Peshawar, Paquistão, 21/8/2013 – O nervosismo se sente até no ar de Dera Ismail Kan. Há mais de uma quinzena que rebeldes atacaram uma prisão de alta segurança neste distrito paquistanês e libertaram cerca de 200 detentos, entre eles comandantes do movimento extremista Talibã. Dera Ismail Kan é um dos 25 distritos de Jyber Pajtunjwa (ex-Província da Fronteira Noroeste). Vizinha das províncias Waziristão do Norte e do Sul, que integram as Áreas Tribais Administradas Federalmente (Fata), que por muito tempo foram um reduto seguro para o Talibã.
O temor é que os talibãs libertados reiniciem suas atividades e ataquem pessoas suspeitas de tê-los entregue às autoridades. “A população tem medo depois da fuga de rebeldes radicais. Agora nos assediarão e alterarão ainda mais a paz na área”, disse à IPS Ahmed Sultan, professor de ciência política na Universidade Gomal de Dera Ismail Kan. O medo também existe em outras áreas.
Um inspetor de polícia do distrito de Tank, entre Dera Ismail Kan e Waziristão, disse à IPS que a população desta parte do país agora teme uma represália do Talibã por culpa de outros que podem ter informado à polícia sobre sua presença. Tank também fica ao sul de Jyber Pajtunjwa, e se comenta que possui uma forte presença do Talibã. O que complica os temores públicos é a possibilidade de a polícia e as forças de segurança terem desempenhado algum papel na fuga do dia 29 de julho em Dera Ismail Kan.
O Talibã tem suficientes amigos e simpatizantes dentro da polícia e do governo, disse à IPS Mohammad Nabi Gul, ex-superintendente de prisões. A população do lugar também está confusa quanto ao papel da polícia no incidente. “É muito provável que tenham ajudado o Talibã por medo ou por dinheiro”, disse à IPS Mohammad Shah Kan, morador de Dera Ismail Kan. “Os insurgentes se tornaram tão poderosos que a polícia não tem coragem para detê-los”, acrescentou.
As suspeitas sobre o papel da polícia se confirmaram quando um porta-voz do proscrito Tehreek-e-Taliban Pakistan (TTP), em declarações feitas de um lugar não revelado, três dias depois do incidente, disse à imprensa do Paquistão: “Estamos agradecidos à polícia e aos empregados da prisão por sua plena colaboração”. O porta-voz continuou chamando-os de “bons muçulmanos”, e acrescentou que “isso nos permitiu obter a liberdade de 250 pessoas, que agora estão reunidas com seus companheiros nas Fata”.
Em Jyber Pajtunjwa existem quatro prisões centrais, sete distritais, quatro cárceres judiciais e sete centros intermediários. Juntos abrigam cerca de 15 mil detentos, incluindo 700 acusados de terrorismo. A fuga de Dera Ismail não teria ocorrido se o governo tivesse feito uma investigação adequada sobre a fuga na prisão de Bannu em 2012, e tivesse levado à justiça os responsáveis, afirmou o ex-superintendente de prisões Gul. “De Bannu o Talibã libertou 384 prisioneiros, incluindo 20 condenados à pena de morte”, destacou.
Um dos fugitivos de Bannu foi quem planejou a fuga de Dera Ismail este ano. A fuga, segundo Pervez Khattak, que assumiu como ministro-chefe de Jyber Pajtunjwa após as eleições de 11 de maio, foi planejada por Adnan Rashid, ex-funcionário da força aérea do Paquistão, acusado de tentar assassinar o ex-presidente Pervez Musharraf, no dia 14 de dezembro de 2003. Afirma-se que Rashid treinou um esquadrão de dez membros que colheu informação de inteligência antes de atacar a prisão à meia-noite.
“O Talibã fez um filme sobre a fuga de Bannu, bem como um sobre a de Dera Ismail Kan”, disse à IPS Ali Amin Gandapur, ministro do Tesouro de Jyber Pajtunjwa. “Não se via nossa polícia em parte alguma”, afirmou, sendo mais uma voz a questionar o papel da corporação no incidente. “A polícia, que se supõe deve proteger as prisões, se refugiou em casas próximas no momento do ataque”, enfatizou. Como membro do gabinete provincial, afirmou que pressionará o governo para que tome medidas contra os que não opuseram resistência.
A posição do exército também é questionada. O presidente do Partido Pakistan Tehree-k-e-Insaf, Imran Khan, se mostrou surpreso pelo fato de os insurgentes realizarem sua tarefa com tamanha facilidade e precisão, apesar de 25 mil homens do exército estarem na cidade. “Levarei ao chefe do exército, general Ashfaq Parvez Kayani, o assunto de como os rebeldes chegaram à prisão após cruzarem meia dezena de postos de controle”, informou Khan à IPS, por telefone.
Em maio, o partido de Khan ganhou por esmagadora maioria em Jyber Pajtunjwa. “Menos de cem insurgentes em seus veículos chegaram à prisão de Dera Ismail, mas o exército não tomou nenhuma medida”, disse Khattak. O ministro-chefe afirmou à IPS que convocou o comandante do corpo militar de Peshawar no momento do ataque, pedindo que mandasse o exército deter os rebeldes. O comandante respondeu que estavam “buscando as autorizações de hierarquias superiores”, afirmou.
Khan queria uma reunião a portas fechadas com Kayani e com o primeiro-ministro, Nawaz Sharif, para saber exatamente o motivo de o exército ser reticente em lançar uma ação militar em grande escala contra o Talibã. Enquanto isso, esse grupo se mostra exultante por ter conseguido libertar seus camaradas. “A maioria dos presos que fugiram foram trazidos para cá, onde o Talibã os recebeu calorosamente”, disse à IPS Mohammad Shah, um comerciante do Waziristão. Ele ouviu dizer que membros do movimento extremista disparavam tiros para o ar comemorando.
A maioria dos moradores vê a fuga com maus olhos, contou à IPS o comerciante Shakoor Ahmed, de Dera Ismail Kan. Querem que os criminosos e os rebeldes estejam atrás das grades, ressaltou. Depois destas fugas, o governo pretende construir prisões de alta segurança. Também foi determinada a instalação de bloqueadores de telefone celular e outros equipamentos em todas as prisões, informou à IPS o ministro de Informação de Jyber Pajtunjwa, Shah Farman. Pouco depois do incidente, o exército se movimentou para proteger a prisão de Peshawar, onde estão presos insurgentes de alto perfil. Envolverde/IPS