Arquivo

Neonazistas europeus se voltam para o terrorismo

Praga, República Checa, 13/3/2012 – Poucos dias após um ataque com bomba contra um hotel da capital da República Checa, ao que parece de caráter racista, especialistas e ativistas alertaram para as campanhas “terroristas” de organizações neonazistas, que recebem uma maior influência dos movimentos de extrema direita de outros países. Organizações extremistas de países como Alemanha, Itália e Rússia oferecem aos movimentos checos inspiração operacional, organizacional e ideológica, e dão apoio em expressões de violência racial e estratégias para reunir apoio político.

“É um fato constatado que os partidos checos e alemães de ultradireita têm acordos de cooperação”, disse à IPS a conhecida ativista Gwendolyn Albert. “Os checos agora parecem seguir a tática alemã de contar com uma presença relativamente importante, ter partidos políticos registrados e organizar manifestações das quais participam os que estão comprometidos ideologicamente com a violência racista, com a intenção de cometer algum ato violento”, acrescentou a ativista. “O impacto dos vínculos ultranacionalistas e fascistas russos também podem ser vistos quando os manifestantes de ultradireita possuem uma organização paramilitar que enfrenta a polícia”, destacou Albert, que trabalha para a organização de educação e direitos humanos Romea Roma, vinculada do povo cigano.

O alerta foi dado no começo deste mês, quando o Ministério do Interior divulgou um informe sobre a extrema direita neste país, que aponta ser provável o aumento de ataques racistas nos próximos anos, em parte pela influência de organizações de extrema direita estrangeiras que usam a violência e o terrorismo, especialmente as da Rússia. Os grupos neonazistas russos estiveram envolvidos em campanhas terroristas, como ataques e assassinatos de juízes que teriam condenado fanáticos e ativistas de extrema direita. Algumas testemunhas especialistas em julgamentos semelhantes na República Checa disseram que enfrentaram ameaças e intimidações. De fato, no começo deste mês foi necessário adiar o julgamento contra um suspeito de ter cometido um ataque racista, por causa de uma ameaça de bomba.

Organizações neonazistas alemãs também têm antecedentes de terrorismo. Há pouco tempo, descobriu-se que uma célula alemã chamada Socialista Nacionalista Clandestina foi responsável pelo assassinato de nove imigrantes e um policial nos últimos seis anos, bem como de roubos a bancos e atentados a bomba. Além disto, ex-neonazistas alemães disseram que há uma forte cooperação entre grupos de extrema direita alemães e checos, e que os campos de treinamento de tiro para neonazistas de toda a Europa pertencem a organizações alemãs e estão em território checo.

O autor do informe do Ministério do Interior, Miroslav Mares, disse que os grupos de neonazistas têm cada vez mais armas. Conseguem armamento infiltrando-se na polícia e em serviços de segurança privados, o que lhes permite obter licença para porte de armas e, em alguns casos, receber treinamento em situações de combate. Um exemplo, de quanto esses grupos foram longe em matéria de se armarem, foi quando a imprensa informou que em uma manifestação de grupos de extrema direita havia participantes com explosivos exclusivos do exército. O temor de um aumento da violência racista se deu no contexto de problemas raciais ocorridos em áreas socialmente desfavorecidas do país.

No ano passado, houve protestos maciços e episódios violentos no distrito de Sluknov, norte da República Checa, após uma onda de ataques e crimes que os habitantes locais atribuíram à população cigana. Alguns analistas atribuíram o aumento da tensão às crescentes dificuldades econômicas. Observadores do racismo na Europa detectaram um aumento de sentimentos negativos contra os imigrantes e as minorias desde o começo da crise financeira em 2008. O informe do Ministério do Interior mencionou a degradação da situação econômica e o aumento da exclusão social como outros fatores do prognosticado aumento dos ataques racistas.

N o entanto, para o sociólogo Mares, o terreno fértil para a violência contra as minorias foi criado por algumas figuras políticas de destaque. “Vemos um aumento do racismo ‘comum’. Nas regiões socialmente conflitivas se percebe a participação da população local em manifestações contra os ciganos, e os neonazistas são o motor das atividades e dos preconceitos contra eles”, declarou à imprensa local. “Agora, ouve-se declarações racistas de dirigentes que não são de partidos extremistas. Alguns partidos tradicionais utilizam uma retórica contra os ciganos, que poderia ser um contexto para mais atividades violentas dos neonazistas”, alertou.

A extrema direita procura capitalizar o sentimento antiminoria. Na última década, a maior parte deste setor na República Checa fez um esforço para distanciar sua imagem da dos skinhead (cabeças raspadas) e se converter em uma alternativa política viável. O Partido Justiça Social dos Trabalhadores é a expressão política da extrema direita e se baseia especificamente em preconceitos contra a população cigana. Para os especialistas, os extremistas adotam táticas para conseguir seguidores mediante a promoção de sua rejeição – não apenas dos ciganos, mas dos imigrantes em geral – bem como outros assuntos controversos, como o casamento homossexual.

Organizações internacionais contra o racismo indicam que a situação só melhorará se os dirigentes políticos pregarem com o exemplo e forem aprovadas leis para fortalecer as ferramentas legais para dissuadir o racismo. Georgina Siklossy, oficial de imprensa da Rede Europeia Contra o Racismo, com sede em Bruxelas, explicou à IPS que “os políticos têm a principal e mais importante responsabilidade de não utilizar discursos de ódio, que possam incitar ataques racistas e contribuir para um sentimento contra os setores minoritários”, acrescentando que “as autoridades checas também podem utilizar medidas concretas para combater os grupos de extrema direita, como, por exemplo, assegurar leis que criminalizem o racismo”. Os programas de prevenção em escolas são essenciais se o desejo é mudar a situação, observou Mares.

Contudo, a comunidade cigana é pessimista. Houve uma série de ataques incendiários nos últimos anos contra esta comunidade. Um deles, em 2009, deixou uma menina de dois anos incapacitada para o resto da vida. E, nos últimos seis meses, houve 23 atentados racistas contra os ciganos, que deixaram três mortos. Emil Vorac, diretor de uma organização não governamental cigana que trabalha na cidade de As, onde no começo deste mês houve um ataque com bomba contra um hotel onde viviam membros dessa comunidade, afirmou que este tipo de ação era previsível. “Não me surpreendeu porque parece que o racismo e a xenofobia aumentam aqui e a situação piora. Esta é a minha experiência de trabalhar em vários comitês e comissões nesta região. Seus membros atuam como xenófobos em muitos casos”, ressaltou. Envolverde/IPS