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“O mais difícil veio depois da revolução”

“Esperamos maior apoio dos doadores”, disse Mechichi à IPS. Foto: Pnud

Nações Unidas, 14/9/2012 – Após o levante que derrubou o presidente Zine El Abidine Ben Ali em janeiro de 2011, a Tunísia embarcou em um processo para julgar as graves violações dos direitos humanos cometidas pelo regime. O novo governo criou o Ministério da Justiça Transicional e Direitos Humanos, bem como uma série de comissões especiais destinadas a estudar os abusos cometidos durante os protestos populares. Este país também tenta reformar seu sistema judicial, acusado de corrupção, impunidade e falta de autonomia. Porém, na sociedade pós-revolucionária, o processo não é simples.

Said Mechichi é secretário de Estado de Reformas no Ministério do Interior. Advogado de profissão, integra a Associação Tunisiana para a Defesa dos Direitos Humanos e o Conselho Nacional de Liberdades Civis. Também é membro fundador e diretor do Centro para a Independência do Sistema Judiciário e da Profissão Legal, bem como da Associação Tunisiana Contra a Tortura. Além disso, integra o comitê de advogados do ramo tunisiano da Anistia Internacional. Em conversa com a IPS, Mechichi se referiu aos passos necessários para construir uma cultura de paz na Tunísia, e analisou os demais desafios que o país enfrenta.

IPS: Que papel tem a confiança no restabelecimento do império da lei?

Said Mechichi: É uma ótima pergunta. Por que se desatou a revolução? Foi um protesto contra as instituições do regime. A revolução foi lançada sob a premissa de que estas já não tinham credibilidade. A revolução demonstrou que havia se rompido o vínculo entre as instituições e os cidadãos. A ação mais importante a ser concretizada na pós-revolução é restabelecer a confiança nessas instituições: sistema judiciário, mídia, as que cuidam de assuntos sociais e econômicos, as que representam a soberania do Estado, os funcionários encarregados da administração e dos temas públicos em níveis nacional e regional, desde o empregado que ocupa o posto mais baixo do escalão até o primeiro-ministro e o presidente. A confiança deve ser construída de tal maneira que possamos responder às necessidades básicas na fase inicial. Na seguinte, deve-se pensar reformas referentes às leis, ao emprego e aos cargos que controlam essas instituições. Deve ser propagada uma nova cultura em todas as áreas, para acabar com a herança do regime anterior.

IPS: Qual é a situação humanitária na Tunísia?

SM: As pessoas que lançaram a revolução receberam certos benefícios, pois demandou uma melhora de suas condições socioeconômicas. Desde a revolução até agora, não houve protestos nem manifestações para pedir emprego ou melhorar a situação. Naturalmente, procuramos atender todas as demandas e apoiar o orçamento destinado ao desenvolvimento, bem como acelerar o estudo e a implantação de projetos de desenvolvimento em cooperação com países amigos e agências especializadas. Lamentavelmente, há muitas, muitas demandas. Várias delas são extremamente urgentes e têm a ver com necessidades básicas, como água, energia, estradas e equipamento básico para o trabalho das autoridades. Estamos procurando atender essas necessidades, porque houve uma demora no apoio internacional. Esperamos uma melhora na situação e na provisão de recursos, bem como no apoio de doadores e organizações.

IPS: Quais são as barreiras para o incentivo a uma cultura da paz em um país pós-revolucionário?

SM: A maior é a interrupção do diálogo entre os principais partidos e atores. Este é um dos maiores obstáculos, pois as pessoas perdem a esperança e podem ter reações imprevistas. Envolverde/IPS