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Obama e Rouhani apostam tudo no acordo nuclear

O presidente Hassan Rouhani fala na reunião ministerial do Movimento dos Não Alinhados, em 27 de setembro de 2013. Foto: UN Photo/Rick Bajornas
O presidente Hassan Rouhani fala na reunião ministerial do Movimento dos Não Alinhados, em 27 de setembro de 2013. Foto: UN Photo/Rick Bajornas

Washington, Estados Unidos, 21/1/2014 – Depois de 34 anos de inimizade, Teerã e Washington apostam fortemente no sucesso de um acordo que tenta fixar o contexto para o programa de desenvolvimento nuclear iraniano. O futuro do presidente do Irã, Hassan Rouhani, também depende disso. Ontem começou a implantação do Plano de Ação Conjunta, um histórico acordo de primeira fase alcançado no dia 24 de novembro em Genebra por Irã e o chamado P5+1 (China, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Rússia mais Alemanha).

Na primeira etapa do acordo, o Irã reduzirá e limitará significativamente seu controvertido programa nuclear em troca de um alívio paulatino das sanções. Teerã se comprometeu a suspender, a partir de ontem, o enriquecimento de urânio a 20% (que pode ser usado para desenvolver armas de destruição em massa) e a dissolver metade do material já enriquecido a esse nível, para deixá-lo em 5%. A fase final para uma “completa solução” inclui o desmantelamento total do regime de sanções, segundo o texto.

“Resolver o impasse na questão nuclear é a política de destaque do presidente Rouhani”, disse à IPS o analista Mohsen Milani, da Universidade do Sul da Flórida. “Se não puder conseguir uma solução para o tema nuclear, não será capaz de alcançar outras importantes iniciativas internas e externas, e os políticos de linha dura terão maiores possibilidades de obter maioria nas eleições parlamentares de 2016, colocando em risco sua reeleição”, pontuou o especialista em assuntos iranianos.

“Há uma analogia com o que ocorre com o presidente norte-americano, Barack Obama, com seu projeto de Lei de Cuidado da Saúde Acessível. Se não vencer nisso, seu futuro estará em grandes problemas”, acrescentou Milani. Desde 24 de novembro, a administração de Rouhani, que herdou um país isolado e deteriorado economicamente, promove o acordo com grande destaque.

“O acordo de Genebra significa a rendição das potências à grande nação iraniana”, afirmou o mandatário em um discurso no dia 14 em Ahvaz, capital da petroleira província de Juzestão. O acordo “rompe a barreira das sanções injustamente impostas sobre a querida nação iraniana, amante da paz”, afirmou esse clérigo centrista perante uma multidão.

A esperada visita de Rouhani ao Fórum Econômico de Davos, que acontecerá nessa cidade suíça entre os dias 22 e 25, marca também uma nova era nas relações de Teerã com a comunidade internacional. O último líder iraniano a participar desse encontro foi o presidente Mohammad Khatami (1997-2001) há uma década.

Embora os investidores estrangeiros possam se mostrar interessados no mercado iraniano, tão restrito até agora pelas sanções, ainda é preciso levantar muitas barreiras para gerar confiança. Além das complexidades logísticas e técnicas na implantação do monumental acordo, este também enfrenta desafios externos.

O governo Obama procura impedir que o Congresso aprove uma nova série de sanções contra o Irã, alertando que isso poderia deter uma solução pacífica do conflito e inclusive derivar em uma guerra. A Lei para um Irã Livre de Armas Nucleares 2013 ameaça impor fortes sanções a Teerã se não forem cumpridos os termos do acordo de 24 de novembro ou se não se chegar a um tratado final no prazo de um ano.

Ainda não foi fixada a data para sua votação, mas Obama já luta duramente contra ela no Congresso. No dia 16, o presidente exortou os legisladores de seu partido, Democrata, a se oporem às novas sanções. “Obama falou de forma apaixonada sobre como temos que aproveitar essa oportunidade”, disse o senador Jeff Merkley. “Se depois o Irã não demonstrar vontade de tomar as decisões necessárias, ele estará disposto a assinar o projeto de lei para endurecer as sanções. Mas, temos que lhe dar seis meses”, acrescentou.

As negociações são tão delicadas que o governo Obama divulgou apenas nove páginas com detalhes da implantação do acordo, e apenas após uma forte pressão. Enquanto isso, os políticos de linha dura do Irã, que se opõem a qualquer aproximação com Washington, estão de olho em qualquer fracasso do acordo para acusar Rouhani de não saber proteger os interesses do Irã. Obama “baseou sua campanha na promessa de levantar as sanções, pôr fim ao isolamento do Irã e resolver de forma honrada e pacífica o impasse nuclear com o Ocidente”, disse Milani. “Muitas pessoas votaram nele precisamente por essa promessa”, destacou.

Os políticos radicais em Teerã perderam seu domínio desde as eleições de junho de 2013, para as quais não conseguiram apresentar um candidato único e atraente contra Ruhani. Inclusive o líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, que fez várias declarações públicas de apoio aos diplomatas que participavam das conversações em Genebra, exortou as vozes críticas a apoiarem os esforços de Rouhani na questão nuclear.

Porém, o aiatolá também repetiu que não confia no Ocidente. “Ninguém deve ter ilusões de que os inimigos da Revolução Islâmica deixaram de ser rivais”, afirmou durante um discurso na cidade de Qom, no dia 9. “Naturalmente, é possível que qualquer inimigo às vezes não tenha opção a não ser retroceder, mas o inimigo e a frente inimiga não devem ser ignorados”, ressaltou.

O governo de Rouhani alertou para as repercussões da aprovação de novas sanções enquanto as negociações estão em andamento. “Não teriam nenhum resultado positivo”, disse o chanceler iraniano, Javad Zarif, no dia 16. “Se os legisladores norte-americanos radicais fizerem esforço para aumentar as sanções, não gostarão dos resultados”, enfatizou o chefe negociador que também advertiu que “todo acordo estaria morto”.

“Creio nos iranianos quando dizem que abandonarão as conversações se houver mais sanções”, disse à IPS a analista Barbara Slavin, do independente Atlantic Council. “Se o Congresso aprovar uma legislação assim, o impacto será grave, embora não necessariamente fatal”, disse a especialista, que esteve presente na posse de Rouhani em agosto. “E a credibilidade de Obama será afetada gravemente se ele for visto como incapaz de controlar nem mesmo o Senado, dominado pelos democratas, o que teria implicações negativas para negociar um acordo final”, ressaltou. Envolverde/IPS