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O bom, o mau e o feio da imprensa na África

Pansy Tlakula. Foto: Cortesia CADHP

Johannesburgo, África do Sul, 7/11/2012 – Pansy Tlakula, relatora especial da União Africana (UA) sobre Liberdade de Expressão e Acesso à Informação, dá o melhor de si para combater o assédio que sofrem os jornalistas em muitos países deste continente. Como representante da Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos (CADHP), Tlakula em várias ocasiões pediu ao governo de Gâmbia que respeite o direito do povo à liberdade de expressão.

“Enviei várias cartas ao governo em relação às últimas prisões de jornalistas. Agora estão fartos das minhas cartas. Fazemos todo o possível para ressaltar o tema em Gâmbia e outros países africanos”, disse à IPS. Contudo, não é suficiente para frear a repressão do governo gambiano aos meios de comunicação.

Em setembro, o regime de Yahya Jammeh prendeu dois jornalistas e fechou seus respectivos jornais. The Standard e The Daily News, pois informavam extensamente sobre a oposição à execução de nove condenados à morte. Em junho, foi preso Amadou Scattred Janneh, ex-ministro de Informação e Comunicações, junto com outras três pessoas, por ter imprimido e distribuído camisetas pedindo o fim da ditadura.

Janneh, que também é cidadão dos Estados Unidos, foi acusado de traição e condenado à prisão perpétua, mas recuperou a liberdade após a intervenção do pastor batista e ativista pelos direitos humanos norte-americano Jesse Jackson. Tlakula contou que a CADHP levou o caso de Janneh à Comissão Econômica de Estados da África Ocidental. “Porém, lamentavelmente, Gâmbia não ratificou o protocolo que deu à luz ao Tribunal Africano sobre Direitos Humanos e dos Povos, e não podemos levar o caso a essa instância”, pontuou.

Entretanto, esse fracasso não deteve o entusiasmo de Tlakula em garantir a liberdade de imprensa no continente. Ela acaba de dar um passo sem precedentes ao instruir os governos africanos a criar órgãos regulatórios de imprensa independentes, destacando que os governos e os políticos não devem interferir. Tlakula, ex-integrante da Comissão Sul-Africana de Direitos Humanos e atual presidente da Comissão Eleitoral Independente desse país, afirma que as leis africanas devem garantir as condições ótimas para que os jornalistas exerçam livremente seu trabalho.

IPS: Que papel devem desempenhar os jornalistas na África?

PANSY TLAKULA: Devem expor a corrupção, a atividade criminosa e todas as coisas ruins que acontecem no continente, mas também as boas, porque este é o nosso lar. Não podemos apenas expor ao mundo o que de ruim acontece na África. Temos que tomar o destino em nossas mãos e contar nossas próprias histórias, da forma como nós, africanos, as vemos e experimentamos, e não deixar que outras pessoas contém nossas histórias.

IPS: Vários países na África ainda carecem de leis que defendam o direito à informação. Como se pode promover um acesso justo a informação em todo o continente?

PT: Pressionamos um pouco. Desenvolvemos um modelo de acesso a informação na África. iniciamos o processo em cinco países, e agora temos dez que adotaram leis a respeito. E mais de uma dezena de nações agora têm projetos de lei sobre o tema em seus parlamentos. Esperamos que este modelo impulsione esse tipo de iniciativa, porque sentimos que não devemos nos limitar a criticar os países, mas em ajudá-los para que garantam a liberdade de expressão. Sem o direito à informação, todas as demais coisas não podem se concretizar.

IPS: O Zimbábue teve uma reputação ruim em matéria de liberdade de imprensa no passado. Agora está redigindo uma nova Constituição. Qual seu conselho para esse país?

PT: A nova Constituição não resolverá todos os problemas. Mesmo depois de entrar em vigor, ainda será preciso enfrentar as leis que impedem a livre expressão, como a Lei de Informação e Proteção da Privacidade, a Lei de Ordem Pública e Segurança, e todas as legislações que não estão em conformidade com os instrumentos regionais e internacionais que o Zimbábue ratificou. Essas leis continuam sendo fonte de preocupação para nós, mas esperamos que sua constitucionalidade seja revista. Uma vez adotada a nova Constituição, essas leis deverão ser revisadas ou revogadas. Se isso não ocorrer, então poderão ser impugnadas nos tribunais. A nova Constituição é um passo na direção correta.

IPS: Estão conseguindo algum progresso em relação à liberdade de imprensa no continente?

PT: Sim, estamos fazendo progressos ao estimularmos alguns países a adotarem leis que promovem a liberdade de imprensa. Agora temos uma campanha contra as leis de difamação. A primeira fase desta campanha tem o objetivo de identificar onde estão presentes essas leis, porque onde existem geram um efeito amedrontador na expressão. Estamos testando esta campanha primeiro em Zâmbia e Botswana.

IPS: Como enfrentam os argumentos cada vez mais usados por alguns países de que sua resistência em permitir a liberdade de expressão se deve a motivos de segurança nacional?

PT: Isto realça a necessidade de marcar claramente uma linha para fazer com que a informação esteja disponível e acessível de forma que não comprometa a segurança nacional. É um grande tema, e tentamos apresentar diretrizes sobre o acesso a informação e a segurança nacional. É um assunto que preocupa todo o mundo, e se está trabalhando nele.

IPS: O que diz da decisão do presidente sul-africano, Jacob Zuma, de retirar sua queixa contra o jornalista e caricaturista Jonathan Zapiro, que o desenhou tentando violar uma mulher?

PT: Estou muito, muito contente. É uma vitória para a liberdade de expressão e para o jornalismo na África. Envolverde/IPS