Produtos que não têm mais valor para uma pessoa podem ser de grande serventia para outras. Fazer essa conexão é o papel do aplicativo para Facebook Dois Camelos. Ele possibilita que pessoas de todo o Brasil realizem a troca de objetos e é um exemplo de sucesso do consumo consciente e colaborativo

A troca é uma das formas mais primitivas que o ser humano encontrou para obter itens que pertenciam a outras pessoas. O ato de oferecer a alguém algo que você possui, em troca de algo que a outra pessoa tem, era conhecido como escambo e foi um sistema utilizado durante séculos. Com o passar do tempo, a sociedade criou novas formas de estabelecer essas trocas. Diversos artigos foram utilizados como representação financeira de bens, como o chocolate entre os astecas, o bacalhau seco entre os noruegueses da Idade Média e mulheres escravizadas entre os antigos irlandeses. A criação de uma moeda metálica com um valor padronizado pelo Estado veio somente no Século 7 a.C., na civilização grega. Desde então, o hábito de realizar trocas se restringiu às esferas mais íntimas de relacionamento e tornou-se raro que pessoas troquem objetos com desconhecidos.

Porém, alguns movimentos vêm andando na contramão dessa tendência e buscam ressuscitar esse antigo costume, que, além de combater o consumo desenfreado, ainda aproxima as pessoas. É o caso do aplicativo (app) para Facebook Dois Camelos, criado em 2010 pela arquiteta Fernanda Athayde. Assustada com o desperdício que via acontecer em sua própria casa, ela se lembrou das trocas que já fazia com suas primas e irmãs e decidiu levar isso para o ambiente virtual. “Percebi que as trocas poderiam acontecer em um ambiente de rede, com pessoas de qualquer lugar”, conta Fernanda. O passo seguinte foi criar um nome. “Lembrei de um amigo que voltou do Marrocos contando que haviam oferecido 20 camelos por sua esposa. Daí surgiu Dois Camelos”, relata.

O sistema, que hoje já possui quase 50 mil usuários cadastrados, permite que o internauta anuncie os produtos que quer trocar. Os anúncios podem ser visualizados pelos demais usuários. É possível filtrar a busca de objetos de acordo com os interesses de cada pessoa. “O usuário cadastra seus produtos e sua localidade. Por meio do cruzamento de dados, conseguimos encontrar o que a pessoa está precisando perto de sua localidade. Indicamos Pontos Verdes nas cidades, que são bons lugares para um ponto de encontro de troca. Os internautas marcam o encontro pela rede ou podem também fazer a troca utilizando o correio”, explica a arquiteta.

Atualmente o aplicativo possui cerca de cinco mil produtos cadastrados. É possível trocar desde livros e itens alimentícios, até esteiras ergométricas e celulares. Entre os itens mais exóticos que aguardam um interessado estão um Mercedes conversível antigo, bancos de carro e coleções de discos de vinil. “São muitos produtos, então sempre aparecem coisas inusitadas”, relata a idealizadora do app.

Fernanda conta que ela mesma é um exemplo de que a troca pode trazer mais do que benefícios financeiros. “Cadastrei uma bicicleta infantil que meus filhos não usavam mais e estava na garagem há algum tempo. Uma moça entrou em contato dizendo que tinha interesse. Como ela viu que eu fazia coleção de camisetas de corrida de rua, logo ofereceu 20 camisetas novas. Marcamos de trocar e não poderia ter sido melhor. No dia seguinte da troca ela me ligou dizendo que sua filha tinha dormido com a bicicleta de tão feliz que estava. Além da troca, conheci pessoas bacanas e acabei fazendo uma amizade”, comenta.

O aplicativo possui hoje uma nova versão elaborada, pronta para entrar no ar. Mas, para Fernanda, o projeto já é um sucesso. “Atingimos muito mais pessoas do que poderíamos imaginar em um ano e três meses. Além de conseguirmos chamar a atenção para a ideia do consumo consciente e colaborativo, que é nosso maior objetivo. Este ainda é um conceito muito novo, principalmente para os brasileiros”, enfatiza.

O Dois Camelos vai agora crescer e migrar para outros ares. “Recentemente fomos contatados por uma empresa de tecnologia em Waterloo, no Canadá. Lá é o Vale do Silicio canadense. Esta empresa nos chamou para sermos incubados e desenvolvidos por eles. Provavelmente no início do próximo ano estaremos embarcando para lá!”, comemora a arquiteta. (Envolverde)