Muitos podem pensar que sonhos e ideias são menos importantes que as práticas, mas não devemos acreditar nisso. Sem os sonhos e as ideias, as boas práticas dificilmente acontecem, pois são eles que nos motivam a romper com a inércia e acreditar que o mundo e nós próprios podemos ser melhores e que vale a pena mudar e lutar por isso. Não é exatamente a cor da verdade que importa, pois qualquer uma serve desde que nos motive a querer ser melhor, a lutar para deixar este mundo melhor do que encontramos para os que virão depois de nós. Se a sua verdade não consegue dar sentido e significado ao seu mundo, não consegue dar as respostas que você procura para suas questões existenciais, então não existe o menor problema em mudar de verdade. Não temos de nos envergonhar de mudar, mas devemos nos envergonhar, sim, de sermos intolerantes com os que pensam diferente de nós, ou de não ter ideias para mudar, ou de achar que só as nossas verdades é que são as únicas verdadeiras e que todos os outros estão errados.
Provavelmente, a maioria de nós acreditou em coelhos que botavam ovos de chocolate e Papai Noel que não se esquecia de ninguém! Quando éramos pequenos, essas fantasias cabiam nos nossos sonhos e, à medida que crescemos, nos livramos delas, sem traumas. Hoje, milhares de crianças renovam suas esperanças nas mesmas fantasias, e seus olhinhos ainda brilham e se enchem de alegria quando as promessas se materializam em presentes. Para elas, o mistério faz parte do encantamento da própria vida. Em certas circunstâncias, pode ser mais interessante as mentiras sinceras que as duras inconveniências da verdade. Por mais especiais, ricos ou importantes que sejamos, nenhum de nós escapará vivo do planeta e a vida é curta.
Entretanto, nem toda ideia ou verdade é inócua ou promove o encantamento. Algumas podem ser bem perigosas, pois podem criar uma falsa ilusão e nos conduzir ao abismo ao invés de nos afastar dele. Por exemplo, a ideia de que somos separados da natureza nos conduziu ao abismo de um possível colapso ambiental global, pois como consequência, nos deu a ilusão de sermos os donos da natureza, como se pudéssemos fazer com ela o que quiséssemos em nome de nosso progresso, como se o planeta é uma fonte inesgotável de recursos e que tivesse uma capacidade também inesgotável de receber os nossos restos. O agravamento das mudanças climáticas, a extinção maciça de espécies, a exploração dos ecossistemas além da capacidade de regeneração natural, a fome, a miséria, a violência mostraram claramente o quanto estas ideias nos enganaram. Precisamos mudar de ideia, nos estimular a novas práticas, que promovam a sustentabilidade, o consumo responsável, a pegada ecológica mais leve, a noção de que a vida é em rede, e que não somos nós que tecemos esta rede da qual somos apenas um dos fios.
Estamos assistindo ao crescimento da consciência ambiental na sociedade e parece que já tomamos o rumo irreversível da sustentabilidade, entretanto, estamos só iniciando a jornada, e muitos dos que estão comprometidos com o antigo modelo, beneficiando-se de vantagens e benefícios, tentarão nos iludir com falsas informações e falsas promessas.
* Vilmar Sidnei Demamam Berna é escritor e jornalista, fundou a Rebia – Rede Brasileira de Informação Ambiental e edita, desde janeiro de 1996, a Revista do Meio Ambiente (que substituiu o Jornal do Meio Ambiente) e o Portal do Meio Ambiente. Em 1999, recebeu no Japão o Prêmio Global 500 da ONU para o Meio Ambiente e, em 2003, o Prêmio Verde das Américas.