Arquivo

O arroz que renasceu dos escombros

Tóquio, Japão, 28/5/2012 – Um pequeno arrozal, destruído pelo terremoto e pelo tsunami do ano passado no Japão, deu nesta primavera a melhor colheita de sua história e, de passagem, trouxe alegria e esperança à devastada comunidade de Minami Sanriku. O chamam, com razão, de “arroz do renascimento”. É o resultado do esforço coletivo de produtores e moradores desta comunidade do nordeste, que se associaram para promover a agricultura sustentável.

Os arrozais recuperados em algumas das áreas mais prejudicadas pelo desastre de 11 de março de 2011 se converteram em exemplos de reabilitação diante da devastação geral que continua apresentando a costa do nordeste do Japão, afirmam ecologistas. “A surpreendente façanha de recuperar uma plantação arrasada pelo tsunami foi conseguida com a restauração do ecossistema à sua volta. As novas tecnologias que dependem de grandes máquinas ou de muito dinheiro nem sempre dão as melhores respostas”, explicou Shigeki Iwabuchi, porta-voz da Rede de Arrozais do Japão.

Um destes arrozais simbólicos pertence à escola secundária Ouya, em Minami Sanriku. Durante dez anos seus estudantes cultivaram uma área de dez mil metros quadrados para estudar a plantação tradicional deste grão em um clima frio como o da área de Tohoku. O método consistia em inundar o terreno com água doce durante o inverno, para fertilizá-lo, e plantar na primavera, uma prática quase em desuso no Japão. Mas, chegou o tsunami. Suas ondas de 15 metros de altura arrasaram as plantações, saturaram o solo de sal e o cobriram de escombros. A esperança desapareceu debaixo da água.

“Entretanto, no inverno passado os estudantes começaram a dizer que queriam retomar o cultivo de arroz. Assim, decidimos formar uma associação de voluntários e especialistas para fazer o que parecia impossível em meio à devastação que nos cercava: limpar a área e começar a plantar de novo”, contou o diretor da escola, Yoshinori Uesugi. Esta decisão apresentou resultados surpreendentes. Este ano foi colhida mais de uma tonelada de arroz, superando os rendimentos que o arrozal dera no passado.

Iwabuchi, também natural da região de Tohoku e especialista em preservação de pântanos, liderou uma equipe integrada por especialistas em agricultura, produtores locais e voluntários que chegaram inclusive vindos de Tóquio para participar do esforço que marcou uma mudança radical com relação aos planos oficiais de recuperação.

A salinização de milhares de hectares “de terras agrícolas e florestas costeiras destruídos foi um dos maiores obstáculos deixados pelo tsunami”, contou Iwabuchi. “Contudo, ao recriar o solo fértil em pequenos arrozais mediante a simples dessalinização, revivemos um conhecimento que havíamos ignorado até agora: as sociedades locais sempre dependeram dos ecossistemas para seu sustento”, acrescentou.

Para o projeto Renascimento Verde de Tohoku, o primeiro passo de Iwabuchi e sua equipe de pesquisadores universitários, empresários e organizações ambientalistas foi limpar os ecossistemas afetados. O governo forneceu grande quantidade de água doce, usada para diluir o sal da terra. Com a limpeza de mananciais, riachos e pântanos, o projeto se dedicou a obter um fornecimento hídrico sustentável, em lugar de depender do destruído sistema de tubulações até então usado.

Em contraste com o processo oficial de limpeza organizado pelo governo, que utiliza maquinaria pesada, a equipe de Iwabuchi retirou os escombros com as mãos, inclusive as carcaças de automóveis abandonados. “Não usamos máquinas pesadas porque teriam danificado a valiosa estrutura do solo. Para a dessalinização começamos inundando os arrozais com água de mananciais e rios locais que já estavam limpos”, acrescentou.

Em janeiro deste ano, a equipe detectou a presença de insetos e outros organismos vivos no solo, um bem-vindo sinal de biodiversidade. Ainda mais importante foi descobrir, em uma área de Kesennuma, que o tsunami trouxera consigo uma lama rica em diversos organismos e substratos. Este tipo de iniciativa também gera benefícios econômicos. Parte da venda do arroz cultivado nas plantações inundadas no inverno foi doada aos agricultores que haviam perdido suas terras. Valendo-se do sucesso do projeto, seus responsáveis incentivam a adoção de práticas agrícolas sustentáveis para ajudar Tohoku a se recuperar.

Embora o “arroz do renascimento” só tenha sido provado em áreas pequenas, o desastre no leste do Japão deixou evidente que as medidas sustentáveis de adaptação e recuperação oferecem as melhores possibilidades de sobrevivência. “O Japão moderno foi construído sobre as faixas costeiras, partindo da base de que a tecnologia podia nos salvar, mas esta ideia se mostrou equivocada”, concluiu Iwabuchi. Envolverde/IPS