As lâmpadas, os computadores e seus programas, os automóveis e todos os bens “duráveis” das nossas vidas são criados para que durem cada vez menos e, assim, consigam mover o mundo capitalista.
Em 1979, fui aos Estados Unidos da América, convidado pelo Departamento de Estado (era o mandato presidencial de Jimmy Carter) em um programa de visitas a jornais e instituições americanas. Em Westbrook, no Maine, onde cumpri um dia de trabalho em companhia do mayor, o que vem a ser o nosso prefeito municipal, fomos a uma fábrica de celulose que não fedia nem ofendia as águas e os peixes do rio que corria por baixo dela. Lá, o que mais me chamou a atenção foi uma máquina cuja data de inauguração estava estampada em um de seus pedestais: 1876, se não me falha a memória.
Perguntei ao mayor qual a razão de uma traquitana tão antiga ainda funcionar, em uma fábrica tão grande e tão moderna. “Tem mais de cem anos que ela trabalha de graça para nós”, foi a resposta. Isso queria dizer que os custos haviam sido amortizados há muito tempo e que as despesas de manutenção eram tão baixas que justificavam o seu funcionamento. Salvo algum equívoco de informação, a velha máquina deve estar funcionando até hoje. As lâmpadas elétricas inventadas por Thomaz Edison também. Houve uma cujos filamentos foram desenvolvidos para durar cem mil horas (acesos).
Um cartel criado em 1925 na Holanda e na Alemanha tratou de programar as lâmpadas incandescentes para 1.500 horas. Não deixou de ser uma ocupação para os maridos habilidosos, vigorosos para fazer filhos e evidentemente azeitar fendas e dobradiças, bem como, ora bolas, trocar lâmpadas. A “obsolescência programada” que existia empiricamente desde o Século 18, quando os ingleses obraram a “revolução industrial”, entrou em pauta definitiva, pois, entre as duas grandes guerras do Século 20. O mundo passou a ser uma espécie do que viria a ser São Paulo: “não pode parar”!
Até o dia em que entrar em obsolescência inexorável, como a bizarra cantora Lady Gaga, que algumas empresas indicam como modelo de “renovação programada”, isto é, produto de “modernizão” constante. Confesso que fiquei velho para acompanhar qualquer vanguarda, mas mesmo em meu tempo de agitação e propaganda, quando sonhava em mudar o mundo, os relógios marcavam eficientemente as horas sem necessidade de uma bateria que conspurcará a terra. Guardo de lembrança um relógio de parede alemão fabricado em 1890. Ele é muito simples e não entra em parafuso como esses chineses que desembestam e batem as horas que querem, quando querem.
Por favor, não me tenham em conta de saudosista, com toda a autoestima que posso ter em relação ao que fiz ou deixei de fazer. Sou contrário às lâmpadas elétricas que duram menos do que poderiam, ou os computadores e seus programas criados pelo tocador de realejos Bill Gates ou seus concorrentes. Sou contra as impressoras infernéticas que custam menos do que os tinteiros que usam e são programados para despejar em um depósito o excesso de tinta destinado ao matricídio. Enfim, sou contra todos os produtos criados para que durem cada vez menos e possam mover o mundo capitalista. Mas não quero dinamitar a ilha de Manhattan, como cantou o poeta Carlos Drummond de Andrade e tentou o equivocado Osama bin Laden. Alguém de bom senso e liderança haverá de convocar as pessoas sinceras engajadas em uma terra autossustentada, dando o primeiro passo na luta contra a obsolescência programada!
* Claudio Lachini é jornalista e escritor.
** Publicado originalmente no site Economia Interativa.