[media-credit name=”Alexandre Vilas Boas” align=”alignright” width=”300″][/media-credit]Ao ler o artigo de apresentação do Blog PensarVivo (clique aqui para ler), Claudio Bertalot sentiu-se impelido a escrever este artigo que oferece uma providencial introdução ao tema com uma abordagem que os filósofos denominam “Teoria do Conhecimento”. O fio condutor das suas considerações é justamente a pergunta óbvia que todo leitor tende a fazer quando se confronta com o título desse Blog. Eis o artigo.
O que significa pensar vivo?
O que significa pensar vivo? Há um outro, portanto, que é morto? “…incluir o que o coração anseia e o que as ações querem vir a ser…” (como está formulado no texto de introdução a este assunto), é isso pensar vivo? Tudo bem: incluindo ainda o aspecto das ações que “surgem em resposta a uma situação da vida real e bem contemplada por quem a vive” (do mesmo texto). Então é isso: “um modo de pensar que gradativamente se capacite para incluir…” (idem), tudo o que já foi citado acima. Morto seria, então, um pensar que não faz isso; que não inclui o que o coração deseja, nem o que as ações querem vir a ser. Mas, o que é que o coração deseja, e como saber o que as ações querem vir a ser?
Voltando, porém, ao pensar morto, excludente do que o coração aspira e do que aspiram as ações, como seria esse pensar? Quem sabe se abordando essa pergunta não nos aproximamos mais do outro.
Mas, para falar sobre o pensar, seja ele vivo ou morto, não teríamos que verificar primeiro o que é o pensar em si?
O que é pensar?
O que é, pois, pensar? Parece uma pergunta fácil de ser respondida, pois nós pensamos continuamente e usamos esse termo tão frequentemente, que deveríamos saber exatamente o que é. No entanto, quanto mais se pensa sobre o pensar, mais misterioso ele fica, de início. É um dos elementos da existência mais difíceis de ser observado, que sempre nos escapa como o sabão no chuveiro, apesar de ser, ao mesmo tempo, o elemento do universo que nos é mais próximo, no qual estamos tão envolvidos com o nosso próprio ser, que ele até depende de nós mesmos para existir. “Penso, logo existo”, é um lado da moeda, o outro poderia ser: penso, logo existe o pensar.
Ora, esse pensamento que acabamos de formular, já serviu para destacar duas características do pensar. Uma: a de que pensando eu me percebo a mim mesmo, já que sou eu que penso; e outra, a de que pensando eu posso perceber o pensar, já que ele é um produto do meu ato pensante. São duas características que parecem óbvias, mas que, uma vez descobertas, abrem o caminho para a observação desse elemento tão importante para o nosso ser e existência, o nosso pensar.
Cinco características do pensar
O pensar é, pois, um ato do sujeito e, ao mesmo tempo, também um conteúdo, um produto, engendrado, segundo as suas próprias regras, por esse ato. O pensamento “penso, logo existo” também poderia ser formulado assim: posso duvidar da existência de tudo, só não posso duvidar de que eu esteja duvidando. Ou seja, a capacidade pensante, neste caso, não se vê no direito de atribuir existência a nada, mas reconhece que não pode negar existência ao pensador, à atividade que lhe está outorgando existência. Isto é, o conteúdo que ele gerou brotou da claridade, da evidência, foi vista de dentro, do interior iluminado de sua razão de ser. O ato subjetivo que produziu esse pensamento gerou um conteúdo objetivo, porque as regras desse conteúdo retroagiram sobre o ato que o engendrou.
Não estou, de forma alguma, querendo dar razão a tudo que Descartes falou. Não sou cartesiano. Apenas quis aproveitar do pensamento conhecido para poder fazer as primeiras observações do pensar. De qualquer forma é preciso pensar para que se possa observar o pensar. E só observando é que se pode constatar algo, tomar ciência de algo. Aliás, pensando sobre esse pensamento, vê-se que observar é também uma capacidade do pensar. Foi pensando que o sujeito se observou como tal, em relação ao objeto pensado. “Penso”, atividade minha, “logo existo”, conclusão pensante extraída da observação.
Neste caso pudemos observar várias característica do pensar: 1. Ele é um ato do indivíduo; 2. É um conteúdo que tem as suas próprias regras; 3. O fato de que como ato producente ele é subjetivo, não significa que como conteúdo produzido ele também o seja; 4. É um conteúdo regrado que, como tal, retroage sobre o ato que o engendra; 5. É também uma capacidade de observar.
O ser do pensar
Segundo Merleau-Ponty, “o ser exige de nós criação, para que dele tenhamos experiência”. A esta característica, que Merleau-Ponty atribui aos seres, o pensar corresponde com perfeição, este exige de nós criação, para que dele tenhamos experiência.
O que falamos sobre o famoso pensamento de Descartes não vale só pra este. Esta é uma característica de todo pensamento, quando o tomamos como puro pensamento, antes de sua ligação com os objetos sensoriais, ou não sensoriais da existência. Pense-se, por exemplo, na frase da criança de quatro anos de idade que disse: “Hoje, amanhã, é ontem.”
Um próximo passo seria, pois, verificar a relação do pensar com os objetos sensoriais e não sensoriais do mundo.
* Claudio Bertalot é euritmista, músico e professor.
** Publicado originalmente no blog Pensar Vivo, do Instituto Elo.
*** Para conhecer o trabalho do artista Alexandre Vilas Boas, autor do desenho que ilustra o texto, clique aqui.