Johannesburgo, África do Sul, 21/6/2011 – Os países africanos devem ter cuidado para não jogar fora dos trilhos seus próprios planos de desenvolvimento quando entram em acordos com Estados de fora do continente, apesar dos aparentes resultados positivos. Essa foi uma das advertências feitas por especialistas reunidos em Johannesburgo.
A diretora do Instituto Sul-Africano de Assuntos Internacionais (Saia), Elizabeth Sidiropoulos, afirmou que o conceito de cooperação Sul-Sul está presente há muito tempo, mas “o crescimento fenomenal” de China e Índia nos últimos anos lhe deu maior peso. “O crescimento desses dois países também aumentou ou interesse nas ferramentas que usaram para atingir esses níveis”, destacou.
O Saia, centro de estudos vinculado à Universidade de Witwatersrand, em Johannesburgo, realizou uma conferência, nos dias 9 e 10 deste mês, sobre as relações entre Índia e África do Sul. Sidiropoulos afirmou que desafios semelhantes aos desses dois países em matéria de meio ambiente e pobreza permitem “intercâmbios mais significativos nas relações Sul-Sul”.
Porém, alertou para o risco de se procurar apenas lucro econômico unilateral, e destacou que a cooperação entre Índia e África do Sul poderia beneficiar em grande parte os dois lados. “Os países em desenvolvimento devem desempenhar seu próprio papel. Há toneladas de ferramentas para estimular o crescimento econômico. A ajuda é apenas uma delas. A África precisa de infraestrutura e capacitação para o desenvolvimento. O acesso aos mercados continua sendo um problema”, acrescentou Sidiropoulos.
A diretora do Saia destacou que o impacto direto do crescente comércio entre os países do Sul ainda é difícil de determinar. “O fato é que criou novos atores no cenário comercial mundial. A África tem maior poder de negociação, não apenas no comércio Sul-Sul, como também com o Primeiro Mundo”, destacou.
“Os investidores estrangeiros estão participando na África. A chave, entretanto, é a cooperação em desenvolvimento entre sócios e Estados africanos. A ajuda deve ser mais efetiva, e isto permite cooperação Sul-Sul, em lugar de comércio Sul-Sul”, disse Sidiropoulos. A Índia mostra sua disposição para ajudar o continente, envolvendo-se em iniciativas africanas como a Nova Sociedade para o Desenvolvimento Africano (Nepad). Nova Délhi também ajuda a África a reduzir a brecha digital e investe na criação de um sistema médico eletrônico que permite realizar consultas pela internet.
A isto se acrescenta o fundo Índia-Brasil-Afríca do Sul (Ibas), que torna disponível dinheiro para projetos pequenos e novos, como um para o tratamento de lixo na Guiné. “No entanto, o impacto de todos esses esforços só pode ser avaliado após os projetos serem implementados por um longo período”, disse Sidiropoulos. Para que a cooperação funcione, a África deveria garantir que os acordos tenham em conta os planos nacionais existentes.
Organizações regionais como a Comunidade Econômica de Estados da África Ocidental (Ecowas) e a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) deveriam forjar acordos. “A cooperação Sul-Sul não significa o fim da cooperação Norte-Sul”, explicou Sidiropoulos. Sunil Joshi, chefe-executivo da segunda operadora nacional de telecomunicações da África do Sul, concorda que a interação Sul-Sul deve se basear na cooperação e não no comércio. O empresário prevê que logo a África teria mais a oferecer do que recursos naturais.
“Em 2009, 64% da população indiana estava em idade de trabalhar. Estima-se que esse número cairá para 57% em 2020. A idade média dos trabalhadores na Índia é de 27 anos, e na China de 37. A África é muito mais jovem, e os recursos humanos do continente se converterão em matéria-prima no futuro”, disse Joshi. Segundo o empresário, “o crescimento econômico é apenas um dos fatores a considerar na hora de medir o progresso. O que também deve ser considerado são os efeitos positivos para o povo e a cultura”.
“Quando se considera a cooperação Sul-Sul, os Estados africanos devem ser realistas. Este tipo de cooperação pode adequar-se para os Estados africanos mais fortes, como a África do Sul, mas não para os mais fracos, nos quais a ajuda pode ser mais efetiva”, disse Joshi. “Mas a cooperação Sul-Sul pode ser uma das estratégias fundamentais para a fase de crescimento da África”, acrescentou. Envolverde/IPS