É o ecologista favorito dos franceses, mas nem sempre foi o preferido entre os ecologistas. Contudo, esta semana, ficou claro que encarna a esperança de um sucesso histórico da ecologia na eleição de 2012 na França, iluminando a Europa e, quem sabe, o mundo.
Que a dimensão ecológica deixe de ser um acessório é o objetivo da campanha de Hulot. Independentemente de pertencer à esquerda ou à direita (ele que sempre teve a sua independência como sagrada). Em 2007, o ex-apresentador de 56 anos, convenceu os candidatos à presidência francesa a assinar, em público, um Pacto Ecológico. Não imaginou, porém, que a assinatura num papel, com a França como testemunha, não fosse suficiente para assumirem um compromisso. Contribuiu incontestavelmente para tornar os programas “mais verdes” de todos os candidatos – como nunca antes tinha acontecido – numa campanha presidencial. No seu espírito, foi o suficiente para se retirar. Foi também do que ele denomina de “uma etapa” que nasceu a sua candidatura às próximas eleições presidenciais, em 2012.
A Alemanha já deu o primeiro passo na vitória da ecologia, nas mais recentes eleições. Tratar-se-á de uma tendência futura na Europa? De qualquer modo, já em 2007 o contexto era favorável a Hulot: 52% dos franceses acreditavam que o ambiente deveria ser prioridade do futuro presidente da República – menos que o desemprego (80%), mas mais do que a insegurança (48%). Quanto à notoriedade de Hulot entre os gauleses, apenas 1% dos entrevistados declarou não conhecê-lo. Consideram-no simpático (90%), convincente (88%) e à escuta dos franceses (61%)[1]. Mais: o fato de ser candidato à Primária da Ecologia é um eco da perda de margem política por parte dos ecologistas que “pescaram” um candidato, até então apartidário. E que candidato!
“Não está ganho, mas também não está perdido”
Hulot – que se desloca em Paris em scooter eléctrico e é apaixonado por kidesurf – lançou-se há apenas um mês e meio na campanha. O que o leva a brincar, inclusive, com a sua recém-chegada face aos restantes candidatos, denominando-se de “estagiário em política”.
Se for eleito, as suas três primeiras prioridades, além da saída do nuclear, baseiam-se numa grande reforma da fiscalidade, outra da agricultura e uma última da democracia.
Sobre o modelo energético: prevê o desenvolvimento industrial das energias renováveis e destaca a fileira de eficiência energética, nomeadamente na habitação. Com uma consequência inegavelmente positiva: a criação de emprego (Hulot pretende que contribua com centenas de milhões de emprego, adicionando a reforma da agricultura).
A fiscalidade: em vez de sempre tributar o trabalho, propõe tributar o capital. Afirma-o, como sublinha, “sem ódio”. “Não promovo a luta de classes, contudo prefiro tributar as máquinas aos homens”, declara. Tributar o lucro, distribuir de forma justa o esforço, de modo a inverter a tendência de que “quem ganha mais é quem menos participa de forma solidária”.
Em relação à agricultura, sugere, por exemplo, que toda a restauração coletiva – que representa (na França) dois bilhões e meio de refeições por ano – recorra ao fornecimento de alimentos/produtos de qualidade, biológicos – ainda que haja outros selos/certificações – ou de proximidade (local).
Quanto à democracia… Hulot milita por uma mudança na República, nomeadamente por eleições mais proporcionais (representação de partidos). Adicionalmente, pretende que se promova de modo significativo a paridade e que o processo de referendo seja revisto. “Não sou a favor de um presidente onipresente em todos os casos. É necessário um árbitro com visão.”
Outro ponto mencionado no seu programa que revela o “avanço” nas suas propostas: o estatuto do animal. “Seria determinante que o código civil deixasse de tratar os animais como simples objetos. Sobre este assunto, acredito que há uma reforma a colocar em prática porque penso que é o nosso dever humano de atribuir um estatuto diferente ao animal.” Continua: “há que abandonar um certo número de práticas que não correspondem à ideia que tenho de civilização – como a caça e a tauromaquia – que fazem parte de práticas e tradições das quais nos deveríamos libertar.”
Lição número um: “não atacarás”
O candidato humanista deu a primeira lição de democracia aos restantes candidatos da Primária de Ecologia – Eva Joly, Henri Stoll e Stéphane Lhomme – enquanto discutiam economia, questões sociais, agricultura e biodiversidade. Após um debate em Toulouse, o confronto revelou-se entre os dois favoritos para representar os verdes: Eva Joly e Nicolas Hulot. A lição e a surpresa (neste contexto)? Em momento algum Hulot atacou qualquer dos candidatos. Ético e coerente, claro na apresentação do seu programa – não é à toa que é reconhecido como um exímio comunicador – evitou frases conjugadas na primeira pessoa. Ao inverso dos seus opositores… Estratégia a que, aliás, nenhum dos outros candidatos resistiu, disparando freneticamente sobre o passado político inexistente daquele a que os ecologistas “do partido” apelidam de “Rei da Com” (comunicação/mídia). A verdade é que a ecologia, assim representada pelos “seus” candidatos, foi beliscada. Enquanto Hulot pode orgulhar-se de ter presenteado o significado de “ecologia”, assim como o de “democracia, com um novo fôlego. A confirmá-lo: as palmas na sala, assim como os elogios rasgados em diversos sites e mídia.
Sociedade civil: presente
Outro ponto positivo e pouco comum: a frequência e a forma da promoção de debates com a sociedade civil. Hulot disponibilizou-se não apenas em salas para debates, como em meios de destaque na mídia, apoiando também uma mídia menos representativa. Inclusive, no prazo de uma semana, diversos cidadãos tiveram oportunidade de colocar-lhe questões diretamente, com respostas via twitter, no decorrer de chats, e em vídeo. Entre mais de 500 questões colocadas, uma seleção de um dezena (as mais votadas) mereceram um vídeo com feedback do candidato: a mídia social a favor da democracia e do diálogo com a sociedade civil…
Para já, os candidatos têm menos de 15 dias para convencer (para a Primária da Ecologia). Vota-se entre 23 e 24 de junho e apuram-se os resultados no dia 29, antes do segundo turno até 12 de julho, caso nenhum dos candidatos obtenha 50% dos votos. O partido, que contava com oito mil militantes em 2009, conta – há menos de um mês – com 15 mil… Mesmo se os sinais apontam para uma vitória histórica, Nicolas Hulot reconhece já ser um sucesso se a campanha tiver o mérito de trazer valor acrescentado aos debates com propostas de soluções…
* Sandrine Lage é MSc Design for Sustainability (Cranfield, Reino Unido), autora do livro sustentabilidade na mídia: o poder de (in)formar, Envolverde, 2009, e pesquisadora.