para o turismo em 1992, juntando mocinhos e bandidos, que, na Tailândia, muitas vezes, representam o mesmo personagem: os turistas.
A ideia é simples e tem se mostrado eficaz: os mesmos turistas dispostos a pagar até US$ 100 por um dia de mergulho com aluguel de equipamento, podem realizar a descida de graça se quiserem tirar a sujeira da praia de Ao Tanote, onde o resort está localizado, e do fundo do mar. “Começamos a realizar a limpeza da praia em 2000. No começo, limpávamos apenas quando a praia estava particularmente suja, como nos meses de alta estação ou após as chuvas de monção. Depois, passamos a realizar a limpeza duas vezes por mês”, explica a gerente do Blacktip Diving, Shalini Negi.
A limpeza do fundo do oceano começou na mesma época e de maneira esporádica e, atualmente, acontece todo último sábado de cada mês. Segundo Negi, o primeiro objetivo é salvar a vida marinha local, que confunde lixo com alimento. “O segundo objetivo é manter nosso paraíso bonito”, resume. Os voluntários já retiraram do fundo do mar objetos como vaso sanitário, rádio e até um sofá!
Recifes de corais
A preocupação com Koh Tao, ilha de apenas 25 km² que recebe uma média de 350 mil visitantes todos os anos, não acontece por acaso. É aqui que se concentra a maior família de corais de toda a Tailândia e o local é considerado um dos dez melhores pontos de mergulho do mundo, pela visibilidade e abundante vida marinha.
Nessa linha, o Blacktip, na esteira de um programa criado pelo Departamento Marinho e de Restauração Costeira de Chumphon (na Tailândia continental), desenvolveu seu próprio projeto de berçário de corais. Fragmentos de coral naturalmente quebrados por tempestades ou pela ação de mergulhadores e praticantes de snorkelling são recolhidos com a intenção de serem remontados em um novo recife. “Fragmentos tendem a morrer se ficarem soltos no fundo do mar. Juntamos estes organismos a estruturas de metal e concreto na esperança de que eles cresçam e construam novos recifes em áreas em que não existem. Também medimos seu crescimento e acompanhamos sua evolução”, diz o especialista. Outra boa empreitada que desenvolvem na região, ao lado da associação Save Koh Tao, é a de repopulação das tartarugas nas praias locais.
Ação replicada
Entre 2008 e 2010, o departamento marinho do Save Koh Tao aderiu à ideia da limpeza de praias e do oceano e, reunindo voluntários das diversas escolas de mergulho da Ilha, organizou 29 mutirões, muitas vezes reunindo mais de 150 mergulhadores. Ao final de cada ação, o lixo era separado e classificado. Por número de itens, produtos plásticos estão no topo da cadeia (29%). Por peso, os campeões são redes de pesca e cordas (50% do total de lixo encontrado). Itens como garrafas de vidro e pneus, que não chegam a representar ameaça, muitas vezes são deixados no fundo do mar para evitar danificar os corais no momento da remoção.
Em terra firme, o lixo também é motivo de grande preocupação, pois diariamente são depositadas seis toneladas no único depósito da Ilha, o que torna impossível, conforme Negi, transportá-lo para o continente. A Tailândia também carece de centros de reciclagem, o que joga a responsabilidade para os turistas e os locais de fazer o trabalho. Assim, ao visitar o local, ou qualquer outra reserva natural, tome cuidados mínimos como: evitar a produção de lixo e levar consigo uma sacolinha para carregar o seu e recolher algum outro que possa estar diante de seus olhos; deixe de usar canudinhos e beba direto no copo; passe protetor solar uma hora antes de entrar no mar para que dê tempo de o corpo absorver o produto e não contaminar a água e os corais.
* Publicado originalmente no site As Boas Novas.