Cabul, Afeganistão, 21/8/2012 – Nematullah Wardak trabalha em Cabul e há dois anos não visita sua localidade natal de Sayedabad, na província de Maidan Wardak, no centro do país, por medo de represálias por parte do movimento islâmico Talibã. “Durante o dia manda o governo e à noite o Talibã. Quando ficam sabendo do retorno de alguém, o sequestram, sem importar se a pessoa voltou para um funeral ou um casamento”, contou. Em uma sociedade de laços tribais centenários, as pessoas têm medo de regressar aos seus povoados nas áreas controladas pelo grupo islâmico.
Os mais vulneráveis são os moradores de Cabul e das cidades de Mazari Sharif, no norte, Maidan Shar, perto da capital, Gazni, no centro-oeste, e Herat, no oeste. O governo insiste que a segurança melhorou desde que as forças afegãs começaram a assumir o controle que antes estava com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), cuja retirada definitiva está prevista para 2014. A primeira e a segunda etapas de transição para essa retirada estão completadas.
Nematullah Wardak disse que não pode regressar ao seu povoado, e não apenas por medo do Talibã, mas também das forças regulares que hostilizam a população civil. “Um parente voltou ao povoado e houve um confronto entre forças estatais e talibãs. Os primeiros o capturaram junto com outra pessoa e os libertaram depois de muitos problemas”, afirmou.
Um funcionário da Direção de Comunicações e Tecnologias da Informação de Gazni, que falou sob anonimato, disse que aluga um lugar para morar nessa localidade, apesar de seu povoado natal estar nos arredores da cidade, porque seria morto se soubessem que trabalha para o governo, explicou. “Não sei o que fazer. Sofro solidão por estar longe de casa para me educar. Para ter um trabalho e servir ao meu país tenho que viver sozinho, porque o emprego é com o governo do meu próprio país”, afirmou.
Mohammad Ali Ghaznawi, morador no distrito de Muqor, também na província de Gazni, vive situação semelhante. “No ano passado podia-se viajar ao distrito de Qara Bagh sem problemas, mas agora é impossível. Quem fizer isso estará em perigo”, afirmou. Além disso, lhe disseram que integra uma lista de alvos de um grupo local do Talibã, por participar da cerimônia de inauguração de uma escola em Qara Bagh. “Me contaram que receberam informação sobre os participantes. Agora estamos todos em perigo”, ressaltou.
Enayatullah Hamdard é originário do distrito de Khogiani, na província de Nangarhar, fronteira com o Paquistão. Ele não se atreveu a ir ao seu povoado, Hashem Khali, para o funeral de um familiar assassinado em 4 de julho. “É perigoso ir. Seria brincar com a vida. Nosso parente foi morto perto de uma delegacia. Os talibãs estão por todo lado. O governo não pode fazer nada depois que anoitece”, afirmou. Mohammad Saleem Wafa, de 36 e originário da província de Farah, trabalha em uma organização não governamental e há dois anos não visita sua família na capital provincial. “Não posso ir por terra, é muito perigoso, e a viagem de avião é cara”, lamentou.
Um funcionário originário da província de Helmand acusou as autoridades de não poderem garantir a segurança nem mesmo nas cidades. “Minha família está em Helmand e eu trabalho em um ministério. Quando vou, viajo em segredo”, disse. O agravamento da segurança é o resultado da falta de coordenação entre os múltiplos organismos responsáveis, afirmou o analista Akhlaqi, de Cabul. “As pessoas votaram com a esperança de que suas vidas fossem preservadas. Mas o governo apenas observa seu assassinato”, acrescentou.
O Ministério da Defesa insiste em dizer que controla a situação. Está sendo preparada uma nova operação para garantir a segurança nas estradas chamada Naweed (boa notícia). O porta-voz Dawlat Waziri disse que a iniciativa cobrirá todas as áreas conflituosas do país. “Combatemos as ameaças dentro das possibilidades do ministério, com ajuda da polícia e das forças de segurança nacional e, às vezes, também da Força Internacional de Assistência à Segurança”.
O porta-voz do Ministério do Interior, Sidiq Sidiq, também negou que exista maior nível de conflito entre o governo e os grupos armados irregulares. “A insegurança não aumentou. As províncias de Kunduz, Baghlan e Badakshshan, no norte, e as do sul são totalmente seguras”, afirmou. “Não temos preocupações especiais a respeito. A polícia trabalha dia e noite para combater nossos inimigos e os que querem sabotar a segurança”, acrescentou Sidiq, para, em seguida, perguntar se é justo concluir que a segurança não é boa no país apenas pela atividade de alguns “poucos criminosos e ladrões”. Envolverde/IPS
* Esmatullah Mayar escreve para a organização de mídia independente Killid do Afeganistão, em associação com a IPS.