Bruxelas, Bélgica, 15/3/2012 – A acidificação dos oceanos, a perda de biodiversidade marinha, a mudança climática, a contaminação e a superexploração dos recursos obrigam à busca de forma urgente de um novo modelo para protegê-los. Deixar as coisas como estão, simplesmente, não é uma opção, afirmam especialistas. As perspectivas para nossos oceanos nas próximas décadas são desanimadoras, ressaltam. Já houve um grau de acidificação extremo como o atual, disse Carol Turley, do Laboratório Marinho da cidade britânica de Plymouth. Esta afirmação pode ser um alívio, não fosse o fato de se referir à época em que foram extintos os dinossauros.
O termo acidificação é usado para descrever a redução do pH (potencial de hidrogênio) oceânico causado pelas emissões de dióxido de carbono (CO²) produzidas pelas atividades humanas. Estamos diante de uma “enorme crise ambiental”, alertou Turley este mês aos participantes de uma sessão informativa do Parlamento Europeu, onde falou sobre os desafios e as soluções para os oceanos, com vistas à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que acontecerá em junho no Rio de Janeiro.
Turley brincou sobre o apelido que ganhou de “rainha do ácido”, por sua funesta mensagem, mas a difícil situação de 70% da superfície da Terra não é nada engraçada. Os oceanos absorvem cerca de 26% ao ano do total de emissões de CO², que aumentaram 30% desde o começo da Revolução Industrial, em 1750, segundo o Grupo Internacional de Usuários de Referência sobre Acidificação Oceânica.
A acidificação dos oceanos prejudica a vida marinha, e até as mudanças de acidez menores deixam mais sensíveis os esqueletos e as conchas de carbonato de cálcio. Também reduz a disponibilidade de cálcio para o plâncton e as espécies com esqueleto, que constituem a base de toda a cadeia alimentar marinha, criando um efeito dominó desastroso, que pode aniquilar ecossistemas inteiros.
“O sistema terrestre está realmente sob a influência do homem”, afirmou Wendy Watson-Wright, diretora-geral adjunta e secretária executiva da Comissão Oceanográfica Intergovernamental, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Os oceanos poderão ter 150% mais acidez até 2100, em relação a hoje, acrescentou Wendy. Isto significaria uma drástica redução na produção pesqueira e a maciça extinção da vida marinha. O mundo perde recursos naturais a um grau que os humanos nem mesmo começaram a descrever, ressaltou.
Infelizmente, é difícil obter a atenção da população para a necessidade de preservar os oceanos. A atenção global se concentrou totalmente na economia, em especial após a crise financeira que se generalizou em 2008, a partir dos Estados Unidos chegando à Europa. “Nosso maior desafio é convencer os cidadãos de que os objetivos ambientais não se opõem ao progresso econômico”, insistiu a comissária para Pesca e Assuntos Marítimos da União Europeia, a grega Maria Damanaki.
Alguns acreditam que o problema é “que o que os olhos não veem o coração não sente”, opinou Wendy, argumentando que as pessoas não dão prioridade aos oceanos porque vivem em terra firme. Mesmo os países sem saída para o mar têm muito em jogo na sustentabilidade oceânica, ressaltou. Faltando poucos meses para a Rio+20, onde se comemorará os 20 anos da primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, ou Cúpula da Terra, acabou o tempo de discutir soluções, advertiu.
Raphaël Billé, diretor de programa para a biodiversidade e adaptação do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais (IDDRI), pediu mais firmeza em matéria de objetivos ambientais para melhorar o impulso político nos temas prioritários, que foram articulados pelos organizadores da Conferência. A Rio+20 não terá nada de concreto em termos de acordos políticos, mas é uma oportunidade para avaliar o progresso e renovar os compromissos políticos, com a esperança de preparar o caminho para, depois, tomar as decisões difíceis, argumentou Billé.
Os oceanos serão um dos temas desse encontro, que também incluirá alimentação, energia, cidades, água e desastres. Desde a primeira reunião no Rio de Janeiro, há 20 anos foram alcançados progressos em matéria de proteção dos oceanos, segundo a Unesco, os quais incluem decisões dentro do Plano de Implementação de Johannesburgo, acordado na Cúpula da Terra de 2002. Os planos para os oceanos na Rio+20 se concentram em dez propostas sob quatro objetivos principais, segundo a Comissão Oceanográfica Internacional.
Estes objetivos são: adotar ações concretas para reduzir o fator gerador de estresse e restaurar a estrutura e o funcionamento dos ecossistemas marinhos, apoiar uma economia “azul e verde”, avançar para reformas políticas, legais e institucionais, e apoiar pesquisas e controles marinhos, avaliação e tecnologia.
A preocupação por nossos oceanos não é nova, segundo a IDDRI em um artigo para as Nações Unidas, em novembro de 2011. A maioria dos problemas foi identificada há décadas. “A única forma de avançar é reconhecer o fracasso geral em matéria de governança oceânica, estudar os êxitos obtidos e desenvolver estratégias que considerem os dois aspectos”, afirma o texto. O artigo também menciona os conflitos entre a governança oceânica e a resistência em torná-los sustentáveis, especialmente quando os custos aumentam.
Vários especialistas expressam dúvidas sobre a capacidade da Rio+20 para conseguir resultados suficientes e benéficos para o planeta. Porém, ativistas e cientistas aumentam a pressão sobre os representantes que participarão da Conferência para levar o poder político a tomar decisões fortes e duradouras, que ofereçam uma oportunidade para que os oceanos e seus ecossistemas essenciais sobrevivam. Envolverde/IPS