Wazzin, Líbia, 25/8/2011 – “Tenho 60 anos e nunca pensei que veria este momento”, disse Najib Taghuz à IPS neste povoado a 300 metros de altura sobre o deserto da Líbia, na fronteira com a Tunísia. Este engenheiro da cidade de Gehryan, agora nas mãos dos rebeldes, se dirige ao país vizinho por um problema de saúde de sua mulher, mas espera encontrar-se com um novo Estado ao regressar. “Quando Gadafi cair a Líbia poderá dizer que finalmente entrou no Século 21”, disse Taghuz, para perguntar em seguida se poderá entrar na Tunísia com uma lembrança que encontrou pelo caminho: a carcaça de um míssil antitanque. “De fato, preciso levá-lo como recordação”, afirmou.
Muammar Gadafi manteve fechada, até há poucos dias, a fronteira norte com a Tunísia. A única forma de ir e vir de um país a outro era pelo sul, controlado pelos rebeldes. O posto de Dehiba-Wazzin, tomado por eles em abril, foi um ponto vital para a entrada de suprimentos através das montanhas de Nafusa. Sem avanços nas frentes de combate de Brega e Misurata durante vários meses, o papel da população da montanha foi vital para acelerar o avanço rebelde rumo a Trípoli.
A atividade na fronteira é intensa. Mas o alvoroço dos refugiados que regressam ao seu país contrasta com a tristeza dos que continuam obrigados a abandonar a Líbia. “Não nos sentíamos seguros em Trípoli por isso viemos de carro até aqui”, disse Hassan Harem, à IPS. “A situação nos últimos meses foi terrível com o constante bombardeio dos aviões da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), sem combustível e frequentemente sem comida. Com tudo o que passamos, nos demos conta de que já não podíamos tolerar os combates na rua”, acrescentou Harem, que há dois meses deixou seu trabalho. Este homem, de 32 anos, acredita que com sorte poderá voltar em alguns dias.
Os líbios não são os únicos que fogem pela fronteira do sul. Kadir Harthem, oftalmologista egípcio, é um entre muitos trabalhadores que esperam ser retirados por mar. “Alguns colegas disseram que iam partir de barco. Quando vi a possibilidade de fazer o mesmo, peguei o carro e vim para cá”, contou. Após sete anos trabalhando em Trípoli, Harthem espera conseguir trabalho no Cairo.
Os trâmites na aduana da Tunísia demoram e são enfadonhos, ao contrário do que acontece do outro lado da fronteira, controlado pelos rebeldes líbios. Estes não exigem preenchimento de formulários nem revistam bagagens. O funcionário encarregado registra a informação do passaporte em uma base de dados e, pronto, já se está na Líbia. A pouco menos de cinco quilômetros da disputada fronteira com a Tunísia fica o povoado de Wazzin, um dos que mais sofreu neste reduto de pedra os embates das forças de Gadafi, que o deixaram em ruína.
Há três meses, a IPS não podia encontrar nenhum morador para entrevistar. Mas desde que a Otan bombardeou Ghezaia, de onde as forças de Gadafi lançavam foguetes contra Wazzin, as pessoas começaram a regressar e reconstruir suas casas.
Três combatentes rebeldes seguem os acontecimentos de Trípoli pela televisão aberta no posto de controle de Nalut, a 80 quilômetros da fronteira. “Ao expulsarmos homens leais a Gadafi de suas bases no deserto há duas semanas pudemos restabelecer a eletricidade. Vamos demorar sete dias para reparar toda a rede, mas a eletricidade chegou para ficar”, disse à IPS, sorridente, um dos combatentes, usando a camiseta do Barcelona e um gorro com a bandeira rebelde.
Agosto é o mês sagrado do Ramadã para os muçulmanos. Após o pôr do sol e das orações, guerrilheiros e civis se reúnem na praça principal onde a Cruz Vermelha oferece uma ceia gratuita. Um dos combatentes, Akram, disse que devolverá seu fuzil o mais rápido possível e reabrirá sua loja de alimentos. “Tenho 40 anos, dois a menos que o regime de Gadafi. Não conheço outra forma de governo. Sempre me perguntei como seria a democracia e quanto teríamos que esperar para tê-la na Líbia”, afirmou. Envolverde/IPS