O desafio de alimentar 7 bilhões de pessoas

Frear o ritmo do crescimento é uma necessidade urgente.

A Organização das Nações Unidas anunciou que a população mundial atingiu nesta semana a marca de 7 bilhões, apenas 12 anos depois de ter atingido o nível de 6 bilhões. E, se as projeções da ONU estiverem certas, a população mundial alcançará 8 bilhões em apenas 13 anos e chegará a 9,3 bilhões em meados do século.

A grande questão é se a humanidade está ficando grande demais e, no processo, colocando em risco o bem-estar das pessoas, a posteridade e o planeta. A Global Footprint Network adverte que a humanidade já vive além da capacidade da Terra de regenerar recursos naturais, e até 2050 precisaremos de dois planetas para acompanhar o crescimento da população e o aumento do consumo. A boa nova, porém, é que, se dermos os passos certos, o crescimento populacional não precisa ser tão acelerado como afirmam as projeções. Reduzir o crescimento populacional precisa ser uma necessidade urgente de todas as nações. Aliás, há amplas evidências sugerindo que a humanidade já está exercendo uma pressão excessiva no meio ambiente mundial. As temperaturas em elevação e a crescente frequência de condições climáticas severas sugerem que podemos estar alterando o clima terrestre. Além disso há o esgotamento da pesca oceânica, a regressão contínua dos níveis dos mares, a desertificação e a rápida taxa de extinção de espécies. Fica óbvio que estamos flertando com um desastre ambiental.

Podemos estar chegando aos limites do crescimento econômico. Nos 12 anos desde que atingimos a marca de 6 bilhões, o preço do petróleo subiu de pouco mais de US$ 10 o barril para quase US$ 100 o barril. Além disso, o preço dos cereais e outros alimentos básicos mais que dobrou nos últimos sete anos, contribuindo para grandes retrocessos nas lutas contra a fome e a pobreza extrema. Com quase 1 bilhão de pessoas famintas no mundo, crescem os temores de que a produção de alimentos talvez não seja capaz de acompanhar o projetado crescimento da população.

A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) afirma que a produção de alimentos nos países em desenvolvimento terá de dobrar nos próximos 39 anos para acompanhar o crescimento demográfico. Para isso, os agricultores desses países terão de superar vários obstáculos, incluindo os custos crescentes de combustíveis e fertilizantes, temperaturas mais altas, mais enchentes e secas recordes, perda de solo superficial e a competição da urbanização e dos biocombustíveis pelas terras aráveis.

Mas não estamos condenados, e pelas seguintes razões.

Não custa trilhões de dólares ampliar as opções de planejamento familiar para mulheres em países em desenvolvimento. A ONU calcula que há 215 milhões de mulheres no mundo em desenvolvimento que querem evitar a gravidez, mas não estão usando um método eficaz de controle de natalidade. A ONU calcula que dar a elas acesso a contraceptivos custaria US$ 3,5 bilhões adicionais por ano – uma fração dos US$ 125 bilhões que os EUA e outros países doadores gastam anualmente para ajudar países em desenvolvimento.

A falta de acesso a contraceptivos, porém, é apenas uma das razões pelas quais as mulheres não conseguem evitar a gravidez em países em desenvolvimento. O maior desafio é retardar a idade de casamento.

Casamentos infantis levam à gravidez prematura e perigosa e a elevadas taxas de natalidade. Espantosamente, uma média de 25 mil meninas por dia se tornam noivas crianças. No Iêmen rural, por exemplo, as meninas com frequência são levadas ao casamento com 9 ou 10 anos. É por isso que um grupo de ex-presidentes e líderes mundiais, denominado The Elders (os anciãos), lançou a campanha internacional “Girls Not Brides” (garotas, não noivas) para acabar com a prática de noivas crianças mediante parcerias com organizações humanitárias e não governamentais de todo o mundo.

O casamento infantil já é ilegal na maioria dos países. São urgentemente necessários programas que façam valer a pena para os pais manter suas meninas na escola. O Programa Mundial de Alimentação da ONU, por exemplo, fornece merenda escolar para meninas, e, em alguns casos, permite que a comida seja levada para casa.

Há também estratégias comprovadas de baixo custo para mudar normas sociais. Esforços direcionados para pôr fim a práticas perniciosas como o enfaixamento dos pés na China e a mutilação genital feminina no Senegal foram bem-sucedidos. Da mesma forma, com a promoção de modelos exemplares dos benefícios trazidos por famílias menores e pelo retardamento do casamento, programas de entretenimento conseguiram resultados transformadores em países como México e Brasil. Hoje, novelas de rádio que atingem povoados remotos em países de desenvolvimento pobres podem informar as mulheres sobre opções de planejamento familiar e melhorar atitudes e comportamentos.

Combinadas com informações e serviços de planejamento familiar, essas campanhas de educação e mudança social podem ajudar a baixar as taxas de natalidade, diminuir a mortalidade materna e infantil, potencializar mulheres, fortalecer a segurança alimentar, melhorar as perspectivas econômicas, e ajudar o meio ambiente. Alguns argumentaram que, por causa de taxas de natalidade declinantes, os temores com o crescimento populacional são coisa do passado. Mas atingir a marca de 7 bilhões não é razão para se “estourar champanhe”, como um comentarista sugeriu.

Num mundo às voltas com mudanças climáticas e aumento nos preços de energia e alimentos, subestimamos o impacto do crescimento populacional por nossa conta e risco. Mas esse não é um desafio insuperável e enfrentá-lo se constitui num projeto em que todos ganham: as pessoas, a posteridade e o planeta.

Tradução: Celso Paciornik.

* Robert J. Walker é vice-presidente executivo do Population Institute, organização sem fins lucrativos que se empenha por uma população mundial que possa viver em harmonia com o planeta.

** Publicado originalmente pelo jornal O Estado de São Paulo.